Os acertos, os erros, a expectativa e SPOILERS, claro. ;)
E na última semana foi ao ar, na TV americana, o 22o episódio da primeira temporada de Agents of S.H.I.E.L.D., season finale da série da Marvel exibida no canal ABC por lá, Sony por aqui (que, nessa reta final, resolveu se atrasar com a exibição dos episódios).
Com Beginning of The End, encerrou-se a primeira parte de uma bem-vinda iniciativa de integração do Universo Marvel dos cinemas também com as telinhas, que agora vai se ampliar com a série retrô Agent Carter e com as quatro produções da Cozinha do Inferno para o Netflix. A grande questão, no entanto, ainda permanece: por que diabos Agents of S.H.I.E.L.D. dividiu tanto as opiniões dos fãs, tornando-se algo muito longe de uma unanimidade? A esta pergunta, acrescentamos algumas outras: por que tanta gente simplesmente abandonou a série lá no começo e nem lhe deu as chances que deveria? Onde foi, no fim das contas, que Agents of S.H.I.E.L.D. errou – e onde acertou?
Creio que, para analisar este contexto, é preciso entender a questão das expectativas. Assim que a Marvel anunciou que faria Agents of S.H.I.E.L.D., esta série de TV focada em uma equipe de humanos trabalhando na maior agência de espionagem do mundo, atuando nos bastidores do mundo super-heroístico, o mundinho nerd entrou em polvorosa. Mas creio que boa parte da galera não soube administrar as expectativas: esperavam, aparentemente, que teríamos um Os Vingadores por semana na televisão. Mas, senhoras e senhores, não é assim que a banda toca. Não é e nem de longe poderia ser.
Eu, particularmente, consegui curtir a proposta da série desde o início porque jamais alimentei este tipo de esperança. Sempre tive em mente que Agents of S.H.I.E.L.D. faria conexões com a Marvel mas, no fundo, seria a oportunidade ideal para que os roteiristas explorassem aqueles vilões B e coadjuvantes obscuros que fariam os leitores mais hardcore delirarem – ao mesmo tempo em que serviria de bom ponto de partida para os neófitos.
É fato que os produtores da série cometeram alguns erros imperdoáveis, em especial até o episódio de número 7. Com um bom elenco de protagonistas em mãos, um time enxuto e diversificado, eles deveriam ter mantido o foco ali – em explorar mais intensamente o segredo do retorno do Agente Coulson (Clark Gregg), morto pela lança de Loki no filme dos Vingadores; em dar mais detalhes do motivo pelo qual Melinda May (Ming-Na Wen) era uma guerreira tão valorosa e apelidada de “cavalaria”; em nos deixar um pouco mais intrigados pelo passado desconhecido da hacker Skye (Chloe Bennet).
Mas não. Até o episódio 7, tudo foi caminhando de maneira divertida (o humor sempre foi um dos pontos fortes da série, é preciso dizer), mas bastante morna. Surgiram diversos novos personagens, mas nenhum deles era egresso do universo Marvel e tampouco interessante o bastante – como foi o caso da ex-agente da S.H.I.E.L.D. em Eye Spy (um dos mais fracos e maçantes episódios da temporada) ou do asiático em chamas em Girl In The Flower Dress. Nenhum deles era interesante o bastante para ser algo mais do que o “monstro da semana”. O sujeito flutuando entre dimensões em F.Z.Z.T. era um conceito interessante, mas gerou um episódio próximo do tedioso.
Faltou o impacto, faltou uma explosão inicial, algo que provasse que eles tinham mais a dizer. A misteriosa organização Centopeia – que, para mim, claramente sempre teve ligação com a HIDRA, desde a primeira vez em que os vi mencionados na trama – poderia ter tido mais pegada, poderia ter sido posicionada como o grande inimigo desde o início, ao invés de “um dos nossos muitos antagonistas”. À exceção do Dr. Franklin Hall, cientista que os leitores de quadrinhos sabem que se tornará o vilão Graviton (apresentado no episódio The Asset), não tinham surgido até o momento outros personagens que dessem a entender que Agents of S.H.I.E.L.D. estava querendo fazer uso ativo da rica galeria de personagens da Casa das Ideias.
Até então, eu tinha gostado de Agents of S.H.I.E.L.D., em especial pela dupla de cientistas Fitz-Simmons (Iain De Caestecker e Elizabeth Henstridge), uma dobradinha com excelente química e com espaço suficiente para citações nerds a dar com pau. Mas estava, confesso, preocupado com o que vinha pela frente.
O primeiro grande momento da virada da série, no entanto, veio no oitavo episódio, The Well, que tinha ligação direta com o filme Thor: O Mundo Sombrio. A partir dele, Agents of S.H.I.E.L.D. começou a mostrar a que veio, de fato. Na trama, ambientada pouco depois da luta do Deus do Trovão com os elfos negros, a mitologia nórdica entrou em pauta, com artefatos que despertavam a fúria do guerreiro nos mortais, coisa e tal. E com direito até a um deus asgardiano exilado secretamente entre nós, num conceito que funcionou muito bem e que deveria voltar a ser explorado na segunda temporada, aliás. Foi a primeira injeção para que a série saísse de sua letargia. A segunda virada, esta definitiva, rolaria na reaparição de Mike Peterson, aquele personagem vivido por J. August Richards logo no episódio-piloto e que ninguém sabia quem era – a aposta de que ele fosse Luke Cage logo caiu por terra. Mas em The Bridge e em The Magical Place, pavimentou-se a estrada para que ele se tornasse o ciborgue Deathlok, uma das grandes surpresas deste primeiro ano.
Viriam então Victoria Hand – outra boa opção, já que nos quadrinhos ela sempre foi uma agente dupla e, portanto, faria com que os leitores habituais esperassem uma traição da parte dela, o que acabou não acontecendo – e John Garrett, o parceiro cibernético da ninja protagonista da graphic novel Elektra Assassina. E com Yes Men, o episódio no qual a provocante deusa Lorelei foge de Asgard e deixa uma trilha de homens enfeitiçados enquanto é caçada pela Lady Sif, Agents of S.H.I.E.L.D. fez sua integração plena e absoluta com a Marvel em sua encarnação audiovisual.
É claro que Turn, Turn, Turn, o capítulo que teve ligação direta com a trama de Capitão América 2 e que mudou o paradigma da S.H.I.E.L.D., foi sem sombra de dúvidas o melhor da temporada, com doses de intriga e espionagem tão fartas quanto as do filme, dando uma sacudida tremenda na história. Mas este não foi o único momento memorável. The Only Light in the Darkness, por exemplo, usou de extrema inteligência e sensibilidade ao transformar uma piada de Os Vingadores, a namorada violoncelista de Coulson, em uma personagem de verdade, que passou a ter importância real na vida do líder do time. Outro episódio marcante desta temporada.
Uma coisa da qual não se pode acusar os roteiristas da série, no entanto, é de ter optado pelos caminhos mais fáceis. A escolha de John Garrett, e não de Victoria Hand, para ser o Clarividente, o misterioso líder da Centopeia, foi uma grata surpresa, passando longe da obviedade. Bill Paxton, que já estava ótimo no papel de Garrett, assim que revelou seu lado vilanesco passou a brilhar ainda mais, emprestando uma canastrice deliciosa e divertidíssima ao papel, tornando-se um destes vilões cartunescos, tipicamente das histórias em quadrinhos da Marvel. E conectar a origem de Skye com a ressurreição de Coulson, salpicando pistas sobre uma raça alienígena até o momento não abordada em nenhum filme da Marvel – há quem aposte fortemente nos krees – também foi daquelas viradas dignas de nota.
Agents of S.H.I.E.L.D. começou OK, vá. O piloto é bacana, funciona. Mas depois disso, teve uma barriga visível, uma queda lá no começo que era inadmissível para uma série em sua primeira temporada, precisando mostrar todas as suas armas. Só que ela não apenas conseguiu se recuperar como o fez de forma brilhante, deixando pontas soltas na medida certa para a segunda temporada. Recomendamos fortemente àqueles que, porventura, abandonaram a série lá em seu terceiro ou quarto episódio, que assistam pelo menos do décimo-quinto em diante, até o fim. Com certeza a sua opinião vai mudar consideravelmente. :)
O que podemos esperar da segunda temporada de Agents of S.H.I.E.L.D.? Bom, a reconstrução da agência, depois que o próprio Nick Fury entregou a tarefa nas mãos de Coulson como diretor geral, deve estar intimamente ligada com o próximo filme dos Vingadores, em algum nível. Mas esperamos também ver um pouco mais a respeito das origens de Skye (Kree? Inumana? Herdeira de Thanos? Filha dos Gigantes do Gelo?), que percorrem também o DNA de Coulson. Aqueles rabiscos que ele começou a fazer nas paredes, assim como Garrett, podem significar que o principal agente da S.H.I.E.L.D. começou a ficar biruta, exatamente como ele mesmo alertou a Fury? O soro GH-235 vai finalmente mostrar seus efeitos colaterais na psiquê de Coulson? E quem diabos é o tal pai da Skye, aquele da mão ensaguentada a quem a moça do vestido florido entrega a foto da menina?
Sabemos que os caminhos dos personagens vão se cruzar com os de Deathlok novamente, possivelmente agora tentando fazer o bem, ainda que de seu jeito particular e meio atrapalhado. E dá para imaginar que o Graviton, agora como vilão, vai enfim dar as caras, já que o inescrupuloso empresário Ian Quinn fugiu de posse da substância Gravitonium – que tinha engolido Franklin Hall. O que rolou, afinal, com Fitz depois que ele e Simmons fugiram da enorme caixa metálica no fundo do mar, em uma das cenas mais lindas e emocionantes de toda a temporada? Será que ele estará submetido a algum tipo de condição que o transformará em outro personagem conhecido, assim como rolou com Mike Peterson quando ele se transformou no Deathlok?
Aliás, por falar nisso, cabe aqui uma reflexão sobre o destino do Agente Ward (Brett Dalton). Depois que se descobriu que ele era um traidor infiltrado, agindo em nome da HIDRA e sob as ordens de Garrett, muitas especulações surgiram na internet. As teorias mais sem sentido falavam a respeito de ele se tornar o Deadpool – mas, vamos pensar por um minuto apenas, o personagem está dentro da lista de personagens mutantes que a Fox tem da Marvel por contrato. Portanto, sem chances. No entanto, outra boa teoria surgiu recentemente, dando conta de que ele poderia se transformar no vilão Treinador (Taskmaster). É um sujeito com valioso treinamento militar e marcial e que tem a habilidade de emular, depois de segundos de luta, o estilo de qualquer adversário, aprendendo a derrotá-lo. E detalhe: o Treinador, apesar de estar entre os criminosos, vez por outra negocia algumas ações com a S.H.I.E.L.D. em troca de anistia. Acho que funcionaria perfeitamente.
Agents of S.H.I.E.L.D. ainda tem muita lenha pra queimar. Além de Ian Quinn, de Ward e da própria HIDRA (que tem em Von Strucker um líder cujo potencial só será conhecido no próximo filme dos Vingadores), eles poderiam trazer a IMA, diretamente de Homem de Ferro 3. Coadjuvantes como o Máquina de Combate e mesmo o Falcão poderiam dar as caras na telinha para aparições especiais como a da Sif, por exemplo. Poderiam aproveitar não apenas o Graviton e, quem sabe, o Nevasca, mas também outros vilões B como Mentallo, Tecno ou talvez a Gangue da Demolição (isso ia ser um TESÃO!). Tenho ainda a esperança de que o Hércules, na versão Marvel, surja em toda a sua glória, ego e apetite pela bebida. Resta só saber se eles vão queimar esta lenha toda do jeito certo. Se se inspirarem apenas na reta final da primeira temporada, vai ser lindo. :)