Fragmentado é o melhor de M. Night Shyamalan | JUDAO.com.br

Diretor está de volta em sua melhor forma, num plot twist da própria carreira, extraindo uma atuação histórica de James McAvoy no filme sobre o qual muita gente vai falar por muitos e muitos anos

Quando A Visita, primeiro resultado da parceria entre M. Night Shyamalan e a Blumhouse Productions, estreou no final de 2015, a impressão era de que o diretor buscava por redenção após alguns enormes tropeços. Ele estava dando o famoso passo para trás para, quem sabe, dar dois para frente, justamente com o gênero que lhe consagrou, em um found footage de baixo orçamento e uma reviravolta final, sua marca registrada — para o bem e para o mal.

O objetivo não foi exatamente atingido, mas com Fragmentado, que finalmente chega esta semana às telas dos cinemas brasileiros, podemos bradar aos ventos – e com extremo FUROR – que, agora sim, Shyamalan está de volta em sua melhor forma, num verdadeiro plot twist da própria carreira, ainda mais com o caminhão de dinheiro que o filme está fazendo nas bilheterias ao redor do mundo.

Dennis, Patricia, Barry, Orwell, Jade, Hedwig e todas as outras personalidades de Kevin Wendell Crumb, personagem portador de TDI (transtorno dissociativo de identidade) interpretado por James McAvoy, foram escritos por Shyamalan há 17 anos, inspirado no caso real de Billy Milligan — diagnosticado com 24 personalidades dentro de si e que teve a condição mental usada em defesa para os crimes que cometeu.

Kevin possui 23 personalidades distintas em seu corpo, sendo que todas elas têm como elo de ligação, em algum nível, a sexualidade — Dennis é meio creepy e gosta de ver jovens garotas dançando nuas, Patricia é mulher, Barry é gay, e Hedwig (a cereja do bolo da interpretação MONSTRUOSA de McAvoy) é uma criança de nove anos começando a entrar na puberdade. Vítima de abuso por parte da mãe, depois do abandono do pai, o tema ainda é a base da razão dessa mente fragmentada, além de fazer parte da história de Casey, a personagem de Anya Taylor-Joy.

Sequestrar Anya com mais duas ~amigas patricinhas ao sair de uma festa de aniversário e mantê-las em cativeiro em um porão é o estágio final do processo de surgimento de uma 24ª personalidade, chamada de “A Fera”. Extremamente violenta e perigosa, ele pretende se “alimentar” das garotas em um verdadeiro sacrifício de IMPUROS. Começa então uma corrida contra o tempo em que as demais personalidades de Kevin pedem desesperadamente pela ajuda da Dra. Karen Fletcher, a terapeuta do vilão interpretada por Betty Buckley, enquanto são coagidas e subjugadas por Dennis, Patricia e Hedwig.

Esse é o Dennis. Lá em cima é o Hedwig. :P

Pra desenvolver o personagem de forma tão única e precisa, o próprio M. Night Shyamalan explicou durante entrevista coletiva realizada em São Paulo que, enquanto escrevia o roteiro, fez uma extensa pesquisa sobre o TDI, utilizando estudos diversos e opiniões médicas pra poder embasar cada detalhe ou explicação didática sobre o transtorno por meio da fala mansa e centrada da Dra. Fletcher, mesmo que muitos psiquiatras argumentem que não há evidências empíricas que deem suporte ao diagnóstico das múltiplas personalidades – debate inclusive tratado no longa.

O diretor e roteirista conseguiu dar credibilidade ao assunto, mesmo quando a história começa a partir para o campo do fantástico, conectando tudo de uma forma em que o espectador abrace completamente a ideia depois do seu CATÁRTICO final, por mais absurdo que tudo pareça.

A genialidade de Shyamalan e imensa capacidade de extrair tudo que pode dos atores em takes longos de plano sequência com um simples diálogo (O Sexto Sentido, Corpo Fechado e Sinais que o digam) fica clara numa cena em particular, de impressionar e arrepiar. No fim do segundo ato, quando Barry conversa com a Dra. Fletcher, James McAvoy muda da fisionomia à expressão corporal em questão de segundos, sem cortes, enquanto Dennis vai assumindo a “luz” — o CLÍMAX de uma interpretação que criou os mais diversos trejeitos para cada uma das personalidades, que, a partir desse momento, fica absolutamente assustador e fisicamente intimidador pelo resto do filme.

É a QUINTESSÊNCIA da atuação.

Fragmentado é Shyamalan DOS BONS, como nos velhos tempos, e esse simples fato é o suficiente para colocá-lo um degrau acima, onde o diretor saca todas as suas armas em sequências conduzidas com maestria, tudo ao seu tempo e sem pressa, que vão explodir em pura tensão, fazendo qualquer um segurar forte no braço da poltrona e ficar com os nervos em frangalhos até o desfecho, com uma conclusão capaz de criar uma verdadeira catarse coletiva e direito a um sonoro “O FILHO DA PUTA CONSEGUIU DE NOVO” — inclusive a coisa de querer ficar ali esperando a próxima sessão, só pra assistir a tudo de novo e começar a captar as pistas deixadas pelo meio do caminho.

Tudo isso enquanto a expectativa por AQUELE próximo e esperadíssimo filme já está nas alturas... :)