A maldição do novo Sexta-Feira 13 | JUDAO.com.br

A volta aos cinemas do mito Jason Voorhees subiu no telhado de vez. Mas não antes de um sem número de tentativas frustradas, perrengues e adiamentos que se arrastaram por quase uma década

Agora é pra valer: o maníaco mascarado Jason não deve mesmo voltar tão cedo aos cinemas. Mesmo que muita gente já não botasse a mínima fé que um dia isso realmente saísse do papel, foi jogada a pá de cal no tão aguardado reboot de Sexta-Feira 13. A Paramount Pictures, horas depois de adiar pela enésima vez seu lançamento, cancelou em definitivo o projeto. Já era. Acabou. C’est fini!

A verdade é que esse samba do serial killer pirado já vem rolando faz BASTANTE tempo, mais precisamente desde 2009, e a produção vem entrando e saindo da gaveta, sendo reformulada, adiada e cancelada ad infinitum. Para você ter uma ideia, nesses quase dez anos, já falaram de sequência do remake, um novo filme estilo found footage, uma prequência e até uma série de TV.

Mas como essa patifaria toda com o pobre Jason começou?

No glorioso ano de 1980, o diretor Sean S. Cunningham, hipotecando sua casa e com a ajuda de alguns investidores de Boston (que na verdade eram mafiosos donos de salas de cinemas), conseguiu lançar o Sexta-Feira 13 original. A Paramount comprou os direitos domésticos de distribuição e a Warner Bros., os direitos internacionais. Esse acordo valeu do primeiro até o oitavo filme da série quando, todo mundo já sabe, a franquia se tornou a mais popular e rentável do cinema de terror e Jason Voorhees, o movie maniac número um da galera, inclusive desse que vos escreve.

Lá nos anos 90 os direitos acabaram voltando para Cunningham, que os vendeu novamente para a New Line Cinema, estúdio que durante muitos anos vinha tentando negociar um crossover de Jason com o assassino slasher da casa, Freddy Krueger. Basta lembrarmos do final de Jason Vai Para o Inferno – A Última Sexta-Feira, quando antes dos créditos subirem, surge do chão uma famosa luva de garras puxando a clássica máscara branca para baixo. Demorou UMA COTA e só uma década depois é que finalmente Freddy vs Jason saiu do papel e viu a luz de um projetor.

Já no final da década passada, em 2009, a Platinum Dune, produtora “especialista” em refilmagens de filmes de terror, dos sócios Brad Fuller, Andrew Form e Michael Bay, a mesma que já tinha “atualizado” O Massacre da Serra Elétrica e Horror em Amityville, ressuscitou Jason e lançou nos cinemas um novo Sexta-Feira 13, produzido pela New Line (agora novamente parte da Warner Bros.). Dirigido por Marcus Nispel, o filme faturou belos 91 milhões de doletas nas bilheteria ao redor do mundo — é o segundo filme da franquia com maior arrecadação, perdendo apenas para Freddy vs Jason. Só que essa grana teve de ser dividida 50/50 com a Paramount, porque descobriu-se que eles ainda eram detentores dos direitos do original.

É, não me perguntem...

Seis meses depois de sua estreia, a dupla New Line Cinema / Warner Bros. anunciou a famigerada sequência, que seria lançada em 3D no ano seguinte, na sexta-feira 13 de agosto de 2010, escrita pela mesma dupla de roteiristas, Damian Shannon e Marcus Swift. Mas alegria de fã de filme de terror parece que dura pouco mesmo: nesse caso, apenas um bimestre, porque o longa foi retirado do calendário de lançamentos do estúdio. Bastaram outros dois meses para que Brad Fuller desse a entender em seu Twitter que a produção havia sido cancelada — ou, pelo menos, não fosse tão interessante assim para o estúdio.

Começava aí o calvário de Jason, pior que qualquer Tommy Jarvis da vida pudesse lhe proporcionar.

Tudo ficou estagnado durante os anos seguintes, com Fuller tendo que responder e acalmar os ávidos fãs na rede social do passarinho, explicando que não havia nenhuma novidade, reforçando que eles estavam no barato de fazer o filme (inclusive Shannon e Swift já tinham um roteiro pronto, que se passaria durante o inverno), mas a recíproca para a Warner não era verdadeira. Foi só na metade de 2013 que as coisas pareceram tomar um novo rumo para a franquia assim que um certo nome entrou na jogada: Christopher Nolan.

Calma, não é nada disso que você tá pensando. O cineasta “gênio-visionário” não foi escalado para dirigir o próximo Sexta-Feira 13, não. Sabe Interestelar? Originalmente, a ficção-científica era uma produção da Paramount. Quando Nolan assumiu a cadeira do diretor, Wakko, Yakko e Dot cresceram os olhos, uma vez que ele foi responsável por um caminhão de dinheiro para o estúdio com a trilogia Batman (foram mais de 2,4 bilhões ao redor do mundo!) e quiseram negociar a distribuição internacional de seu novo filme, apostando que seria sucesso na certa. Qual o preço pago pela Warner nesse acordo? Jason e Cartman.

A Warner deu de bandeja para o estúdio das estrelas em volta da montanha os direitos das futuras sequências de Sexta-Feira 13 e South Park: Maior, Melhor e Sem Cortes.

De volta ao lar


Uma corrida contra o tempo se iniciou para a produção tomar forma, uma vez que esse acordo vale por apenas cinco anos. Logo as primeiras informações e especulações começaram a pintar. Derek Mears, o ator que interpretou o monstro na refilmagem, deu com a língua nos dentes que a Platinum Dunes estaria à frente do projeto, fato confirmado pouco depois por Fuller, acrescentando que o projeto era prioridade pro estúdio. Até surgiu o rumor de que Cunningham, o criador, seria o diretor, logo negado pelo próprio.

Em outubro de 2013, explodiu a bomba de que o filme seria um reboot na franquia, ao invés da sequência do remake e, tremei, em estilo found footage. A data de lançamento nos cinemas já estava cravada: 13 de Março de 2015 (uma sexta-feira, óbvio). Só que os fãs ENXOVALHARAM a ideia da fita encontrada, mais tarde enterrada de vez devido ao clamor popular. Mas a boa notícia era que David Bruckner, um dos diretores de V/H/S/, responsável pelo segmento Amateur Night, estava em negociações para dirigi-lo.

Nisso, a data de lançamento foi adiada para 13 de Novembro, chegou-se a especular que Jason não estaria no filme (um verdadeiro tiro no pé se lembrarmos da infâmia de Sexta-Feira 13 Parte 5: Um Novo Começo), e que o papel principal seria da mamãe Pamela Voorhees (como no original). Tudo foi se arrastando por mais de um ano, sem nunca haver sequer um roteiro escrito...e olha que eu não consigo entender exatamente a dificuldade de se escrever um SCRIPT para Sexta-Feira 13.

Foi só em 2015, depois que a data de lançamento foi CATAPULTADA lá para 13 de Maio de 2016, que finalmente um roteirista acabou anunciado: Nick Antosca, das séries Teen Wolf e Hannibal e do sofrível e até então inédito Floresta Maldita. Seu roteiro trazia uma história que se passava nos anos 80, com toda uma pegada throwback bem antes do tsunami nostálgico provocado por Stranger Things nos arrebatar. Só que depois de ver o texto finalizado, os produtores pareceram não achar lá grande coisa. A procura por um novo roteirista foi anunciada e, adivinha? A data de lançamento adiada mais uma vez, agora para 13 de Janeiro de 2017.

Meses depois, habemus roteirista, Aaron Guzikowski, escritor de Os Suspeitos de Denis Villeneuve, um dos roteiros mais quentes da nova Hollywood. Mas como a mão que afaga é a mesma que apedreja, junto da notícia também veio a confirmação de que David Bruckner havia abandonado de vez a cadeira de diretor.

Enquanto isso, ainda em 2015, surgiu uma nova luz no final do túnel para finalmente o assassino voltar ao abate — não nas telonas de cinema. Tudo ia rolar numa série produzida pela Crystal Lake Entertainment e pela Emmet/Furla/Oasis Films, desenvolvida por Steve Mitchell e Craig Van Sickle. A ideia era pegar carona no sucesso de outras obras de terror sendo transportadas para a TV, como Hannibal, Bates Motel, Pânico e O Bebê de Rosemary, explorando o passado de Jason. E mais: o produtor seria ninguém menos que o próprio Sean S. Cunningham! Para completar, o canal CW mostrou interesse no show.

Até assistir ao piloto e resolver desencanar do projeto.

Escrito por Bill Basso, um especialista em efeitos especiais do Stan Winston Studio que trabalhou em Jurassic Park, Edward Mãos de Tesoura e O Exterminador do Futuro 2, e Jordu Schell, designer conceitual de de filmes como 300, Avatar, Invasão do Mundo: Batalha de Los Angeles e um vindouro Batman vs Superman, o roteiro tinha como premissa um detetive procurando pelo seu irmão desaparecido em Crystal Lake, algum tempo depois da matança de Jason ter se encerrado. Durante sua investigação, ele descobriria a verdadeira história do maníaco.

Mark Pedowitz, presidente do CW, explicou na época que o motivo da desistência foi que a série era mais sombria do que eles queriam (afinal, estamos falando da casa de Flash, Arrow e Supergirl) e não se sustentaria por muitos episódios: “Era um piloto muito bom, mas que não se manteria em uma série com uma temporada completa”. Coloca aí mais uma tentativa fracassada na conta.

Nesse INTERIM, Guzikowsk entregou seu roteiro para o filme, no qual muito da história seria focado no relacionamento da família Voorhees e, principalmente, no pai de Jason, Elias, que seria introduzido pela primeira vez no cânone cinematográfico. O sujeito oficialmente havia dado as caras pela primeira vez na novelização de Sexta-Feira 13 Parte 6: Jason Vive, escrita por Simon Hawke em 1986, e quase apareceu no filme, mas a ideia foi abortada. Na verdade, outras duas vezes a aparição do Papai Voorhees nos cinemas bateu nas trave: em Jason Vai Para o Inferno e Freddy vs Jason, em ambas a ser interpretado por Kane Hodder (o próprio cara por trás da máscara das partes 7 até 10).

No universo expandido, Elias apareceu em diversas HQs mas foi em Friday the 13th: Pamela’s Tale, publicada pela Wildstorm em duas edições em 2007, escrita por Marc Andreyko e desenhada por Shawn Moll, que o personagem foi explorado. Na trama, ele tinha uma relação abusiva com a moça, em quem batia e a quem estuprava regularmente, inclusive durante a gravidez. Certa noite, quando ele estava dormindo, a futura mãe de Jason pegou um machado e cortou o marido em pedacinhos, seguindo as vozes em sua cabeça para proteger o filho. Ainda antes disso, no crossover Jason vs Leatherface, publicado em 1995 pela Topps Comics, Elias foi retratado em diversos flashbacks como um pai que espancava o filho por não conseguir aceitar e lidar com sua deficiência.

Pegando carona nos gibis ou não, o ponto é que finalmente acabou sendo anunciado um diretor para a empreitada: Breck Eisner, o mesmo de O Último Caçador de Bruxas com o Vin Diesel e A Epidemia, refilmagem de Quadrilha de Sádicos de George A. Romero. Daí eu, você e todo mundo pensou: AGORA VAI!

Ledo engano. uma treta nos tribunais acabou pipocando.

Como desgraça pouca é bobagem, em agosto do ano passado apareceu um PROCESSO que Victor Miller, o roteirista do primeiro Sexta-Feira 13, moveu contra a Horror, Inc. e a Manny Company (sucessora da Georgetown Productions Inc, aquela dos sujeitos mafiosos de Boston que ajudaram a financiar o longa de Cunningham), conforme noticiado pelo The Hollywood Reporter.

Miller se valeu de uma disposição da lei de direitos autorais na qual o criador da obra original pode, depois de 35 anos, apresentar uma reivindicação para recuperar os direitos sobre a obra. As acusadas, por sua vez, também abriram um processo contra Miller para forçar um possível acordo fora dos tribunais e tentar provar que ele foi apenas contratado para escrever o roteiro, encomendado por Cunningham, e assim o processo não se aplicaria, pois neste caso o contratante é o detentor dos direitos.

Com esse IMBRÓGLIO judicial, não preciso nem falar que a data de lançamento foi adiada MAIS uma vez, para 13 de Outubro deste ano, a última alteração antes do facão, tão impiedoso quanto as investidas de Jason, ter sido passado em definitivo na produção. E apesar dessa treta toda, sabe de quem foi a culpa no final das contas?

Tudo indica que foi da Samara, conforme sugere Bloody-Disgusting.

“O que diabos a fantasma enrugada de cabelo oleoso que sai da televisão tem a ver com os planos já enrolados de um novo Sexta-Feira 13 descer pelo ralo?”, você me pergunta. E eu respondo com prazer: O Chamado 3 estreou no último final de semana e foi um tremendo fracasso, faturando apenas 12 milhões de dólares no mercado doméstico, contra um orçamento de 25 milhões, não chegando nem a pagar seus custos de produção nos três dias mais rentáveis para todo e qualquer filme.

Como a tendência é o número de pessoas nas salas de cinema diminuir (e até minguar) conforme as semanas avançam, ainda mais tratando-se de uma BOMBA com críticas péssimas e boca-a-boca nada favorável, a Paramount não deve estar nem um pouco empolgada em ressuscitar outra franquia há muito adormecida e por isso resolveu martelar o prego na tampa do caixão. Faria sentido. Ou seja, bem diferente do que fez em 2002 com O Chamado, Samara prestou um tremendo desserviço ao cinema de horror.

Para completar o infortúnio, em 2018 os direitos voltam para a Warner Bros., e isso praticamente encerra essas desventuras em série de um novo Sexta-Feira 13 pela Paramount. A não ser que algum milagre aconteça (como, por exemplo, um sucesso estrondoso do novo jogo de videogame que está na cara do gol para ser lançado, o que eu duvido muito) e um novo filme seja anunciado a toque de caixa, Jason Voorhees, a lenda, o mito, maior especialista em voltar da morte para continuar estraçalhando por aí, não conseguirá dessa vez ressurgir das cinzas de novo e encontrar seu caminho de volta para Crystal Lake. Uma vez de volta pra Warner, a história vai ser outra e estaremos na estaca zero.

Fala sério: não parece até uma... maldição?