Homem-Formiga e a Vespa: a hora do recreio da Marvel | JUDAO.com.br

É pra rir, é pra se emocionar, mas num outro clima, numa pegada diferente, mais solta, mais leve, mais descontraída. Deixa a Guerra Infinita do lado de fora do cinema, tá bom?

Olha só, não confunda as coisas, Han Solo: Uma História Star Wars e Homem-Formiga e a Vespa não poderiam ser filmes mais diferentes. Mas, em uma coisa, eles se parecem bastante: apesar da assinatura, apesar de fazerem parte de um universo expandido/franquia maior, são ambos total e completamente descompromissados. E divertidos. E é SÓ esta a sua função.

Assim como Han Solo é um Star Wars menor, a segunda aventura do Formigão também é um filme Marvel menor. E não tem problema nenhum com isso. Assim como o primeiro.

Esqueça o tom épico, filme-evento, tambores rufando, AQUELE final sombrio de Guerra Infinita (já passou o tempo regulamentar e enfim podemos falar sobre isso?). Aqui a parada é mais good vibes. Funcionaria bem ATÉ se não tivesse menções aos outros filmes Marvel. Mas mesmo estas referências estão num tom tãããããão diferente que, ah, é um baita alívio.

Aliás, voltando até ao que falei na resenha de Han Solo: pra pessoas da minha idade, eu diria que é uma típica matinê, um filme Sessão da Tarde — e que, neste caso em particular, tem até muitos ecos de clássicos dos anos 80. Mas como a referência é datada, dá pra dizer que Homem-Formiga e a Vespa é a hora do recreio da Marvel.

Da mesma forma que rolou com o primeiro, se o lado cômico da Marvel te incomoda, ih, então desencana e deixa este filme passar. Porque a palavra “comédia” tá estampada por todos os lados, tem piadinha até nos momentos mais tensos, até nas cenas de ação. Dizer que este é o gênero que melhor representa o filme, aliás, não é exagero.

Deixa a seriedade de lado e vamos curtir um pouco, galera.

Sabe aquele papo de que a própria Marvel tava definindo Homem-Formiga e a Vespa como sendo “comédia romântica”? Até faz sentido, dado o clima entre o Scott e nova Vespa, Hope Van Dyne — e a história de amor que finalmente se completa entre o ranzinza e egocêntrico Hank Pym (de quem você até sente uma raivinha aqui, confesso) e sua esposa, perdida no mundo quântico, a Vespa original Janet Dan Dyne.

Mas acho que é muito mais certeiro dizer que esta continuação é uma “comédia de família com super-heróis”. Porque é isso: no fundo, a ideia é acabar reunindo os três núcleos diferentes que trazem Scott Lang como eixo central em uma unidade quase disfuncional. Sabe com o que este segundo filme do Homem-Formiga parece de verdade? Os Incríveis. E, portanto, de algum jeito estranho, é igualmente mais Quarteto Fantástico do que qualquer outro filme do Quarteto Fantástico. Porra, se isso não for uma ótima notícia, sei lá qual é a que você tava esperando ouvir (além de que deram sinal verde pro filme do Doutor Destino do Noah Hawley, desculpem se pareço monotemático aqui).

Quando o próprio diretor, Peyton Reed, diz que se influenciou por filmes como Fuga à Meia-Noite (1988), com o Robert DeNiro, Depois de Horas (1985), do Scorsese, e o pequeno clássico Essa Pequena é uma Parada (1972), com a Barbra Streisand, já dá pra entender BEM o que vem pela frente. Duas misturas de comédia com crime e romance e uma verdadeira loucura cômica e caótica que entrelaça múltiplas histórias numa só. Sacou? ;)

Este é um Scott Lang ainda mais pé no chão. Assim como nos gibis, este Homem-Formiga é um cara comum que a gente pode no máximo chamar de um combatente do crime esforçado. Atrapalhado, com dificuldade de entender todo o “cientifiquês” ao seu redor, querendo recomeçar e ganhar uma chance num trampo novo, às vezes faz umas cagadas achando que tá dando uma dentro — como quando foi se meter a ajudar o Capitão América lá na Alemanha, durante a tal da Guerra Civil. Deu treta não só pra ele, condenado à prisão domiciliar, mas também pro Hank e pra Hope, considerados seus cúmplices e, portanto, fugitivos. Olha o sujeito de novo dando mancada com gente de quem ele gosta muito.

A sorte é que, bom, difícil não conseguir sobreviver com o gênio brilhante do Dr.Pym e com o verdadeiro combo que é sua filha. Porque a Hope é tão inteligente quanto o pai e ainda é uma guerreira treinada, que luta bem pra caralho e chuta a bunda da bandidagem, que sabe usar as habilidades de encolher e ampliar de seu novo uniforme de maneiras que Lang jamais sonhou — e não custa nada ainda ter um par de asas e uns blasters nos pulsos pra dar aquela força. Basicamente, no papel de super-heroína ela se sai bem melhor do que o Homem-Formiga, não apenas sendo mais do que justa a sua inclusão no título do filme como, bem cá entre nós, se o alter-ego “humano” do herói da vez não fosse tão importante pro andamento da história, há!, daria tranquilamente pra inverter os nomes ali no cartaz... ;)

Não só é justíssima a inclusão da Vespa no título do filme como até poderiam inverter os nomes

De qualquer maneira, Hope e Hank descobrem que pode existir um jeito de trazer a amada Janet de volta daquele lugar absolutamente lisérgico no qual Scott esteve ao final do primeiro filme e conseguiu, de algum jeito, voltar em segurança. Mas além de uma gangue de bandidos que tinha tudo pra ser genérica mas que funciona que é uma beleza, no fim das contas, também como alívio cômico, eis que seu caminho acaba se cruzando e bagunçando o coreto todo com duas figuras vindas diretamente dos gibis e cujos retratos são bastante diferentes (ainda bem) das contrapartes quadrinísticas: Bill Foster e o Fantasma.

Sobre o Bill de Laurence Fishburne, esqueça o Golias. Ele não fica gigante nem porra nenhuma. Digamos que aquela menção do trailer é a única do filme. Aqui, ele existe apenas para ser o antagonista intelectual de Hank Pym, numa dinâmica de dois cientistas velhos e meio mal-humorados que querem mostrar quem tem o maior QI que tem um bom toque de charme. E o Fantasma, bom, é A Fantasma. E não tem nada de “ladrão corporativo” na jogada. Os interesses dela são bem outros, apesar dos poderes, apesar do visual. E... quer saber? Aquela que deveria, hum, ser a grande “vilã” do filme nem é tão vilã assim. No fundo, como nos bons filmes dos anos 80, você nem chega a ODIAR o antagonista. O grande vilão acaba sendo a verdadeira confusão que se forma quando as tramas paralelas enfim de cruzam e esta galerinha do barulho se mete numa fria enquanto tenta se livrar desta situação muito louca.

Homem-Formiga e a Vespa também segue a tradição do anterior e consolida como um bom filme de coadjuvantes. Eles chegam a brilhar tanto quanto os personagens principais. Tem um pouco mais de espaço pra Cassie, filha do Scott, que é uma gracinha DE TUDO e tem um papel fundamental em uma sequência que vai te fazer dizer “mas olha só esta menina, hein?”. E o agente do FBI Jimmy Woo, vivido com doçura por Randall Park, é responsável por tomar conta da aplicação de pena de Lang, igualmente desconfiado do passado heroico do cara mas disposto a ser seu amigo, é outro rosto que eu quero muito voltar a ver nestes filmes da Marvel.

Mas aí tem... AQUELE cara. Que não existe nos gibis mas, porra, deveria. Aquele que MAIS uma vez rouba a cena. Luis, vivido pelo mestre Michael Peña. Sério, ele devia ser o Nick Fury. Aquele que aparece em tudo quanto é filme, que é a cola que reúne todos os heróis. Certeza que o novo Thor pós-Taika Waititi amaria o Luis.

Ele mais uma vez faz uma de suas narrações, contando um pouco de seu passado como companheiro de cela do Scott e dali pra frente... e é de cair o cu da bunda de tanto rir. “O cara é uma jukebox humana, colocou a moeda agora tem que esperar a história ir até o final”, diz o eterno parceiro Kurt. Justo. E a história tem direito até a uma menção aparentemente sem qualquer sentido ao Morrissey. Mas o foda é que faz sentido.

Luis devia fazer aquele momento PREVIOUSLY em todos os filmes da Marvel, antes mesmo da vinheta do estúdio começar. Luis devia dar aula de storytelling pros marketeiros que adoram colocar esta palavra no PPT pro cliente.

Luis podia substituir o Kevin Feige no comando da Marvel pra esta fase 4 do estúdio. Porque o Luis é diversão mas também é emoção. Talvez seja o personagem mais CORAÇÃO do filme.

Simplesmente Luis. Se fosse SÓ por ele, já valeria a pena este Homem-Formiga e a Vespa. Aliás, você podia ter lido este texto de baixo pra cima, né? :)

Cenas pós-créditos? Tem sim. Mas a gente nem quer falar sobre isso porque, VAMOS LÁ, uma delas você já tem plena noção do que se trata e o que conecta. Então, fica aí a surpresa que não é surpresa — e que faz referência a uma outra surpresa que, vá, nem é tão surpresa assim também.

De longe, em um filme tão bacana e cheio de graça quanto Homem-Formiga e a Vespa, parece até meio anti-clímax. Eu bem que trocaria esta cena por mais uns quinze minutos de Luis. Sendo apenas Luis. QUE HOMEM.