Basta só ver a doçura que é a avó de Jesse Custer e o tipo de purgatório que Tulip se vê obrigada a enfrentar pra sacar, já no primeiro episódio, que os produtores e roteiristas tão MESMO dispostos a nos dar ainda muito mais sangue, suor, risos, lágrimas e pólvora. HELLYEAH!
Dá só uma olhada no perfil oficial de Preacher no Twitter. Diferente do que rolou nas temporadas anteriores, o canal deixou a sutileza de lado e está claramente entrando no jogo, entendendo a maior força do que tem em mãos. “Facilmente provocado? Não veja Preacher”, diz o imagem do topo da página.
Seja chamando o domingo, dia da transmissão da série no AMC, oficialmente de #SinDay (“Dia do Pecado”); aproveitando o visual “látex canino” de Deus pra dizer “In Dog We Trust”; estampando sem medo de ser feliz adjetivos como “perturbada”, “esquisita”, “ofensiva”, “blasfema” e “profana”, o fato é que Preacher agora tá se assumindo como é de verdade até mesmo nas peças publicitárias — e pro inferno (neste caso, talvez até literalmente) com as One Million Moms e similares.
Pra quem se apaixonou pelas duas temporadas anteriores, isso só joga as expectativas ainda mais lá em cima. E, apesar de servir “apenas” como uma espécie de apresentação para o novo núcleo de personagens que vão dar as caras a partir de agora, enfiando uma família disfuncional como ponto de parada no meio de uma road trip em busca de um Deus que desistiu de seu papel no Céu, o primeiro episódio desta temporada esquenta muito bem os motores pro que está por vir que, aliás, pode ser inspirado nos quadrinhos, em especial no arco Até o Fim do Mundo, tudo bem, muito legal. Mas se não for também, honestamente, bem que foda-se, né? Porque se o ponto de partida é o mesmo, a jornada pode (e, em certos casos, até DEVE) ser bem diferente. E no caso do Preacher, isso funciona bem demais.
SPOILER! Pra trazer a Tulip de volta à vida, Jesse Custer convence o sanguessuga Cassidy que existe uma solução e ela reside justamente no único lugar do mundo que o pastor odiaria ter que visitar novamente na vida, encarando então aquela que talvez seja a única pessoa no mundo da qual ele tem medo de verdade: sua avó.
No papel da matriarca da família, a única parente de Jesse ainda viva, Betty Buckley já convence muito bem logo de cara como Madame L’Angelle, uma feiticeira com poderes inspirados no vudu e demais práticas místicas da Louisiana. Diferente dos costumeiramente HISTRIÔNICOS personagens da série, sempre exagerados, ela se foca em olhares furtivos e movimentos sutis, sendo praticamente uma daquelas bruxas silenciosas e assustadoras de filmes de terror. Dá pra entender claramente o motivo do pavor de Jesse por esta mulher que passou a infância torturando o garoto.
Era de esperar que ele tivesse que dar algo em troca para que a avó, que o considerava um traidor por ter fugido da fazenda Angelville, outrora um próspero negócio que mistura turismo e serviços de magia e agora está na merda. E Jesse acaba dando, ainda que não saibamos bem o quê. Mas é o sangue, literalmente, cobrando seus débitos — o primeiro de apenas alguns que veremos daqui pra frente. Um sangue que está mais do que disposto em usar a Tulip, aliás, pra colocar o pastor contra seu amigo irlandês vampiroso.
Também impressionante ficou Jeremy Childs como Jody, o faz tudo da Madame, um homem enorme, de olhar vidrado, intimidador, que emana um tipo particularmente físico de medo. Aquele que Jesse nunca venceu numa luta. E, depois de um quebra-pau divertido na cidade, as coisas ficam sérias PRA CARALHO quando Jody também resolve que é hora de cobrar seu débito particular com o homem de fé (?). Ou seja: no fim, o trio Jesse/Tulip/Cassidy está, isso sim, é bem do cercado por uma leva de novos e empolgantes antagonistas, mais do que apenas coadjuvantes.
Uma coisa que parece ainda mais interessante aqui é a exploração de FORMATOS para trabalhar não só flashbacks mas também no retrato de outros planos de existência. Para falar do passado de Angelville e mostrar como foi que a mãe de Jesse resolveu picar a mula do lugar, a opção foi por uma estética BEM horror mesmo, uma fotografia em preto e branco cheia de fortes contrastes e na qual Madame L’Angelle ocupa um lugar de destaque em meio às sombras. Pouco se vê, mas muito é dito ali.
E aí temos, enfim, o purgatório. Que, no caso de Tulip, é o lugar no qual ela espera seu destino final, ser levada pela morte. Só que, para ela, o purgatório é uma mistura de cenário simples a la Dogville e sitcom com plateia. E, ao lado de uma pequena versão infantil dela mesma, somos apresentados ao seu passado, com um pai que saiu da cadeia e não teve a chance de provar que mudou e uma mãe que simplesmente não se importava com a menina porque, no fim, ela era muito mais parecida com o próprio pai. Tudo com interpretações cheias de caras e bocas e as risadas da plateia, tornando a coisa ao mesmo tempo engraçada e desconfortável.
Se eles usarem cada vez mais este tipo de recurso, longe do óbvio, na melhor tradição de Legion, vai ser legal DEMAIS. E, tal qual a série de Noah Hawley, eles PODEM. Já conquistaram o espaço pra isso.
Isso tudo, vejam, porque ainda estamos no PRIMEIRO episódio. E não tivemos nem sombra do Herr Starr e da organização conhecida como Grail; tampouco do Santo dos Assassinos — ambos, cada um com seu estilo particularmente diferente mas que podem acabar igualmente numa verdadeira carnificina desenfreada, têm seus débitos a cobrar do nosso trio de “nobres” protagonistas. Junte todos estes elementos e aquela pitada sensacional de non-sense (o Deus-Cachorro, aliás, também já aparece pra cobrar sua própria dívida pessoal...) para uma nova chuva de caos e fúria, confusão, gritaria, tiroteio e dedo no cu.
Isso é o MÍNIMO que a gente espera do Preacher.
PS: Descobrir que a rapidíssima banda inglesa de heavy metal Dragonforce é uma das favoritas da Tulip foi realmente a cereja do bolo. Já no aguardo de uma sequência de porradaria ao som desta música. Digamos que o título é bem apropriado.
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