Ezra Miller vai escrever roteiro do filme do Flash com o Grant Morrison. Ou então ele tá fora. | JUDAO.com.br

Protagonista dá um ultimato: se o estúdio não seguir o tom mais “sombrio” que ele e o escritor escocês vão desenvolver, é melhor procurarem outro ator pro papel

Parece mesmo que a tarefa de cuidar do planejamento dos filmes da DC dentro da Warner Bros. não deve ser das mais estáveis na vida de um ser humano. Porque vejamos: veio Homem de Aço, Batman vs Superman, aí começaram a trabalhar o tal universo compartilhado a longo prazo, filmes da Mulher-Maravilha, do Aquaman, do Cyborg, do Flash...

No fim, BvS foi o que foi, Liga da Justiça igualmente, Esquadrão Suicida não deu nem pro cheiro, a aventura solo do Cyborg ninguém sabe onde foi parar e o que temos AGORA é um Aquaman que funcionou muito bem sozinho, uma continuação da Mulher-Maravilha a caminho, o Shazam! que promete ser diversão pura, uma reinterpretação do Esquadrão pelas mãos do James Gunn, as Aves de Rapina, os Novos Deuses da Ava DuVernay, o Falcão Negro do Spielberg... E tudo com uma mensagem muito clara: nada de universo compartilhado, tá? Pode ter uma pista aqui, uma brincadeira ali, mas deixa de lado, de uma vez por todas, esta ÂNSIA de ter ter que correr atrás da Marvel na construção de uma histórica única ao longo de 20 filmes. Vamos fazer uma coisa de cada vez, né?

E aí é que a gente se pergunta: neste novo cenário da DC, que finalmente parece minimamente organizado e com um objetivo à frente, como diabos se encaixa o tal filme protagonizado pelo Flash? Bom, parece que a Warner tem mais uma pequena confusão à vista para administrar...

Depois que Seth Grahame-Smith (roteirista de LEGO Batman) e Rick Famuyiwa (Dope: Um Deslize Perigoso) abandonaram a cadeira de diretor por conta das famigeradas “diferenças criativas”, a dupla John Francis Daley e Jonathan Goldstein (ambos roteiristas de Homem-Aranha: De Volta ao Lar) assumiu uma responsabilidade aparentemente bem maior e casca grossa do que imaginaram, diante de um novo roteiro, cortesia de Joby Harold (Rei Arthur: A Lenda da Espada – OUCH).

Segundo consta, caberia a Harold a honra de REESCREVER completamente o filme pela 3a vez. E como falamos por aqui, inclusive esquecendo aquele papo original de que o filme seria inspirado em Flashpoint / Ponto de Ignição.

Em tese, apesar deste chove e não molha eterno, um filme do Flash não estaria assim tão longe do tom de Aquaman e Shazam, correto? Pra quem viu o sujeito no filme da Liga, percebeu claramente o humor, a leveza que o personagem trazia. Então, nada mais justo do que tê-lo no mesmo clima que a WB tá esperando construir a partir de agora, certo? ERRADO. Pelo menos, no ponto de vista do próprio Ezra Miller, intérprete de Barry Allen nos cinemas.

Sabe aquele papo de “diferenças criativas”? Então, ele voltou a aparecer nos bastidores do filme do Homem Mais Rápido do Mundo. Outrora, Miller falou que os velocistas são, dentro do Universo DC, as pontes que conectam todas as partes de um multiverso, de todas estas histórias com diferentes realidades, diferentes versões de um mesmo personagem. Assim sendo, as presenças de Daley e Goldstein, justamente depois do que fizeram explorando múltiplas realidades no Aranhaverso, fariam muito sentido. Mas o ator não concorda. Justamente porque estava achando a última versão do roteiro “leve” demais.

Ezra Miller gostaria de ver algo num tom mais “sombrio” e, para isso, foi lá e disse pros executivos que ele mesmo faria o roteiro. Pois é, o cara deixou um ultimato na mesa dos poderosos engravatados do estúdio da caixa d’água: ou é do meu jeito ou eu tô fora. De acordo com o THR, apesar da WB estar bastante feliz com as MUITAS cifras que o humor sem pretensões de Aquaman lhes trouxe, digamos que eles resolveram pagar (literalmente, já que este tipo de proposta de roteiro não sai obviamente de graça) pra ver. E nesta semana, em tese Miller deve entregar a sua sugestão — escrita ao lado de ninguém menos que Grant Morrison.

Não, não é um homônimo, mas sim o próprio premiado autor de quadrinhos escocês, atualmente em evidência no quesito “adaptações” justamente porque a série da Patrulha do Destino bebe UM BOCADO da sua fase à frente dos roteiros do gibi.

Segundo consta, Miller estaria MESMO querendo continuar no projeto, comprometido até às botas com o papel, tentando encontrar uma solução que seja boa para ambas as partes, antes do fim oficial de seu comprometimento contratual para com o Flash, que de acordo com fontes internas se expiraria em maio. E como os Warners gostam e apostam no cara, em especial por seu papel chave na nova franquia Animais Fantásticos, seguiram todos em frente com uma situação considerada atípica em Hollywood.

No entanto, apesar de ser fã do trabalho de Morrison e de gostar do Miller, um cara carismático o suficiente pra levar um filme destes nas costas, a expressão “tom sombrio” me incomoda um bocado. “Claro, porque afinal os filmes sombrios da DC foram mesmo um sucesso gritante até o momento”, ironizou Kevin Maguire no Twitter, ao saber da notícia. Vale lembrar que justamente Maguire foi o responsável pelos desenhos da Liga da Justiça Internacional, a deliciosa e icônica fase cheia de humor do título da principal superequipe da DC.

E o Maguire tá certo aí, hein?

Miller poderia estar querendo dizer muitas coisas com “tom sombrio”, nas mais diferentes escalas e tons possíveis, levando em consideração que mesmo o Flash da série de TV do CW carrega nas tintas quando se trata da morte da mãe de Barry pelas mãos do Flash Reverso quando nosso herói ainda era uma criança, da injusta prisão de seu pai acusado do crime... Ô vida sofrida.

Temas que, aliás, a gente viu sendo abordados como parte de sua história contada brevemente no filme da Liga da Justiça. Mas o ponto é que a ÚLTIMA coisa que precisamos é de algo se focando PRINCIPALMENTE no arco dramático, na dor, no sofrimento, na angústia de Barry Allen. Porque isso vai ser quase como a visão cinematográfica das últimas três temporadas da série do Flash e que, cá entre nós, ninguém merece. Mas principalmente, isso vai ser quase como um retorno aos tons cinzas de BvS. Isso, cá entre nós, NINGUÉM merece MESMO.

Na real, sendo bem honesto, a gente precisa bem mais de Wally West do que de Barry Allen nos cinemas. Ou, pelo menos, do que do Barry Allen clássico. Explico: depois que o Barry morreu durante a Crise nas Infinitas Terras, foi seu sobrinho Wally West, ajudante velocista que atendia pelo nome de Kid Flash, que vestiu o uniforme do tio e se tornou o Flash da vez. Apesar dos pesares, de todos os contratempos e dramas típicos de um gibi clássico de super-herói, Wally tinha um bom humor, uma verve piadista, que acabou tornando-se a principal inspiração para a visão do Flash tanto da série dos anos 90 quanto a atual, e também para o Flash que vimos na série animada da Liga da Justiça de Bruce Timm, aquela com John Stewart como Lanterna Verde e a presença da Mulher-Gavião.

Pra gente ser total e completamente honesto, depois destes Novos 52 / Renascimento da vida, com a volta em definitivo de Barry Allen, até mesmo ele tem um ar bem mais Wally West do que tinha antes.

Nas séries live-action, o Flash era/é Barry Allen. Mas claramente com uma personalidade bem mais Wally West. O mesmo Wally West que estava no desenho da Liga, o engraçadinho da turma, com um jeitão bastante “Homem-Aranha com supervelocidade”. E o mesmo Wally West que o próprio Grant Morrison escreveu, aliás. Tanto em sua bem-sucedida passagem pelo título da Liga da Justiça entre 1997 e 2000, quanto numa coleção de 11 edições, entre 1997 e 1998, no próprio título do Velocista Escarlate.

Esta passagem, repleta de momentos esquisitos, provocativos e brilhantes típicos da obra de Morrison, como um uniforme senciente que o coloca numa cadeira de rodas e uma corrida pelo espaço-tempo contra um alien chamado Krakkl — na verdade, um resquício da infância de Wally que pode destruir a realidade como conhecemos — foi uma dobradinha com outro escocês hoje igualmente conhecido, Mark Millar.

Há quem diga, inclusive, que Morrison estava apenas como “mentor” nesta fase, com Millar fazendo todo o trabalho pesado. Mas tanto faz: quem teve a chance de ler entre os números 130 e 141, sacou um bom equilíbrio entre tons. Porque dá pra ser divertido sem perder a seriedade. Não é preciso ser “sombrio” para poder ser profundo nos dramas do seu personagem.

Em 2014, numa edição impressa da hoje finada revista inglesa Comic Heroes, Morrison tinha dito que queria muito escrever um título mensal do Flash, que de acordo com ele seria o primeiro gibi que leu na vida.

“Quero explorar de verdade o que acontece quando você corre na velocidade da luz, entrar a fundo na ciência disso tudo”, afirmou o autor. No fim, acabou que nunca aconteceu. Mas será que podemos ter uma pista do caminho que ele pretende seguir com o Miller neste roteiro do filme?

De qualquer maneira, fica aqui uma dica de ouro pro Miller e pro Morrison: qualquer dúvida que vocês tiverem sobre o Flash, numa boa, liguem pro Mark Waid que ele ajuda a resolver.