Nova edição da Graphic MSP é até aqui o primeiro ponto realmente baixo de uma coleção que vinha mantendo um nível de acertos bem alto
Admito que me dói ter que dizer isso. Mas Turma da Mata: Muralha, a mais recente Graphic MSP, estrelada pelo Jotalhão e cia., foi uma bola fora.
Os desenhos de Roger Cruz estão lindos, entendam, assim como as cores de David Calil. O roteiro de Artur Fujita é, OK, correto, redondinho. Mas o caso aqui é outro. O fato é que o produto final, o conjunto da obra, ficou absolutamente genérico. Ao tentar fazer uma história de ação, como o Astronauta de Danilo Beyruth ou o Piteco do Shiko, os autores acabaram perdendo a mão, enfiando os personagens clássicos numa trama de cores steampunk sobre uma disputa envolvendo um minério raro chamado calerium que poderia ser estrelada por qualquer protagonista. Qualquer um.
Não precisariam ser ESTES animais antropomórficos. Se eles quisessem fazer A MESMA história com o Bidu, o Bugu, o Manfredo e o Duque, rolaria fácil. Ou com os personagens do Garfield. Ou com o Snoopy e o Woodstock. Ou com o Haroldo. Bastaria apenas criar versões radicais dos bichinhos fofinhos e colocar todos eles sentando o braço.
É uma boa história de ação. Mas é uma história de ação como DEZENAS de outras que já lemos, vimos ou jogamos. Toda a ideia da coleção Graphic MSP é a seguinte: reinterpretações com um tom talvez mais “maduro” e “autoral” para os personagens do Mauricio, ok? Aqui, o “tom mais maduro” estava presente, menos infantil. O que faltou foi a parte “autoral” ter mais da personalidade da turminha do Mauricio.
Faltou explorar mais das características de cada um, por mais que a abordagem fosse outra. Faltou um tantinho mais de humor, de sarcasmo, daquelas tiradas inteligentes e sutis que titio Mauricio usava para criticar a ditadura nas entrelinhas. Virou muito a porrada pela porrada, sabe?
Todos ficaram raivosos, dentes trincados, fazendo pose e querendo resolver tudo metendo o dedo na cara ou no duelo de espadas. Meio que uma versão Image anos 90 da Turma da Mata. Quem lê quadrinhos já há algum tempo sabe que a comparação não tem como ser benéfica aqui...
Em Laços e Lições, os irmãos Cafaggi contam histórias sobre a turminha do Bairro do Limoeiro com uma delicadeza ímpar, de chorar, mas você claramente enxerga que, apesar da mudança no enfoque, estão ali a Mônica, a Magali, o Cascão e o Cebolinha. Nas duas graphics do Astronauta, o Beyruth vai para um lado científico-espacial, meio Interestelar, mas em nenhum momento tira de foco os temas de solidão/saudades que são tão presentes nos gibis do Astronauta. O coração dos personagens fica de fora nesta Turma da Mata.
Aliás, Turma da Mata: Muralha também tem um probleminha sério de timing. Tem muita coisa pra acontecer e tudo acontece rápido demais, como se fosse necessário encaixar uma dezena de paradas rolando por página pra garantir que tudo se resolvesse até o fim. A suposta “morte” do Rei Leonino acontece em um único quadrinho e, logo depois, o Caxeiro já está lá, obrigado a assumir um trono que não queria. E você mal se sente triste por ele porque, aperte o fast forward, rapidamente ele some também. Mas hein? Ele não tem direito a um único momento puxa-saco, que era um dos seus destaques nas tiras originais.
Acaba sendo gente (?) demais pra páginas de menos. Talvez por isso tenha sobrado pouco tempo para desenvolver melhor a paixonite da Rita Najura pelo Jotalhão, a genialidade científica do Tarugo, a marra do Raposão como líder... Aliás, coitado, o Raposão acaba sendo meio que jogado para escanteio na história toda, porque mal sobra tempo para ele em meio à correria, com ou sem casaco quadriculado.
E a ideia de colocar a dupla de pilantras Zé Fuinha e Zé Furão como vilões, cara, até que é legal. Mas eles se transformam em um chefe da guarda sanguinário e um conselheiro real que é na verdade um maníaco ambicioso em busca de poder. E apenas e tão somente nisso, sem aquele charme especial que se espera dos vilões. Ambos acabam aparecendo tão pouco que simplesmente não dá pra embarcar nas motivações dos caras e sentir alguma coisa sobre eles. Aliás, em um dado momento você até esquece que a história tem um antagonista que precisaria ser combatido...
Quem acaba se salvando no fim das contas é o Jotalhão – que, com uma determinada piadinha culinária, me arrancou GOSTOSAS RISADAS, surpreendentemente. O elefante verde tem tempo pra te conquistar, mesmo que seja só um pouquinho. E, sabe, eis o segredo aqui. Foi neste momento em especial que a Turma da Mata falou comigo. Em que, mesmo coberta por outras camadas de significado, ela mostrou um pedaço do que os personagens realmente são, no fundo. Foi ali que eu vi, brevemente, os personagens com os quais cresci. E vi o tempero que poderia conquistar as gerações que nunca tiveram a chance de lê-los, a coisa especial que vai além das perseguições, lutas e explosões.
Turma da Mata: Muralha sofre de uma falta de identidade crônica. O que é uma pena, já que sabemos bem em que fonte a obra bebeu – ou, neste caso, deveria ter bebido...
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