A Cura: o espetáculo visual impressionante de Gore Verbinski | JUDAO.com.br

Experiência audiovisual é um DESBUNDE, mas tem lá seus (muito) poréns.

Vai por mim: esqueça quase tudo que você viu por aí nos trailers e materiais promocionais de A Cura, a volta ao terror de Gore Verbinski, o diretor de O Chamado, depois de suas aventuras em mega produções com Johnny Depp nos últimos anos. Aliás, esqueça rincipalmente a forma com que A Cura vem sendo vendido.

Ao ir aos cinemas ver a estreia dessa semana (que merece ser vista em uma tela grande, a maior e com melhor qualidade de imagem e som que você conseguir), tenha em mente que você vai assistir a um espetáculo audiovisual e técnico dos mais impressionantes, com uma direção impecável e excelente construção de atmosfera, uma fotografia belíssima de Bojan Bazelli (que também é o mesmo cara de O Chamado), edição de som incrível e design de produção ímpar. Tudo em prol de um suspense intrigante que prende a atenção do espectador, mesclado com uma série de imagens ONÍRICAS bizarras e perturbadoras.

UAU, FILMAÇO, certo? Bom, maomeno.

A metragem é muito longa (são 2h26 de filme) — ela até que começa fluida, vai toda trabalhada num processo de slow burning mas aí se arrasta demais. O roteiro é cheio de poréns e furos, com alguns elementos que parecem ter sido jogados ali apenas para cumprir algum protocolo, com direito a um terceiro ato CANHESTRO, didático e previsível, que destoa completamente do resto e que, bem, parece ter lá um dedo podre do estúdio e pode te deixar frustrado pacas.

Dane DeHaan (que está muito bem, diga-se de passagem) é Lockhart, um ambicioso e inescrupuloso jovem executivo de Wall Street que se vê em uma delicada posição quando a mesa diretora descobre algumas falcatruas no fechamento de um contrato que trouxe um importante cliente e pavimentou sua ascensão meteórica dentro da firma. Em troca de não entregá-lo para o LEÃO, ele é enviado para um spa lindíssimo nos alpes suíços para encontrar e trazer de volta o CEO da companhia que foi pra lá tirar umas férias IDÍLICAS e relaxantes de duas semanas, mas nunca mais voltou. O sujeito mandou uma carta toda enigmática dizendo que estava doente e lá encontrou a cura, abdicando de sua antiga vida capitalista. Isso iria atrapalhar uma vindoura fusão que precisa da assinatura do manda-chuva, que claramente parece ter ficado biruta.

O que seria essa “doença”? Segundo a explicação do diretor do spa, o Dr. Volmer (Jason Isaacs), é o capitalismo voraz, a ambição, a ganância sem limites morais (todos os idosos internados ali são podres de ricos com ex-cargos de liderança em empresas multinacionais). A “cura” seria se desligar desse mundo mesquinho e material, passando seus dias em um local ermo na montanha, construído em cima de um aquífero com propriedades medicinais — que tem lá sua história sinistrona.

Há 300 anos um barão ficou obcecado pela pureza de sua linhagem e, por isso, a única opção era gerar seu rebento com sua irmã. Isso revoltou os aldeões que viviam na vila sob a sombra do castelo no alto da colina, que invadiram o local com suas tochas e forcados, atearam fogo na moça e destruíram o local, consumido em chamas.

Lockhart sofre um acidente de carro (em uma cena ABSURDA quando um veado sai da vegetação e se choca com o veículo), ficando ferido e com a perna engessada, confinado no spa sob os tratamentos do Dr. Volmer, enfiado até em uma câmera de privação de sentidos, ao melhor estilo John C. Lilly. Não vai demorar para ele descobrir que há algo de muito estranho acontecendo por aquelas bandas e conhecer uma jovem chamada Hannah (Mia Goth), considerada pelo chefão do sanatório como seu “caso mais especial”. Durante sua investigação sobre o que a foda está acontecendo ali, sua própria sanidade passa a ser questionada quando ele é diagnosticado com mesma “doença” dos demais ali internados.

Não dá para falar muito mais sem entrar no campo dos ESTRAGADEIROS, mas o longa causa uma sensação de estranheza e desconforto durante todo seu desenrolar, numa explosão sinestésica, alternando o contraste de um mundo moderno e sombrio lá fora com a assepsia do interior do spa e seus diversos elementos retrôs, principalmente de maquinário médico e científico, além da arquitetura e figurino, dando a clara impressão de um local deslocado no tempo e espaço.

Se feito há 50 anos, A Cura poderia muito bem ter sido um filme da Hammer Studios, um gótico italiano dirigido por Mario Bava ou Antonio Margheriti, ou até mesmo alguma produção da American International Pictures que teria Vincent Price no papel de vilão. O longa de Verbinski, tirando sua aura de bizarrice, a imensa capacidade técnica e sequências tétricas de pessoas flutuando em tanques, enguias saindo de banheiras e alucinações tipo Viagens Alucinantes, de Ken Russell, tem um plot que se assemelha muito aos filmes de terror daquele período, com todo um aparato gótico misturado com o bom e velho conceito do mocinho preso em um local estranho – um castelo no alto de uma montanha íngreme ladeada por uma floresta e uma aldeia em sua base, comandado por um doutor com a pegada clássica do cientista louco, cercado de pessoas estranhas com intenções escusas, tentando descobrir o que está rolando e uma donzela em perigo no meio.

A Cura é um bom filme? Sim, mas nada espectacular. Merece ser visto? Sim, mas com ressalvas. Definitivamente não é para o grande público (principalmente por aqueles que vão assistir pelo trailer e spots de televisão que alardeiam ser “do mesmo diretor de O Chamado”).

Você precisa estar no humor certo, ciente de seu final questionável (que pode ser muito difícil de defender, verdade seja dita) e, principalmente, ter uma ótima experiência na sala de cinema, que vai da qualidade de exibição até o silêncio do público presente, pois o clima conta muito para a imersão na trama e apreciação desse espetáculo imagético que é um verdadeiro desbunde.