Crossover das quatro séries do CW, que será exibido em dezembro, vai introduzir ninguém menos do que Katherine Kane, a Mulher-Morcego
Além de seus protagonistas óbvios, o Universo DC que se constrói toda semana na telinha do CW já teve a liberdade de trazer muitos dos personagens clássicos da editora para serem adaptados por ali, do Tornado Vermelho à Legião dos Super-Heróis, passando pelo Caçador de Marte, pelo Homem-Borracha, pela Vixen e até pelo Fera B’wana, indo de pequenas participações especiais a meras referências que só os fãs captariam (tipo Ferris Air).
Da Santíssima Trindade, diretamente de Metrópolis, o Superman em pessoa entrou na roda dentro da série da prima Supergirl (de maneira maravilhosa, aliás) e, em Legends of Tomorrow, os viajantes do tempo levaram a Helena de Troia para receber refúgio em Themyscira — de onde ela voltaria mais tarde como uma amazona guerreira no melhor pique Mulher-Maravilha.
Mas um terreno, até o momento, parecia sagrado, impossível de ser pisado: Batman. Gotham City foi mencionada em Supergirl, a Wayne Tech já tinha sido citada na série do Flash e, em Arrow, além da aparição de Blüdhaven (a cidade para qual o Asa Noturna se muda) e do NAME DROP de Bruce Wayne para despistar a identidade secreta de Oliver Queen, claro, muitos dos integrantes da galeria de inimigos do Morcegão já deram as caras, com destaque especial pro Ra’s Al Ghul.
Mas nenhum personagem do Arrowverse jamais foi pra Gotham City. E obviamente o Morcegão não fez sequer uma única aparição em qualquer uma das séries, por maior e mais global que fosse a treta. Ano passado, inclusive, o produtor executivo Marc Guggenheim fez questão de deixar claro que, não, o Batman não iria aparecer em Arrow e que estava fora dos limites pra eles. “Nestes personagens que estão reservados pro cinema ou pra outras séries de TV, nós não mexemos”, confirmou ele ao Comicbook.com.
Bom, parece que o CW enfim encontrou um jeito de direcionar o Waze direto pra Gotham e se convenceu de que não precisa do Homem-Morcego quando pode fazer uso de ninguém menos do que a Mulher-Morcego. No caso, a Batwoman.
“Estamos incrivelmente empolgados em anunciar que teremos mais um grande evento crossover no CW, durante o qual apresentaremos uma nova personagem”, contou o próprio Arqueiro Verde em pessoa, Stephen Amell, como parte de um evento de apresentação da nova programação do canal, no qual falou sobre o já tradicional encontro entre os personagens das quatro séries DC. “Pela primeira vez, vamos lutar ao lado da Batwoman, o que é legal demais. O crossover será exibido em dezembro”. E sim, o chefão do CW, Mark Pedowitz, adicionou com orgulho que Gotham agora será parte oficial do mapa do Arrowverse. “Será mais um evento daqueles cheios de muita adrenalina e ação”.
Antes de qualquer coisa, é preciso deixar claro que a Batwoman e a Batgirl são personagens completamente diferentes — e, NÃO, a primeira não é uma versão adulta e/ou futurista da outra. A primeira versão da heroína, criação de Edmond Hamilton e Sheldon Moldoff, deu as caras no gibi Detective Comics em 1956. Além de ser uma primeira tentativa de criar uma BAT família de personagens, repetindo uma fórmula que vinha dando certo no gibi do Superman, ela também foi uma reação às acusações de que o Morcego e seu filho adotivo, Dick Grayson, o Robin, na verdade eram um casal homossexual (ah, Fredric Wertham...)
Kathy Kate, a Batwoman, era na real um imenso estereótipo, com uma bolsa de utilidades repleta de armas que eram, na verdade, versões de objetos associados ao universo feminino: batom, pó compacto, pulseiras, prendedores de cabelo... No fim, quando a Batgirl entrou em cena com uma proposta diferente (uma lutadora tão hábil quanto Batman e Robin, além de ter uma identidade civil acadêmica, bem mais moderna e independente) e provou ser bem mais popular, a Batwoman saiu de circulação.
Mais tarde, em 1979, ela seria assassinada pela Liga dos Assassinos (AH VÁ) mas, depois da Crise nas Infinitas Terras, bingo, adivinhou, a personagem simplesmente foi apagada da cronologia, como se nunca tivesse existido.
Foi só em Batman Incorporated, título escrito por Grant Morrison por volta de 2011, que a primeira Batwoman foi restaurada à cronologia oficial da DC. Casada com um tio de Bruce Wayne, ela chegou a lutar ao lado do sobrinho depois que se tornou viúva, tendo até um caso com ele até que, aparentemente, foi morta em combate.
Só que, na verdade, ela trabalhava, ainda que forçada, para a organização de espiões conhecida como Spyral (da qual os leitores de Grayson, da dupla Tim Seeley & Tom King, devem lembrar bem) justamente em uma missão pra tentar descobrir a identidade do Batman. Filha do cientista nazista Otto Netz (Doutor Dedalus), ela ainda está viva nos dias atuais e chegou a se encontrar com Dick Grayson em sua recente fase “agente secreto”, sem usar o uniforme de Asa Noturna.
Maaaas é bastante óbvio que, não, não vai ser esta a versão da Batwoman que vai aparecer no Arrowverse. E sim a atual, surgida na época dos 52 originais, depois de Crise Infinita, outra alteração de continuidade, aquela história toda que você deve estar careca de saber. A nova Kate Kane na verdade pintou como uma espécie de solução imediata porque a ideia de transformar Barbara Gordon novamente na Batgirl, mesmo que ela estivesse paraplégica, numa cadeira de rodas e atendendo pelo apelido de Oráculo, ajudando a comunidade heroica com suas habilidades nos computadores, acabou descartada. Então, a reformulação do uniforme de Barbara que tinha sido feita pelo desenhista Alex Ross passou por uma nova modificação, incluindo o desenho da máscara e a cor dos cabelos da super-heroína, chegando então ao visual que temos hoje.
Conhecida de Bruce Wayne, a socialite Kate faz questão de cultivar uma imagem de futilidade e frivolidade para preservar sua identidade secreta. Mas, na real, ela é filha de um militar de carreira que, depois da morte da mãe e da irmã gêmea em um sequestro violento, resolve se dedicar também à vida no exército. Forçada a abandonar a Academia depois que seus superiores descobrem que ela tem um relacionamento lésbico, Kate volta para Gotham City e passa a viver uma vida de HEDONISMO, que consiste basicamente de baladas, música e nenhuma responsabilidade.
Até que, certo dia, atacada por um bandido de rua, ela reage e acaba sendo ajudada pelo Batman — cuja presença a deixa IMPACTADÍSSIMA, e começa então uma vida de combate ao crime, inicialmente com equipamento militar roubado do pai e depois contando inclusive com sua ajuda, inspirando-a a passar dois anos em treinamento intenso com especialistas ao redor do mundo. Na volta, seu bat-uniforme estava pronto. E sua nova identidade também.
Ah, sim, talvez uma palavra tenha passado despercebida ali em cima, então a gente vai destacar aqui em letras garrafais: LÉSBICA. Kate é uma garota que gosta de outras garotas. “Queríamos um elenco que refletisse mais a sociedade de hoje e mesmo as mudanças na nossa base de fãs”, explicou o editor executivo Dan DiDio, em 2006, durante entrevista pra edição impressa da revista Wizard. “Uma das razões de fazê-la ser gay é ter mais diferenças dentro da Família Batman. Queríamos nos certificar de que cada personagem fosse único”.
Logo de cara, ela é apaixonada e mantém um relacionamento com a policial Renee Montoya. Mas pós Novos 52, com algumas poucas alterações em sua história recente, a Batwoman se envolve com Maggie Sawyer, policial de Metrópolis e conhecida como elenco de suporte do Superman, que chega a passar um tempo em Gotham e até acaba sendo considerada para o papel de comissária.
Bem, quem acompanha as séries do CW sabe que Maggie Sawyer já foi personagem coadjuvante da série da Supergirl, namorando inclusive a irmã adotiva da Garota de Aço, Alex Danvers. Talvez aí esteja um caminho pra trazer Kate pro tabuleiro?
No fim das contas, é até bom que o Batman esteja fora do alcance dos produtores/roteiristas do Arrowverse e a escolha tenha mesmo recaído sobre a Batwoman. Melhor assim. Goste você ou não do resultado final das séries, não dá pra negar que as produções do CW têm um elenco que preza bastante pela diversidade, com uma porrada de mulheres, negros e latinos em papeis de destaque. E também tem vários personagens não-hetero, tipo o Senhor Incrível, o casal Capitão Frio e Ray e a poderosíssima bissexual Sara Lance, comandante da nave dos Legends of Tomorrow. Todos retratados, quando em situações românticas, sem economias caretas em beijos e carícias. Faz TODO sentido, portanto, trazer a Batwoman para esta conversa.
Pô, já tem Batman DEMAIS no mundo, são pelo menos NOVE filmes nos cinemas... Deixa o Bruce Wayne em paz. E vamos dar espaço pra Kate Kane, uma heroína fodástica que só traz ainda mais representatividade pro público LGBTQ+, chutar a bunda da bandidagem na TV.