Batman #41 apresenta uma nova versão do Homem-Morcego, uma que pode superar o mimimi e usá-lo como o próprio trunfo
SPOILER! Batman está morto. Morreu nas páginas finais de Batman #40, no final da saga Endgame, junto com o Coringa. Gotham não tem mais seu maior protetor. E agora?
Mais de três meses se passaram – no mundo da ficção, já que aqui na vida real foi um mês e meio recheado com a saga Convergence. Só que Gotham City não está desprotegida. Ela tem um novo defensor, um novo Cavaleiro das Trevas. Batman está vivo.
E ele é James Gordon.
Lá atrás, quando a DC revelou o novo visual do herói e, depois, vazou que ele seria o Gordon, muita gente chiou. O típico mimimi da internet, do “não li e não gostei”. Só que agora, neste 10 de junho, finalmente a editora publica Batman #41, no qual o roteirista Scott Snyder e o artista Greg Capullo têm a chance de contar a versão deles de tudo isso. E, cara, a HQ não é só sensacional, mas como também desconstrói qualquer reclamaçãozinha.
Um dos grandes acertos da dupla Snyder e Capullo nessa longa passagem por Batman é ligar o Homem-Morcego a Gotham. São duas entidades que fazem parte de si mesmas, que se autocompletam. Uma construção muita bem-feita, principalmente em Ano Zero, que reconta a origem do herói numa versão atualizada.
Quando o Batman morre no final da edição 40, essa equação é quebrada. Gotham não tem mais seu protetor, e, como o corpo humano, busca formas de se cicatrizar. Como fazer isso nessa situação? Tentando criar um novo Batman. E quem faz isso é a própria polícia e o poder público, já que, nesse Universo DC atual, o Batman conquistara o suporte deles, que perceberam a importância de ter um vigilante pelas ruas da cidade.
(Aqui vale um parêntese, antes que você diga que “todo mundo morre nos gibis, mas sempre volta”, é bom avisar: mortes e renascimentos são, há quase 30 anos, parte inerente dos quadrinhos dos Estados Unidos. Sabemos que todos aqueles heróis vão, eventualmente, morrer e voltar – e, às vezes, suas mortes nem foram pra valer. O barato é saber como eles morrem e como voltam, e, muitas vezes, ver o que acontece na ausência deles. É justamente desse último ponto que se trata Batman #40).
E é aqui que entra toda a esperteza do Scott Snyder. Basicamente, TODAS as reclamações sobre o novo Batman possuem justificativas que fazem sentido no contexto da história. Pra começar, a escolha de Jim Gordon como o novo herói. Nem mesmo ELE quer assumir esse manto e a ideia inicial é justamente pegar um cadete para ser o Cavaleiro das Trevas. Todos podem ser melhores que Gordon fisicamente, na inteligência, etc., mas nenhum deles acompanhou tão de perto a carreira do velho Batman, os pensamentos, os ideais... Enfim, nenhum deles será um Batman perfeito. Nem Jim Gordon. A diferença é que sabemos quem tem capacidade para ser um bom Batman por si só.
E, desde o reboot de 2011, o James Gordon é um pouco diferente daquele que você conhece. Ele não é tão velho assim, nem grisalho. No decorrer da história, inclusive, ele rebate esse argumento numa conversa com o Harvey Bullock. “Você tem o que, sessenta anos?”, “Eu tenho 46”. Mais novo que o Robert Downey Jr., que veste uma armadura pra ser o Homem de Ferro dos cinemas.
Só que isso não quer dizer que o novo Morcego não precise entrar em forma, se preparar, parar de fumar. E ele fez justamente isso nesse tempo que rolou entre as edições 40 e 41.
Aliás, usar uma armadura também é algo que faz sentido no contexto. Apenas Bruce Wayne era maluco o suficiente para sair por aí achando que, basicamente, assustar as pessoas já era o suficiente para mantê-lo protegido. Gordon (ou qualquer outro meganha que tivesse no lugar dele) não precisa ser tão maluco assim e, ainda mais, ninguém quer ver um funcionário público morto tão facilmente assim. É uma decisão corporativa, digamos assim.
Pelo mesmo motivo, Gordon combate o crime com uma equipe de apoio no ouvido, sempre dando informações, auxílio e por aí vai.
Ok, essa armadura não tem o visual mais lindo do mundo. Parece um coelho – comentário feito pelo próprio Jimbo na história. Como o todo, esse detalhe faz sentido: não temos ninguém envolvido com o “Batman anterior” nesse novo projeto. Por mais que a Wayne Enterprises também faça parte da bagaça, são pessoas que nunca entraram na cabeça de Bruce Wayne, que nunca entenderam seus objetivos, suas inspirações. São técnicos e até um designer que, sei lá, querem fazer algo cool.
De qualquer forma, ele ainda usa uma roupa agarradinha, mais tradicional e heroica, que aparece toda vez que deixa a grande armadura de lado pra, por exemplo, entrar num apartamento.
No fim, o que Snyder e Capullo nos entregam é uma história bem contada, estruturada, que revela não só como Jim Gordon foi levado a ser o novo Batman, mas também como é o primeiro confronto dele com um vilão – claramente mais SUPER poderoso que o normal para o gibi do personagem, exatamente pra deixar clara a necessidade da armadura. Na arte, Capullo continua fazendo um trabalho sensacional, que já fico sem adjetivos pra usar depois de 41 edições (e das dezenas de outras desde a fase dele no Spawn).
Vale dizer que trocar a identidade do Batman não é nenhuma novidade, também. Foi feito nos anos 90, quando Jean-Paul Valley (Azrael) assumiu o posto enquanto Bruce Wayne estava paraplégico e quando Dick Grayson deu uma força pro antigo mentor terminar a recuperação. Recentemente, quando Bruce ~morreu em Crise Final, Dick voltou ao posto por algum tempo.
A diferença, dessa vez, é que Snyder tem a coragem de quebrar essa corrente do “legado”, do herói velho tombar para ser substituído pelo jovem. Nada disso: ele coloca um homem mais velho, pra deixar claro que o enredo aqui não é sobre legado. É sobre o que o Batman representa e como ele é parte inerente de Gotham. E como James Gordon é também parte desse mito.
Além disso, a HQ funciona como um ótimo ponto de entrada para novos leitores, como parte da iniciativa DC You e de Divergence, já comentada aqui no JUDÃO. Um “fresh start”, como dizem os americanos, que não vai te exigir tanto conhecimento do que foi contado até agora, mas vai te apresentar um rosto conhecido por baixo da máscara.
Batman vive. Mas não aquele Batman que você conheceu. É outro. Mas vive.
E o Bruce Wayne, bom... Melhor não entregar esse último spoiler. ;)