Loving Vincent: uma animação produzida com pinturas a óleo! | JUDAO.com.br

É tão surpreendente quanto parece. Mas o resultado está ficando ainda melhor do que você imagina.

Vamos aos números: se a gente for considerar um desenho animado tradicional, daqueles feitas à mão, no acetato, são precisos 24 frames para gerar 1 segundo de animação. Fazendo as contas, isso requer mais de 170.000 desenhos para que tenhamos um longa-metragem de 2 horas de duração. Agora, imagina se no lugar do desenho fossem pinturas a óleo? Aquelas mesmas feitas em telas delicadas e cheias de pinceladas?

Pois é, esta é a ideia por trás de Loving Vincent, biografia do pintor pós-impressionista holandês Vincent Van Gogh, considerada a primeira animação da história feita à base de pinturas a óleo. Para 1 segundo de animação, é preciso ter 12 pinturas. No saldo total, a equipe das produtoras BreakThru Films e Trademark Films precisaria de 56.000 telas (todas emulando o estilo de Van Gogh, é bom lembrar), que completariam os 80 minutos de duração da obra. Pensa só no tamanho da exposição de arte que dá pra montar com isso? Pois é.

O primeiro trailer do filme, que foi liberado esta semana e você pode ver logo abaixo, já dá uma ideia geral do resultado da coisa toda. Pelo menos até aqui a ideia parece mais do que apenas linda e curiosa, mas também gera um efeito impressionante:

Com estreia prevista para o segundo semestre de 2016 (muito provavelmente mais para o final do ano, tentando uma estreia limitada para poder ser elegível ao Oscar 2017), Loving Vincent é um projeto que começou há cerca de dois anos, primeiramente financiado via Kickstarter. Com as mais de 50.000 libras em mãos graças a quase 800 apoiadores, foi possível montar e treinar um time inicialmente formado por 30 animadores/pintores que estão organizados num estúdio da cidade de Gdansk, na Polônia.

No entanto, até o mês de agosto, eles continuarão aumentando estes números e recrutando pessoas de todas as partes do mundo para auxiliar na tarefa – e se você aí do outro lado for um pintor talentoso com planos de visitar a Europa nos próximos meses, basta acessar este link e descobrir como mandar seu portfólio. Além de salário, a empresa também fica responsáveis pelas acomodações de seus futuros animadores.

O trabalho rola nas chamadas Painting Animation Work Stations (PAWS), estações de trabalho inventadas e patenteadas pela BreakThru Films. Logo depois que as pinturas estão prontas, elas passam então para um software de animação em stop motion chamado Dragonframe, já usado em produções como ParaNorman, The BoxTrolls e Frankenweenie.

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No comando de toda esta operação estão duas pessoas. A primeira delas é a diretora, Dorota Kobiela. Pintora treinada e estudiosa da arte ligada ao Ministério da Cultura da Polônia durante quatro anos, ela já tinha tido uma importante passagem pelo mundo da animação com The Flying Machine (2011), uma mistura de animação 3D e live-action que trazia Heather Graham e o pianista chinês superstar Lang Lang no elenco. Dentro do filme existiam diversos curtas que tinham vida própria, incluindo Chopin Drawings (homenagem ao aniversário de 200 anos do compositor Frederic Chopin) e Little Postman (também com uma técnica de animação que lembra pinturas, ainda que não artesanal quanto a de Loving Vincent).

Ao lado de Kobiela, também dirigindo o filme e ainda atuando como principal produtor, está Hugh Welchman, dono da BreakThru e responsável pelo premiado Pedro e o Lobo, vencedor do Oscar de melhor curta animado em 2008.

Loving Vincent promete contar toda a conturbada história de Van Gogh – indo até a sua morte em julho de 1890, aos 37 anos, 29 horas depois de ter atirado em seu próprio peito (embora alguns historiadores modernos contestem esta versão e defendam que ele teria sido alvejado acidentalmente por um jovem estudante de 16 anos).

Reconhecido pelos críticos apenas depois de ter partido, o pintor se tornou rapidamente um dos maiores nomes da arte moderna, em especial pela utilização vibrante das cores, pelo traço de pinceladas mais largas e pelos temas emotivos de suas pinturas. Hoje, elas estão entre as mais caras do planeta – Campo de Trigo com Ciprestes, por exemplo, chegou a ser vendida em 1993 por nada menos do que US$ 57 milhões. Já seu famoso Autorretrato com Orelha Cortada garantiu, numa negociação feita a portas fechadas, um valor que se estima entre 80 e 90 milhões de dólares.

Nada mal para um artista que, em vida, vendeu apenas um quadro.

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Muito se tem romantizado, com o passar dos anos, os seus problemas mentais, por vezes tratados como excentricidades de um gênio. Mas historiadores da arte frequentemente retratam Van Gogh como um homem frustrado justamente pela incoerência e inconstância que seus problemas causavam à sua produção artística. De lá pra cá, cerca de 150 diferentes psiquiatras tentaram diagnosticar sua doença, com hipóteses que variam da esquizofrenia ao transtorno bipolar, passando até mesmo pelo envenenamento por conta do contato com as tintas, que na época carregavam bastante chumbo.

Ao longo da projeção de Loving Vincent, os cineastas prometem que será possível identificar mais de 120 das principais obras do pintor. A principal fonte de informação do filme são mesmo as 800 cartas escritas por Vincent – em sua maioria, correspondências que trocou com o irmão mais novo, o negociador de arte Theo Van Gogh, que o ajudou a entrar de vez no circuito artístico ao colocá-lo em contato com as pessoas certas nos lugares certos. “Esta é uma investigação que vai a fundo na vida e na morte de Vincent Van Gogh, conforme contam suas próprias pinturas e os personagens que as habitam”, diz a página do filme no Kickstarter.

Em sua última carta, aliás, foi justamente isso que Van Gogh escreveu: “Bem, a verdade é que não podemos falar de outro jeito que não seja através de nossas pinturas”. E é isso que este projeto promete tentar fazer: deixar que o próprio pintor conte sua história. De um jeito ou de outro.