Dezesseis anos depois anos que Haley Joel Osment viu “pessoas mortas o tempo inteiro”, o diretor tenta voltar às origens em terror do tipo found footage
Dá para dizer sem errar muito que M.Night Shyamalan é uma vítima de seu próprio sucesso. Quando ARREBATOU público e crítica em O Sexto Sentido com aquele lendário plot twist final, o indiano que é cria de Alfred Hitchcock talvez NUNCA imaginasse todo o estrago que estava fazendo em sua carreira.
O fato é que o nível de exigência e a expectativa com seus próximos filmes tornaram-se altíssimos, muito por conta da incessante busca do espectador pelas reviravoltas em seus finais, algo que se tornou uma espécie de marca registrada do diretor. Virou obrigação. Tá certo que ele conseguiu cumprir em Corpo Fechado, mas tentou abandonar o subterfúgio em Sinais, que recebeu uma recepção bem das mornas, e depois, já perdendo fôlego, voltou ao modus operandi de seus finais mind blowing no fraquinho A Vila.
Hoje é mais certo constatar que Shyamalan não conseguiu atingir o estrelato que colocaram nas costas dele e acabou falhando miseravelmente em filmes dignos de pena como Fim dos Tempos e O Último Mestre do Ar. E aí não dá para te defender, miga.
Hoje o status de sua carreira se encontra no estágio “fazendo found footage para a Blumhouse Pictures de Jasom Blum”, como A Visita, seu novo longa-metragem que estreia nesta quinta (26) aqui no Brasil e pode ser considerado uma volta ao cinema de terror.
Se Shyamalan procura redenção, já adianto de antemão que ele não conseguiu aqui por completo, mas pelo menos ele retorna à velha forma e entrega um filme de terror redondo que, claro, tem um plot twist – dos bons, diga-se de passagem – e uma ótima construção de suspense crescente e sufocante no seu terceiro ato.
Na trama, um casal de irmãos adolescentes, Becca (Olivia DeJonge) e Tyler (Ed Oxenbould), vai passar uma semana na casa dos avós que não os conheciam, pois sua mãe FUGIRA de casa aos 19 anos e o contato se perdeu. Mas eles não desistiram, a acharam na Internet e gostariam de receber uma visita dos netos. Becca, do alto de seus 15 anos, resolve fazer um documentário sobre essa estada, filmando tudo o tempo todo, sempre auxiliada pelo irmão mais novo. A ideia é conhecer mais do passado de sua mãe e a casa onde ela cresceu – e tentar extrair daí um momento de perdão para ambas as partes.
Acontece que o comportamento da vovó (Deanna Dungan) e do vovô (Peter McRobbie) é estranho, errático e às vezes até violento. Ah, e ASSUSTADOR PRA CACETE! Principalmente da velha senhora que é diagnosticada com Síndrome de Sundown, termo médico que se refere ao período do tempo em que o sol se põe e provoca agitação e inquietação nas pessoas que possuem Alzheimer. Por conta disso, uma das regras mais importantes daquela casa é que as crianças têm de ficar em seus quartos após às 21h30.
Mas estamos falando de dois adolescentes, abelhudos por natureza, que conforme o comportamento demente dos velhos piora e eles passam ouvir barulhos estranhos durante a noite, começam a xeretar. Óbvio que o caldo vai entornar para seu lado, até que chegaremos ao, TCHAN-THCAN-TCHAN-TCHAN, plot twist de Shyamalan, óbvio.
Mas olhe, confesso que achei bem interessante, viu, indo contra todas as zilhares de explicações sobrenaturais que já passavam pela minha cabeça desde que vi o primeiro trailer e pensei que “lá vem mais um do Shyamalan achando que engana mais alguém nessa altura do campeonato”. Até dá uma gelada boa na espinha quando a virada foi revelada. Isso sem contar a intensa interpretação de Dunagan e McRobbie e seu degringolar de demência enquanto a última noite junto dos netos vem se aproximando. Sério, aquela tia dá um MEDO desgraçado por si só, muito maior do que qualquer monstro, encosto, zumbi, alienígena ou explicação clichê de filme de terror.
O problema é que até chegarmos lá, por conta da famosa estrutura narrativa dos filmes estilo “filmagem encontrada”, você perde uma hora da sua preciosa vida sentado em uma cadeira de cinema testemunhando O MAIS ABSOLUTO NADA, e aquelas cenas entediantes de diálogos ENFADONHOS, o moleque sendo um rapper infame, a rotina do dia a dia na casa dos avós, mesmo que os dois velhos sejam creepy as hell vez ou outra, e tudo que vem no pacote.
Dos novos subgêneros do cinema de terror, o found footage certamente é o mais saturado, surrado, usado até o bagaço e mais malhado que Judas no Sábado de Aleluia. Porque você já sabe EXATAMENTE tudo que vai encontrar nesses falsos documentários e já não abre precedente para nenhum tipo de surpresa: sustos fáceis, câmera tremida, visão noturna, sensação de claustrofobia, correria desenfreada e picos de adrenalina conforme se aproxima o final. Em A Visita, tá tudo lá.
E sinceramente, analisando a fita ao término deu seus 90 minutos, a conclusão é que não havia nenhuma necessidade de escolha da câmera na mão. O que difere aqui é a qualidade de Shyamalan como diretor de suspense, algo inegável, com ele resolvendo voltar ao básico e novamente evoca os ensinamentos do mestre Hitchcock, principalmente da sensação de medo e pavor daquilo que nós não vemos (NISSO o found footage ajuda, fato) e toda a construção da atmosfera e de personagem.
Só que TODO mundo já começa a assistir A Visita sabendo (ou imaginando muito forte) que teremos aquele momento de ficarmos boquiabertos, estupefatos, a sensação de que que fomos enganados e tudo que está ali bem na frente do nosso nariz não é nada que imaginávamos. O fetiche do diretor é, ao mesmo tempo, seu Cavalo de Troia e o calcanhar de Aquiles. Então o lance é se deixar levar e meio que já saber o que te espera, realizando de uma vez por todas que você NUNCA mais ficará tão passado como ao descobrir o que se passa com Bruce Willis em O Sexto Sentido.
Vai por mim que você fará um bem para si mesmo. Shyamalan agradece.