Saiu esta semana Surgeon X, gibi da Image Comics editado por ela e que conta a história de uma vigilante cirurgiã. Saudades! :)
Essa semana a Image Comics lançou a primeira edição de Surgeon X, nova HQ escrita pela documentarista Sara Kenney e com arte do veterano desenhista inglês John Watkiss. A trama se passa num futuro distópico no qual a indústria da saúde e a medicina estão sob controle dos ricos (quer dizer, não parece ser um futuro tão distante assim). Conforme uma doença resistente a diversos tipos de tratamentos toma conta das ruas, a cirurgiã rebelde Rosa Scott assume uma persona vigilante para ajudar quem realmente precisa.
A ideia é interessante mas, sejamos honestos, este seria um gibi que passaria despercebido pelo menos em sua primeira edição até que alguém tivesse a chance de lê-lo e pudesse dizer “uau, que sensacional” ou então “mas que bosta retumbante”. Só que Surgeon X chega às mãos dos leitores com uma espécie de pedigree diferente. Trata-se da primeira história em quadrinhos editada, nos últimos três anos, pela icônica Karen Berger.
O projeto foi anunciado ainda em abril, durante a edição 2016 da Image Expo, evento no qual a editora fala sobre seus próximos lançamentos aos fãs. Quando chegou a hora de Surgeon X e Berger subiu ao palco de jeans e camiseta preta, despojada e com um sorriso no rosto, a multidão de fanáticos foi ao delírio. Reconhecimento mais do que merecido por seu trabalho, aliás.
Mas afinal, o que poderia fazer Berger ser recepcionada como uma espécie de rock star? Uma editora ganhando ainda mais do destaque do que a própria equipe criativa do título? Pois é. Isso acontece quando você é a criadora e principal responsável pelo nascimento e crescimento de um selo como Vertigo, a linha de quadrinhos adultos da DC, que Berger comandou durante duas décadas, de 1993 a 2013. A lista de criações que nasceram sob a sua BATUTA é inegavelmente surpreendente: Sandman, Preacher, V de Vingança, Transmetropolitan, Hellblazer, Homem-Animal, Monstro do Pântano, Patrulha do Destino... Uma verdadeira metralhadora de clássicos.
Com a criação da DC Entertainment, presidida por Diane Nelson (a responsável por levar Harry Potter aos cinemas), rolou o reboot do Universo DC. Personagens tradicionais como Monstro do Pântano e John Constantine foram parar no Universo DC principal, fora da Vertigo, enquanto sucessos mais recentes como DMZ, 100 Balas, Fábulas, iZombie, Scalped e Y: O Último Homem, por um motivo ou por outro, foram encerrados. Pra piorar, Karen viu seu poder diminuído, sendo obrigada a se reportar para Bob Harras, o novo editor-chefe da DC Comics, e não mais pra presidente Diane Nelson.
Faz bastante sentido que, depois de seu hiato, ela tenha ido parar justamente na Image, que alguns críticos estão consistentemente chamando de “sucessora espiritual da Vertigo”. Aquela que outrora foi a casa dos super-heróis cheios de adrenalina, bombados e armados até os dentes nos anos 90 acabou se tornando a morada de títulos alternativos estranhos, geralmente livres da figura do vigilante mascarado multicolorido e escritos/desenhados inclusive por veteranos da própria Vertigo. “A Sara [Kenney] me encontrou no LinkedIn, veja você”, conta ela, em um papo com o Vulture. “Ela se identificou como uma fã da Vertigo, louca por gibis, e me contou que tinha esta ideia de uma cirurgiã numa Londres futurista que desenvolve um complexo de Deus. Fiquei realmente intrigada pelo conceito de uma grande personagem feminina com uma moralidade ambígua”.
Quando a própria Karen entrou na DC em 1979, aos 21 anos, como assistente do editor Paul Levitz, as mulheres eram ainda menos representadas na indústria dos quadrinhos do que são hoje e existia pouquíssimo espaço para este tipo de ousadia. “Quando eu cheguei, pensava assim, tá bom, já sei como são os títulos de super-heróis, mas tem tanto potencial para mudar as coisas em outros gêneros”.
Foi o que ela fez assim que teve chance e autonomia para isso, dando total liberdade criativa para falar palavrões, falar sobre (e mostrar) sexo e criticar coisas como política e religião, abrindo as portas para a invasão britânica nos gibis americanos. Peter Milligan, Garth Ennis, Grant Morrison e até a dupla de ouro Alan Moore e Neil Gaiman, todos chegaram até a DC por seu intermédio.
A DC e a Marvel se tornaram empresas de super-heróis controladas por estúdios de cinema
“Olha, eu tive ótimos momentos na DC”, afirmou ela. “Mas a empresa mudou e ficou claro que as prioridades também. Os gibis com foco nos criadores não eram mais algo em que eles estavam interessados. Claro, sei que os super-heróis ainda alimentam a indústria, obviamente. Mas existe toda uma cena independente, com editoras como a Image, da Dark Horse, a IDW, a BOOM!, fazendo um trabalho fenomenal”.
Só que algo mudou no meio do caminho e, no final de 2012, Berger anunciou que estava saindo da Vertigo e da DC. Em um perfil do jornal New York Times, no qual foi chamada de “mãe das coisas esquisitas”, ela disparou: “a DC e a Marvel se tornaram empresas de super-heróis controladas por estúdios de cinema”.
Olha, não dá pra dizer que ela tá de todo errada, né? ;)