HQ holandesa estrelada por uma poderosa guerreira em um mundo de fantasia, monstros e espadas, que não é a Red Sonja, pode ser o ponto de partida ideal para a criação original de Don Lawrence
Ela é ruiva, ela é fodona, ela vive num mundo de bárbaros sem lei, não tem medo de fazer o trabalho sujo e, com uma espada na mão, ela é um BICHO FEROZ, como diria Bezerra da Silva. Red Sonja? Não. Ember.
É, a Ember, heroína dos gibis de fantasia europeus e cujo primeiro volume das chamadas Crônicas da Ruiva acaba de chegar aqui no Brasil: A Lenda de Krill, um encadernado de 48 páginas publicado pela AVEC Editora. “Olha, quando a gente trabalha em um gibi holandês, não pensa imediatamente em ser publicado num lugar como o Brasil. Leva tempo pra fazer estas conexões acontecerem”, admite Romano Molenaar, desenhista da HQ, em entrevista exclusiva para o JUDÃO. “Estou emocionado! Penso no Brasil como um país fantástico, onde as pessoas sabem aproveitar a vida”.
Ember (também conhecida, em alguns mercados, como Roodhaar) é uma personagem surgida no universo de Storm, série criada pelo desenhista inglês Don Lawrence em 1976 e que, com roteiros de Martin Lodewijk, começou a ser inicialmente publicada na revista semanal Eppo. Com o sucesso local, Storm ganharia sua própria série de álbuns especiais e seria traduzida para pelo menos 14 diferentes idiomas.
Storm, o protagonista da série de mesmo nome, é um astronauta do século 21 que faz uma jornada para a chamada Grande Mancha Vermelha de Júpiter, um enorme anticiclone que está ativo há pelo menos 300 anos, a maior tempestade do nosso Sistema Solar. O ponto é que, quando ele se aproxima, sua nave acaba sendo tragada e Storm vai parar no futuro. Quando ele finalmente retorna ao nosso planeta, as coisas mudaram um pouquinho: as civilizações tradicionais da Terra entraram em colapso e se tornaram uma sociedade baseada na barbárie. Basicamente, tudo se resolve na base da espada e do machado; o mundo se tornou um imenso D&D ou, melhor ainda, uma gigantesca HQ do Conan. Lembra do desenho animado Thundarr, o Bárbaro? Meio nesta pegada aí.
Sabe quem cruza o caminho de Storm e se torna sua grande parceira de armas? Uma ruiva furiosa chamada Ember. ;)
A série original chegou a ser parcialmente publicada no Brasil no final dos anos 80, pela Editora Abril, com 10 volumes que depois nunca tiveram continuação. Justamente por isso, a editora brasileira apostou que A Lenda de Krill, lançada lá fora em 2014, poderia ser um bom ponto de partida para novos leitores por se tratar de uma prequência, a primeira aventura de Ember muitos anos antes de conhecer o amigo Storm. “Creio que a Ember é uma personagem interessante o bastante para ser lida mesmo se você nunca leu um gibi do Storm na vida”, diz Molenaar. “Ela tem habilidades incríveis que a ajudam a sair de qualquer situação”.
Na trama, o vilarejo de Krill, no qual Ember vive, é atacado pelos homens do governante da cidade de Rhagus, justamente depois da jovem completar 19 anos. Ela, o pai adotivo Kiley e a irmã de criação Pearl são capturados e levados com outros prisioneiros para Gordar, o Senhor da Guerra. No reino dominado por ele, Ember descobrirá detalhes sobre seu passado misterioso. A história pode não ser exatamente a mais original do mundo para quem já leu qualquer gibi de fantasia da história (Conan aí devidamente incluído), mas tem lá uma virada inesperada nos momentos finais e ainda reserva sequências de ação interessantes, enquanto a arte de Molenaar faz uma mistura bacana de John Romita com traços mais contemporâneos, de desenhistas de super-heróis mais atuais.
Só que a parte mais legal da trama é ver que Ember se recusa a ser aquilo que, dizem, ela estaria destinada a se tornar — uma mulher nascida para servir a um marido escolhido por seu pai. Ela deseja ser uma guerreira, lutar para defender quem ela ama, a protetora de seu povo. Até as roupas que ela usa são MUITO diferentes das roupas de todas as outras mulheres de Krill, sempre com imensos vestidos recatados.
Desde a morte de Lawrence, em 2003, o holandês Molenaar assumiu as vezes de artista de Storm e de seu spinoff, trabalhando ao lado do colorista Jorg De Vos. Anteriormente, Romano já tinha trabalhado como freelancer para o mercado americano, em títulos como Lady Death (Chaos Comics), Witchblade / The Darkness (Top Cow) e X-Men Unlimited (Marvel Comics). Em 2012, ele ainda teve a chance de cuidar, como artista regular, da arte do título das heroínas de Birds of Prey (Canário Negro, Caçadora e Oráculo/Barbara Gordon).
No entanto, ele considera este um dos seus maiores desafios até o momento, já que os roteiros são de ninguém menos do que o próprio Roy Thomas, criador da Red Sonja e um dos maiores escritores do Conan de todos os tempos. “Trabalhar com Roy Thomas foi ao mesmo tempo uma honra e um bocado amedrontador”, conta. “Quer dizer, pô, o cara é uma lenda! Mas é bom saber que a história que você está prestes a desenhar é de um escritor também experiente. Mexe com a sua adrenalina de artista, faz você querer dar o melhor de si mesmo”.
Molenaar acha natural que os universos de Storm/Ember sofram comparações, ainda mais sob a pena de Thomas. Mas o fato de que a ambientação de Storm é essencialmente o futuro do nosso planeta, uma visão pós-apocalíptica transformada em fantasia, torna as coisas ligeiramente diferentes. “E eu acho que a Ember é menos hardcore do que a Sonja em situações de combate. A Red Sonja é violenta por natureza, você pode ver nos olhos dela. Ela gosta do combate, como o Conan. Com a Ember é diferente. Ela luta por causa de cada situação, para atingir um objetivo”.
O artista, que já teve suas experiências no mercado americano, enxerga uma clara diferença no esquema de trabalho entre EUA e Europa, a começar pelos prazos. “Na Europa, eles não são tão curtos quanto na América. Quero dizer, 22 páginas por mês são comuns quando se trata de Marvel ou DC. Com Ember e Storm, tenho coisa de quase três meses para finalizar um álbum. Mas pode rolar até mais, em alguns casos”. Outra diferença primordial é a dinâmica dos painéis, os quadros nos quais os personagens são desenhados. “Com Ember, eu trabalho num fluxo de quadros bem mais controlado. Os quadrinhos não se sobrepõem e os heróis não pulam dos painéis como nos comics, com suas splash pages e páginas duplas. Temos que encontrar outras saídas para reforçar a tensão em cenas de ação”.
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