Quero ser o melhor amigo de Lin-Manuel Miranda | JUDAO.com.br

Em Hollywood, não se fala em outra pessoa. Celebridades se derretem em elogios e o cara está com uma porrada de novos projetos já fechados pela frente. Mas, afinal, quem é o próximo grande nome de Hollywood?

“Ele é o rei da Broadway”, disse The Rock a respeito de Lin-Manuel Miranda. “Este cara merece o Prêmio Nobel”, completou ninguém menos do que Bette Midler. “Faz dois dias que simplesmente não consigo parar de pensar no musical dele”, mandou Stephen Amell. E basta uma busca simples no Twitter pelo nome do camarada para encontrar dezenas de comentários como “Lin-Manuel Miranda deve ser o sujeito mais legal do mundo”.

A grande pergunta aqui é: você faz ideia de quem é o Lin-Manuel Miranda? Pois deveria. Afinal, o ator, compositor, escritor e rapper (!) é um dos nomes mais quentes da indústria norte-americana do entretenimento, fenômeno dos musicais da Broadway e já na mira de Hollywood para explodir de vez nas telonas.

Descendente de porto-riquenhos, Miranda, 36 anos, é o responsável por Hamilton: An American Musical, que parte da crítica chamou de “rap opera” – no qual um elenco formado quase que inteiramente por negros e latinos canta, ao som de hip hop, a história de Alexander Hamilton, primeiro Secretário do Tesouro dos EUA, morto em 1804.

Desde então, Hamilton se tornou um verdadeiro fenômeno pop nos EUA. O musical, que Miranda não apenas escreveu e compôs, mas também estrela no papel principal, está em cartaz desde janeiro de 2015 e arrecadou, até o momento, mais de US$ 60 milhões em bilheteria – sendo que, nos últimos quatro meses, todas as apresentações estão com vendas esgotadas. Ingressos para o dia 9 de julho, que é quando Miranda vai deixar seu papel no palco para se dedicar a outros projetos, estão sendo disputados a tapa, chegando a valores na casa de US$ 10.000. Hamilton ganhou o prêmio Pulitzer, o Grammy e ainda recebeu um número recorde de indicações ao Tony deste ano: são 16, sendo que muita gente já aposta que, na cerimônia a ser realizada no próximo domingo, dia 12, ele deve levar a maior parte destas estatuetas aí.

Hamilton

Nascido na vizinhança de Washington Heights, ao norte de Manhattan, e criado no bairro latino de Inwood, Lin-Manuel passava pelo menos um mês por ano ao lado dos avós na cidade natal de sua família, Vega Alta, em Porto Rico. Desde a infância embalado pelo hip hop mas sem perder sua essência latina, foi na faculdade que formou com amigos um grupo de comédia com pegada meio rap chamado Freestyle Love Supreme – e foi lá que escreveu a primeira versão do roteiro de In the Heights, trabalhando na companhia de teatro estudantil, entre uma peça e outra (até Shakespeare o cara encenou).

In the Heights, também um musical, conta a história de um sujeito chamado Usnavi, dominicano que é dono de uma adega em Washington Heights e que começa a se incomodar com todas as mudanças que o bairro vem sofrendo, com novos condomínios e estabelecimentos que valorizam mas também alteram a dinâmica do lugar para os antigos moradores. Ele não sabe se quer continuar cuidando do negócio da família ou largar tudo e ir viver na República Dominicana, graças a uma pequena fortuna que herdou da matriarca da região, que praticamente o criou.

A pequena produção – também com Miranda inicialmente no papel principal – caminhou pelo circuito universitário, independente, foi parar no chamado off-Broadway (circuito de teatros menores que, bom, não ficam na região da RUA LARGA) e depois ganhou seu espaço na Broadway, em 2008. Bingo: levou Tony Award, levou Grammy, levou a porra toda. Era o começo da construção do seu nome como o “the next big thing” em Hollywood.

Lin-Manuel foi professor de inglês na escola onde estudou, escreveu para o Manhattan Times como crítico gastronômico, escreveu músicas para comerciais, fez participações especiais em Os Sopranos, House, How I Met Your Mother, Modern Family e até mesmo na Vila Sésamo. Meteu as caras em tudo que conseguiu. Mas a grande virada, de fato, rolaria só em 2007, quando ele leu a biografia de Alexander Hamilton escrita por Ron Chernow, durante uma viagem. Foi aí que escreveu My Song, canção sobre um dos fundadores da república estadunidense, que seria apresentada em plena Casa Branca numa das suas noites de poesia e música. Em 2012, eis que já existiam uma porrada de canções sobre o camarada, formando a tal da Hamilton Mixtape, que se tornaria a base para o musical.

É, basicamente, uma análise da história de Hamilton sob o prisma dos imigrantes. Ao ler o livro, o compositor afirmou, em entrevista para a revista Rolling Stone, ter feito uma conexão direta sobre o passado do homem na nota de 10 dólares, ele mesmo um filho bastardo, um imigrante vindo da ilha caribenha de St.Croix, e as narrativas de heróis do rap que ele sempre amou como Notorious B.I.G. e Jay Z.

“O momento que mudou tudo foi quando li que Hamilton escreveu um ensaio que foi a sua porta de saída de St.Croix”, explica Miranda. “Não foi força das circunstâncias. Foi um ensaio sobre como a ilha tinha ficado uma merda depois de ser destruída por um furacão. O texto se tornou popular e ele conseguiu uma bolsa para sair de lá por causa disso. E eu estava tipo, ‘ele literalmente escreveu seu caminho para fora de suas circunstâncias. É isso! Isso é tudo que eu precisava’. E rolou”. No fim, políticos dos mais diferentes espectros disseram ter amado a peça. De Dick Cheney a Barack Obama. Aliás, Michelle Obama, que viu o musical duas vezes, o descreveu como sendo “a melhor apresentação artística que eu já vi na minha vida, em qualquer tipo de formato”.

Mas, para ele, a maior vitória está em ter conquistado um público ligeiramente diferente. “Honestamente, meu sonho secreto se realizou: a comunidade do hip hop abraçou o show de verdade”, diz ele, feliz por ter recebido as visitas empolgadas, na plateia, de nomes como Eminem e o casal Beyoncé-Jay-Z.

Com tanto sucesso assim, diante de tamanha empolgação, não dá para não perguntar: afinal, Hamilton vai virar um filme? “Provavelmente. Daqui uns 20 anos. A coisa é que trabalhamos duro para fazer com que funcionasse no teatro, sabe? Eu ouço isso direto, umas 50 vezes por dia, ‘cara, você precisa transformar isso em filme’. De verdade, eu entendo que é difícil vir pra Nova York e conseguir um ingresso da Broadway. Mas, ao mesmo tempo, filmar é um ato de transposição de mídias, é uma tradução, percebe? É muito diferente. Precisa de tempo”.

Bom, não demorou tanto assim com In the Heights, que estava até nas mãos da Universal, com direção fechada nas mãos de Kenny Ortega (do documentário de Michael Jackson, This Is It), mas acabou abandonado em 2011. Só que não pense que esta história terminou, porque a Weinstein Co. foi lá, comprou os direitos e já meteu Lin-Miranda como produtor executivo. “Os musicais dos anos 1950 eram incríveis, mas este filme vai revolucionar o que o público espera do gênero”, disse Harvey Weinstein ao THR.

Enquanto isso, eis que Lin-Manuel está desenvolvendo uma baita relação interessante com a Disney. Primeiro foi a imensa cara de pau demonstrada quando J.J. Abrams foi assistir a Hamilton – ao aproximar-se do diretor e perguntar “olha, se for rolar uma cena de cantina no próximo Star Wars, me avisa, posso escrever as músicas”. Bom, acontece que tinha sim a cantina de Maz Kanata no meio do caminho e, como John Williams já tinha pedido para não escrever uma música para cenas similares, eis que Lin-Manuel Miranda ganhou sua chance. Sim, sim, a música que toca na sequência em que Han Solo, Finn e Rey chegam para falar com a pequena alienígena interpretada por Lupita Nyong’o é dele — e toda em HUTTESE, a língua dos Hutts. :)

Lin-Manuel Miranda

O cara ainda vai compor também algumas canções para Moana, aquela animação da princesa que vem de uma pequena ilhazinha do Pacífico, dando uma chance para que The Rock arrisque seu vozeirão cantando rap. E detalhe: Miranda não poderia estar mais empolgado, justamente porque os diretores são a dupla Ron Clements e John Musker. “Isso é meio que um sonho se tornando realidade. Sabe? Eu estou nesta coisa toda por causa de A Pequena Sereia, que explodiu minha cabeça quando eu tinha nove anos de idade. E eu nunca mais fui o mesmo desde então. E agora estou trabalhando com os diretores originais de A Pequena Sereia”. Se você duvida da devoção de Miranda pela história de Ariel, saiba que ele batizou o filho dele, que nasceu em 2014, de Sebastian. ;)

Pra completar o pacotão do titio Walt, Lin-Manuel estará ao lado de Emily Blunt em Mary Poppins Returns, a tal da continuação do clássico supercalifragilisticexpialidocious prevista para 2018. Enquanto Blunt está confirmada como a babá do guarda-chuva, o ator será um personagem novo, Jack, um sujeito que acende manualmente as luzes da rua. Embora pouco se saiba a respeito de seu personagem, é difícil de imaginar que ele não faça uma cena em dueto com a Emily que tenha no mínimo o espírito daquela clássica dança de Dick Van Dyke com Julie Andrews.

Tudo isso, vejam vocês, por causa do inesperado sucesso de Hamilton, que despertou um renovado interesse dos americanos sobre a história de seu próprio país. É como diz a análise da revista The Atlantic: “não dá pra imaginar o que é mais inesperado – uma estrela de reality shows sem qualquer experiência política se tornando o indicado dos republicanos à presidência ou um dos maiores hits da Broadway ser justamente uma ópera rap sobre o homem por trás dos Federalist Papers [ensaios escritos com o objetivo de validar a constituição dos EUA]. Ambos falam sobre a identidade americana, mas sob diferentes perspectivas. Um quer proteger a América, que ainda é majoritariamente branca e cristã, dos mexicanos, muçulmanos e tantos mais considerados perigosos. Já o outro tem tanta confiança no futuro multirracial que reescreve o passado dos EUA usando este conceito”.

Pois é. Por um mundo com menos Donald Trump e mais Lin-Manuel Miranda, afinal de contas.