Hey, DCEU, aprende aí com LEGO Batman: O Filme! | JUDAO.com.br

Animação divertidíssima sacaneia, e muito, o Homem-Morcego e todos os seus arquétipos, sem medo se ser feliz

Aposto um picolé de limão que você vai ouvir de muita gente ou ler por aí que LEGO Batman: O Filme é “a melhor coisa que a DC já fez em MUITO TEMPO nos cinemas e o melhor longa do morcegão desde O Cavaleiro das Trevas”. E sabe por que vou todo confiante nessa aposta? Porque ele é, mesmo, a melhor coisa que a DC já fez em MUITO TEMPO nos cinemas e o melhor longa do morcegão desde O Cavaleiro das Trevas.

Beleza que é nivelar por baixo se pegarmos exemplos recentes como Batman VS Superman, Esquadrão Suicida e toda a quantidade de lambanças e decisões questionáveis que a Warner vem tomando nas telas grandes com seu DCEU, mas LEGO Batman é uma sátira inteligente travestida de animação infantil, cheia de piadas rápidas e sofisticadas e aquele tanto de referências da cultura pop que a gente tanto ama – do tipo já sacada no sensacional Uma Aventura LEGO – só que levado a outro nível quando a troça é feita justamente com o Homem-Morcego, personagem que, batmaníacos e DCnautas me desculpem, é o que mais PEDE para ser sacaneado, ainda mais com todo seu background.

O fechamento do filme todo é esse, da forma mais espirituosa e engraçada possível mostrando que apesar de tudo, Batman, principalmente suas últimas contrapartes cinematográficas, é um perdedor nato, e só ele não consegue se enxergar assim. Mais que isso, o subtexto levanta algumas questões sobre relações humanas interpessoais, uma vez que um dos principais ganchos da trama toda é a reclusão do personagem e sua incapacidade de shippar tanto com seus aliados — no caso, Alfred, que o vê como uma criança mimada que não encara seus problemas e responsabilidades, Robin,com quem age como um pai inconsequente e relapso, e Barbara Gordon, crush que ele não possui a menor maturidade para lidar –, quanto seus inimigos, principalmente o Coringa, com quem se recusa a admitir um relacionamento e que nutre sentimentos por ele, mesmo que seja ódio.

No clássico dos clássicos, A Piada Mortal, Alan Moore e Brian Bolland exploram essa doentia rivalidade e dependência entre os dois, aqui habilmente transformadas em uma paródia de relacionamento entre o Homem-Morcego e o Príncipe Palhaço do Crime, só porque ele simplesmente não “assume a relação” e não o considera seu arqui-inimigo, muito diferente do que rola entre Superman e o General Zod. Dessa forma, o Coringa se vê obrigado a maquinar um plano dos mais nonsense que envolve libertar todos os vilões presos na Zona Fantasma só para CHAMAR A ATENÇÃO!

Freud pira!

Levanta-se ainda um questionamento sobre a real necessidade de Gotham City, a cidade mais perigosa do mundo, ter seu vigilante mascarado, e o quanto isso não é apenas um sintoma de uma força policial inepta, onde em qualquer treta simplesmente aperta-se o botão do Bat-sinal e delega a responsabilidade. Fala-se também da falta de políticas públicas (e estatística) para resolver a criminalidade e o principal, o quanto a presença do Cruzado de Capa de fato não aumenta a escalada de crime e o surgimento de “malucos fantasiados”, incluindo aí o genial Homem-Condimento, argumento que o próprio Christopher Nolan já levantou em sua trilogia.

Mas a cereja do bolo mesmo é o quanto a produção alopra os arquétipos do Batman, seu ego gigantesco, a inveja que sente do Homem de Aço e, acima de tudo, suas várias crises existenciais (que segundo Alfred, já vem acontecendo há muito tempo, sendo que a de 66 foi a mais esquisita) e a versão raivosa, cheia de rancor, solitária, mimimizenta e macho-man idealizada nos filmes modernos, representada por sua obsessão em malhar compulsivamente para conseguir seu tanquinho (com seus NOVE gominhos que adora se gabar), passando por sua solidão amargurada sem fim em uma mansão enorme e silenciosa, jantando sozinho sem saber utilizar um forno de microondas direito ou escolher a entrada correta da TV para assistir seu filme preferido — duas das cenas mais hilárias do filme, ainda choramingando a morte dos pais depois de quase 80 anos.

Apesar do próprio herói sugerir “apostar no preto” e sabermos muito bem todo o estereótipo daquela aura trevosa que carrega desde a personificação do personagem por Tim Burton, o diretor Chris Mckay dá uma de Joel Schumacher e tira Batman das sombras e o mergulha num universo de peças de plástico absurdamente colorido e psicodélico (para aqueles que batem na tecla que “a DC é sombria e adulta” se gilletarem de raiva) com uma metralhadora giratória de piadas sagazes e infames e gritando elementos da cultura pop em cada frame da animação, desde a aparição dos vilões clássicos do cinema (pra fazer qualquer nerd chorar de rir) até a trilha sonora esperta que vai de Cutting Crew a George Michael, sem medo da cafonalha.

LEGO Batman pega um personagem deveras complexado e não tem dó de tirar sarro da sua cara o tempo todo, porém o faz de forma inteligente e com um propósito, uma vez que também satiriza a já batida jornada do herói nos cinemas — da queda a redenção, onde mesmo com todos os vilões do planeta para se enfrentar, a batalha final é consigo mesmo — e do universo dos super-heróis como um todo. E, bem, se a DC resolver largar a mão de seu bagunçado universo cinematográfico, que insiste em se levar ultra a sério, e transformar toda a Liga da Justiça apenas nos filmes dos blocos de brinquedo, não sou eu quem vai questionar a decisão e criticar.

MUITO pelo contrário.