Editora, que foi parceira da DC nos anos 90 e deu o Super Choque ao mundo, vai voltar como a Terra-M do Multiverso DC e com histórias começando do zero
O grande anúncio da DC Comics nesta Comic-Con não foi sobre o Superman, Batman ou Mulher-Maravilha. Muitos menos envolve a Liga da Justiça. Na verdade, a mais importante (e surpreendente!) revelação foi justamente o retorno dos personagens da Milestone Media ao Multiverso da editora.
“Milestone Media? Que DIABOS é isso?”, pergunta o desavisado leitor. Tenho duas palavras pra você, então: Super Choque.
O projeto foi oficialmente anunciado durante um evento pra impressa no sábado (11) e, basicamente, trata-se da introdução ao atual Multiverso DC a Terra-M, de Milestone, que será habitada não só pelo Super Choque, mas também por outros personagens criados pela editora a partir de 1993 para representar as minorias nos quadrinhos dos EUA.
“Nós não poderíamos estar mais orgulhosos e empolgados sobre essa oportunidade de trazer o Universo Dakota de volta pra DC”, disse o co-publisher Jim Lee, se referindo à forma como aquele universo era chamado. “Esse é um grande passo para nós trazermos aos leitores uma linha diversa como parte do novo Universo DC, e estamos ansiosos para contar novas histórias que socialmente e culturalmente impactam no mundo que vivemos”. A ideia inicial é lançar duas graphic novels por ano, e um “eles ainda não sabem o número” de minisséries e especiais.
A Milestone foi criada no começo dos anos 90 por Dennys Cowan, Michael Davis, Derek T. Dingle e Dwayne McDuffie, que queriam dar espaço justamente para os negros e outras ~minorias nos quadrinhos. Eles costuraram um acordo com a DC Comics, pelo qual manteriam todo o controle criativo, copyright e licenciamento das criações, e começaram a publicar em 1993 as HQs Hardware, Icon, Blood Syndicate e Static, essa última justamente do Super Choque. Depois ainda vieram Shadow Cabinet, Xombi (que era estrelado por um herói meio coreano, meio americano) e Kobalt.
Todos viviam em Dakota.
O acordo com a DC foi vantajoso para as duas partes. A Milestone passou a contar com um selo de uma das duas grandes editoras em suas revistas, facilidades na distribuição e na atenção das comic shops e dos leitores. Pra DC, foi a oportunidade de atingir um público que não se via nas HQs da editora, além de literalmente fomentar um celeiro de novos talentos. Pra deixar ainda mais clara essas vantagens, foi promovido em 1994 o crossover Quando os Mundos Colidem, misturando os personagens de Metrópolis com os de Dakota.
No Brasil, essas histórias representaram a chegada da Milestone ao País. Quando os Mundos Colidem foi publicado entre as edições 9 e 14 da revista mensal Superboy, em 1995.
Só que também existiram problemas. Pra começar, as revistas da Milestone foram taxadas como feitas por negros apenas para o público negro pelos lojistas, e essa nunca foi a ideia – os personagens foram criados para qualquer um, independente da etnia ou cor da pele, pra tocarem em minorias como gays e transgêneros e também atraírem o público feminino. Pra piorar, houve uma grande crise no mercado de quadrinhos a partir de 1994, aquela mesma que fez a Marvel pedir concordata e quase falir.
Entre 1995 e 1996, praticamente toda a linha de revistas foi cancelada. Em 1997, a divisão de quadrinhos da Milestone foi fechada. Mas esse não era o fim.
O grande problema daquelas revistas é que o mercado ainda não estava preparado, o que foi somado à crise dos anos 90. Porém, aqueles personagens chamaram a atenção, principalmente o Super Choque.
Foi aí que a sorte da Milestone mudou: a Warner Bros. Animation resolveu que era hora de aproveitar o personagem em uma série animada, que seria dentro do mesmo universo de Batman: The Animated Series e Superman: The Animated Series. Com a ajuda dos co-criadores do personagem, Denys Cowan e Dwayne McDuffie, e com boa parte da equipe das duas séries anteriores, o Super Choque estreou em setembro de 2000 na TV. No total, foram 4 temporadas e 52 episódios.
Com o sucesso, McDuffie passou a se envolver nas outras animações da Warner/DC, como Liga da Justiça Sem Limites (e, depois, foi criar o Ben 10 como parte dos Men of Action), e começou a surgir um novo interesse dos leitores de gibis pelo personagem. A partir de 2000, a Milestone voltou a republicar histórias antigas e ainda fazer umas inéditas.
Ainda assim, a editora não conseguia se manter sozinha. A partir de meados dos anos 2000 começaram conversas pra trazer os personagens de volta para a Casa do Superman e, em 2008, o Dakotaverso foi integrado ao Universo DC após a saga Crise Final. Inclusive, a Liga da Justiça e os heróis da Milestone chegaram a dividir um arco juntos e, depois, o Super Choque foi fazer parte dos Novos Titãs. Em 2011, quando houve o reboot da DC, o personagem passou a ter uma revista própria – que foi cancelada no ano seguinte, depois de 8 edições.
As vendas eram realmente fracas: apenas 10 mil exemplares no último número, o 167º mais vendido em abril de 2012.
Ainda em 2011, Dwayne McDuffie morreu por conta das complicações de uma cirurgia de emergência no coração. Apesar da perda, isso acabou reaproximando os fundadores da editora, que, agora no começo de 2015, anunciaram que queriam voltar ao mercado.
Com o novo acordo, Milestone voltará a ser uma editora parceira e o Dakotaverso deixará de ser parte do Universo DC ~normal, ou seja, não vai mais dividir a Terra com Superman e Batman. Não foi esclarecido ainda, mas é provável que isso tenha sido feito para deixar todo o controle criativo nas mãos dos quadrinistas e editores da Milestone, que não vão precisar se preocupar com que os criativos da DC estão pensando.
Durante o painel da Miletone Media na San Diego Comic-Con, Denys Cowan disse que haverá um reboot total, ignorando as HQs dos anos 90 e também as mais recentes pela DC. Será um universo criado do zero, que servirá também pra mostrar que o Dakotaverso é muito mais que um só personagem.
Ainda assim, isso não quer dizer que o pessoal da DC Comics não poderá se envolver. Geoff Johns, o CCO, e Jim Lee, o co-publisher, estão confirmados em um dos futuros especiais. E como o Dakotaverso vai ser a Terra-M do Multiverso DC, então é de se esperar também que crossovers ainda aconteçam – só não serão tão comuns quanto eram antes.
Outra parte do acordo é que os personagens da editora vão também ganhar action figures e outros colecionáveis, o que entra naquela velha história de diversidade também nesse mercado. “Nós estamos tentando manter a empresa viva”, disse Derek T. Dingle, co-fundador da Milestone, durante o evento de anúncio. “Nós queremos manter a diversidade na indústria”. Ele também disse que foi “muito complicado” chegar nesse novo acordo com a DC.
É provável que os planos desse retorno sejam adequados às datas de lançamento da futura série live-action do Super Choque, que será produzida para web e terá o Jaden Smith como protagonista. Só que o projeto deve demorar um pouco ainda pra sair no papel: no painel na Comic-Con, eles disseram que ainda estão nos estágios iniciais da escalação do resto do elenco.
De qualquer forma, o momento não poderia ser melhor. Agora é só torcer pra que tudo dê certo – e que não surja mais nenhuma Crise pela frente...