Diversidade: o que a Marvel tem que a aprender com a DC

A Marvel conseguiu o que parecia impossível com o Universo dos cinemas. Mas bastaram dois episódios de uma série da DC pra que o óbvio fosse jogado na nossa cara: diversidade é legal pra caralho!

Esse é só um pensamento que me ocorreu enquanto, com um grande atraso em relação ao universo, assisti à “The Balloonman” e “Arkham”, o terceiro e quarto episódios de Gotham — série que, diga-se de passagem, tenho acompanhado e gostado bastante, até por se tratar do universo do personagem mais Marvel da DC.

Num determinado momento, Montoya vai até o apartamento da Barbara, na tentativa de MINAR o relacionamento dela com o Gordon, provando que ex bom é mesmo ex morto. Ela vem, de novo, com o papinho de que merece alguém melhor, se olham nos olhos (numa sequência em que provavelmente o continuista pediu pra ir no banheiro), pinta o clima, vem aquela tentativa de beijo roubado e pronto, tá confirmado que as duas tiveram um relacionamento. E foda-se.

Barbara e Montoya em "The Balloonman"

Barbara e Montoya em “The Balloonman”

Quando confessa pro Gordon o fato, ela o provoca questionando se todo aquele mimimi é por ser uma mulher; eu diria que tem mais a ver com uma pessoa do passado retornou pra encher aquela cabeça loira e linda de CARAMINHOLAS, dane-se se é mulher, homem ou qualquer outra coisa. Não entendi que tipo de mentira ela pode ter contado pra ele (que era virgem? Primeira pessoa com quem ela se relaciona? Qualquer outra coisa não faz sentido!). Mas o fato é que o Gordon é como 99% das pessoas e fica de mimimi por conta de um ex. Ou uma ex. Em nenhum momento houve qualquer tipo de preconceito, homofobia, ou whatever. São essas pessoas sendo essas pessoas, apenas e tão somente.

Enquanto isso, lá no bar, em busca de uma ARMA, Fish Mooney questiona a duas garotas se elas gostam de meninos ou meninas. A resposta (“meninos”, nos dois casos) pouco importa, já que ela pede que elas a seduzam (“como se eu fosse um homem”) — a primeira faz uma massagem bem mequetrefe e a segunda faz com que todos os olhos, TODOS, se pretendam naquela caminhada do palco até a frente de Fish, que ganha um beijo e uma taquicardia.

Vamos fazer as contas aqui com o tio, rapidinho: dois episódios, relacionamentos homossexuais envolvendo uma loira, uma latina e uma negra em uma série que tem, até agora, quatro mulheres de várias cores e idades, com papeis importantes.

Liza deixando Fish Mooney (e todo mundo) com a boca seca

Liza deixando Fish Mooney (e todo mundo) com a boca seca

Do outro lado

Semana passada a Warner resolveu cagar na cabeça da galera e anunciar quais serão seus maiores filmes até 2020. Focando apenas no Universo DC (que, vamos nos lembrar, não necessariamente vai ter a ver com o da TV, especialmente em relação a Gotham) teremos o Esquadrão Suicida, com um negro e uma mulher protagonizando; Mulher Maravilha, com a Gal Gadot — que foge completamente de todos os padrões de “corpo” possíveis, inclusive aqueles desenhados nos gibis; Aquaman e Shazam com pelo menos dois ~samoanos; e Cyborg, com um negro protagonizando. E ainda tem o Lanterna Verde...

ENQUANTO ISSO, na Casa das Ideias, se você imaginar todo o elenco principal dos DEZ filmes e séries lançados até agora reunidos num lugar, preparando uma selfie, muito provavelmente vai enxergar um pote de palmito. Uma coisa outra ali, um pouco mais escura e sem esse formato fálico, mas olhando de longe, é isso. Homens, brancos, heterossexuais.

E isso não parece que vai mudar tão cedo. “Se fosse por mim, faríamos hoje. Nós temos muita pressão interna por tudo o que fazemos, não precisamos de pressão de fora”, disse, em entrevista à Variety, a produtora executiva e vice presidente de efeitos visuais e pós-produção (yup, esse é um cargo) da Marvel, Victoria Alonso. “O sucesso dos super-herois, nossos ou de outros, é o sucesso de todos”.

Kevin Feige, o chefão, deus todo poderoso do Universo Marvel nos cinemas, vem respondendo sobre isso há muito tempo. Em Agosto, na época do lançamento de Guardiões da Galáxia — que talvez seja uma exceção nessa história, ainda que o protagonista seja mesmo um cara branquelo — Feige afirmou ao Comic Book Resources que “acredita muito em fazer esses filmes”, protagonizados por mulheres. “É injusto dizer que as pessoas não querem assistir a filmes com heroínas e listar cinco filmes que não eram bons e dizer que foi por causa das mulheres. E aí não citam Jogos Vorazes, Frozen, Divergente”, disse. “Você pode até voltar pra Kill Bill e Aliens. São todos protagonizados por mulheres, claro que pode ser feito”.

TEJE PRESA!

TEJE PRESA!

Mas, quando o assunto é o seu próprio Universo, a coisa muda um pouco de figura. “A gente se encontra numa posição estranha de gerenciar mais franquias do que os outros, o que é muito, muito bom, mas é um desafio muito grande. (...) você precisa deixar uma franquia de lado pra introduzir uma nova”, afirmou, afinando o discurso com Victoria Alonso de que “olha, a gente quer, mas sabe, não dá”.

Ele, aliás, já chegou a dar algumas desculpas esfarrapadíssimas pra (tentar) justificar a falta de uma mulher protagonizando um filme da Marvel — especialmente depois do que se viu em Vingadores e Capitão América 2, o que, pra ele, “já é praticamente um filme da Viúva Negra”. De “ainda não é a hora” à “já existem muitas mulheres na Marvel”, passando pelo fato de não ganharem crédito por um filme assim, o /Film fez uma lista das justificativas que, como você vai perceber, estão cada vez mais sentido.

A exceção está Agents of SHIELD — que é uma criação do Joss Whedon e, sendo assim, tem muito mais coisas da cabeça dele do que da própria Marvel, além de ser uma série de TV. Por exemplo, quem mais chuta bundas por lá é uma mulher, a mais inteligente é uma mulher, AMBAS tem ascendência Chinesa, e ainda há dois negros na equipe (a partir da segunda temporada). E ainda tem as vindoura séries do Luke Cage e da Jessica Jones. Mas... É muito pouco, não?

Porra, até o CYBORG vai ganhar um filme!

Cyborg

Veja, eu não sou desses chatos que acham que TUDO precisa ter uma mulher, TUDO precisa ter negro, latino, e não sei o que. Eu sou a favor de histórias, bem contadas. PONTO. Se nos Vingadores, por um acaso, todo mundo é branco e heterossexual, não há absolutamente nenhum problema quanto a isso. O Thor é NÓRDICO?! Tudo bem! Tony Stark branco, Pepper Potts ruiva? Ok, beleza. Não tou aqui dizendo que é necessário trocar cor ou gênero dos personagens (ainda que, sinceramente, com raríssimas exceções, isso não mude absolutamente em nada o rumo de uma história). Só me chamou mesmo à atenção que, em dois episódios de uma série, uma loira pegava uma latina, uma negra pegava uma ninfeta, sendo a coisa mais normal do mundo (que, de fato, é).

A partir do momento em que se pensa e planeja um UNIVERSO, por mais coeso que seja, com diferentes histórias, diferentes visões, diferentes pontos de vista, diferentes publicos alvo, talvez fosse o caso de fazer com que o que se vê nas telas, grandes ou pequenas, refletisse um pouco mais o mundo em que vivemos. Não foi exatamente assim que a Marvel conseguiu ser o que é hoje, fazendo com que eu e você nos identificássemos com aqueles personagens?!

Marvel, gosto muito de você, cê sabe. Mas, ainda que a DC esteja naquela fase entre engatinhar e tropeçar-e-cair fora dos quadrinhos, mostraram que pelo menos na DIVERSIDADE eles ganharam essa briga.

Será mesmo que um “Universo Coeso” é assim tão importante depois disso?