Os trailers das versões de ambas as franquias de terror revelam modificações sutis com relação aos originais… e outras nem tanto
A tradução LITERAL pra palavra reboot acaba sendo, no nosso bom PT-BR, algo como “reiniciar” ou “recomeçar”. Conceitualmente, portanto, é algo diferente do popular remake, que é apenas e tão somente “refazer”. Entender a diferença entre ambos é crucial pra sacar o que esperar de uma produção.
Um reboot é definido pela indústria cinematográfica como sendo uma mudança total de um título e/ou franquia. O tema central pode se manter, mas todo o restante pode e muito provavelmente vai ser modificado em algum nível. Já um remake é uma mesma história, com os mesmos personagens, sendo recontada, ainda que com algumas modificações aqui e ali que, no frigir dos ovos, podem ser essenciais.
Na semana passada, tivemos o segundo trailer da nova versão de Cemitério Maldito e o primeiríssimo vídeo do novo Brinquedo Assassino, ambos reinterpretações de clássicos do terror cinematográfico. E o que vimos nos dois são mudanças estruturais, ambas interessantes até o momento, uma sutil mas significativa e outra BEM MAIS profunda, que ajudam não apenas a entender a diferença entre remake e reboot, termos usados de maneira indiscriminada como iguais entre si, mas também que um remake não precisa ser necessariamente uma produção que segue rigorosamente o mesmo livro de regras e joga com plena segurança. Às vezes, dá pra arriscar.
A gente já tinha, na real, sido apresentado ao trailer de Cemitério Maldito, que chega aos cinemas exatamente três décadas depois do filme original de 1989, adaptando o livro de Stephen King lançado em 1983. Mas foi neste segundo vídeo que entendemos um pouco melhor da trama e descobrimos uma “ligeira” modificação tanto com relação ao filme quanto com relação à obra literária de King. Aperta o play e, caso você já tenha visto alguma das duas versões, vai sacar de imediato qualé.
Pois é, ao invés do jovem garotinho Gage, agora quem morre e retorna apavorante das trevas é sua irmã mais velha, Ellie. “Acredite, ficamos nervosos com relação a isso”, explica o produtor Lorenzo di Bonaventura em entrevista ao EW. “Eu me sinto desta forma sobre qualquer coisa que se refaz ou adapta. Se nós entregamos a mesma coisa que você viu antes, não fizemos o bem que aquilo merecia. Também costumo ser protetor com relação aos filmes clássicos, mas quero uma nova experiência a cada vez, quero sentir que os cineastas realmente pensaram sobre aquela escolha. Esta foi uma na qual pensamos mesmo”.
A dupla de diretores, Kevin Kölsch e Dennis Widmyer, espera que os fãs entendam que foi uma mudança necessária — para eles, o que King descreve nas páginas é mais difícil de aceitar ao se ver na telona e a presença de uma garota mais velha, do alto de seus 8 anos de idade, é fisicamente mais intimidadora do que a de uma criança de 3 aninhos. “Eles rodaram grande parte do primeiro filme com um boneco. É assustador e funciona ali. (...) Mas sentimos que já tinha sido feito e esta foi a nossa chance de tentar algo novo”.
Além disso, no livro, fica claro que o menino que é ressuscitado é na verdade um espírito furioso que habita o corpinho do menino, alguém capaz não apenas de atacar seus parentes mas também brutalmente manipular seus maiores medos e fraquezas. Como uma criança tão jovem poderia interpretar isso de maneira efetiva? Aliás, e isso foi legal de descobrir, a equipe de produção achou que não apenas seria complicado mas também talvez não fosse lá muito ético submeter uma criança tão jovem a esta experiência, já que ela teria facilidade de confundir fantasia e realidade. Já a atriz Jeté Laurence, que completou 11 anos durante as filmagens, tinha maior consciência do que estava acontecendo.
“Então, pudemos ir mais a fundo com esta criança. Pudemos fazer uso real do horror psicológico de uma criança voltando à vida graças à idade dela”, explica di Bonaventura. “Sendo mais velha, ela entenderia o que aconteceu com ela na estrada. Ela entenderia que está morta. Ela saberia não apenas como fisicamente matar uma pessoa mas também como psicologicamente destruí-la. Isso dá uma nova camada a tudo”, confirma Widmyer. Além disso, os dois cineastas acreditam que a relação de amizade que ela tem com o vizinho idoso da família, Jud Crandall (John Lithgow), vinda diretamente do livro, poderia ajudar a fortalecer ainda mais o drama da história.
Dá pra dizer que esta é uma decisão corajosa mas sutil com relação a um remake, por exemplo. O que é diferente do total clima de reboot que vimos neste primeiro trailer de Brinquedo Assassino. A ideia central tá ali. Mas conduzida de um jeito BEM diferente. E, apesar da chiadeira, que parece uma adaptação/atualização bastante interessante.
Isso aí, o trailer abre como se fosse um comercial da Kaslan Corporation para o mais recente modelo do seu boneco Buddi, uma versão bem mais avançada tecnologicamente daquele Chucky de plástico e que teoricamente deveria falar apenas meia dúzia de palavras que nós conhecemos em 1988. Na versão original, temos um serial killer que, para fugir da morte, transfere temporariamente a sua consciência, por meio de uma espécie de ritual vudu, para o corpo de um boneco. Mas aqui, o boneco que Karen Barclay (Aubrey Plaza) compra pro filhote Andy (Gabriel Bateman) tem uma poderosa inteligência artificial.
Diferente do roteiro original de Don Mancini, parece que este Chucky é uma tecnologia que acaba sendo pervertida, meio que seguindo a narrativa do robô assassino. Se você entra no site oficial da linha de bonecos, que o estúdio criou como suporte pra história do filme, vai sacar que estamos falando de uma linha que tem mais de 20 sensores e câmeras que o ajudam a aprender a partir da interação humana, oferecendo informações detalhadas e em tempo real. Isso e uma capacidade de reconhecimento de voz a partir de armazenamento na nuvem, o que só reforça a impressão que o trailer traz de que o nosso bom e velho Chucky, agora modernizado, vai poder comandar seu próprio exército, tornando a ameaça maior do que só a caçada a um garoto para cujo corpo ele poderia transferir a sua alma perdida.
Óbvio que a gente não sabe como diabos isso vai ser conduzido mas, de qualquer maneira, tornar o boneco um brinquedo “inteligente” é uma adaptação até necessária pros dias de hoje, dando ao pequeno assassino miserável mais oportunidades e equipamentos para conduzir a sua sangrenta trilha de matanças.
Claro que nem todo mundo parece estar lá muito ansioso, como é o caso do próprio Mancini, que teve zero envolvimento com este reboot. Tendo escrito todos os filmes da série e dirigido pessoalmente os últimos três (O Filho de Chucky, A Maldição de Chucky e O Culto de Chucky), o cara afirmou, num papo com o podcast Post Mortem, ter ficado magoado com a porra toda. “Perdão se pareço estar na defensiva, mas meus dois últimos filmes com o personagem, embora não tenha sido lançados no cinema, tiveram aprovação de 83% no Rotten Tomatoes. Foram bem recebidos. E eu criei o personagem e mantive a franquia viva por três malditas décadas”.
Ainda assim, com a série de TV que está produzindo pro Syfy e é total e completamente independente do novo filme, ele vai ter a chance de mostrar inteiramente a sua visão. “A série será um novo olhar sobre a franquia, nos permitindo explorar o personagem com uma profundidade que apenas o formato de uma série de TV permitiria, enquanto permanecemos fiéis à visão original que têm aterrorizado plateia ao longo de 30 anos”.
Outra que reclamou foi a atriz Jennifer Tilly, que interpretou a versão ainda humana e depois deu voz à versão boneco da noiva de Chucky, Tiffany Valentine. Ela mandou o seguinte tweet:
Então... se formos pensar, tanto no caso dela quanto no do Mancini, de fato, a hashtag #NotMyChucky faz todo o sentido. Porque, por mais divertidos que tenham sido os filmes recentes, eles falam essencialmente com convertidos e se debruçam num tom bem mais CÔMICO. Não é terror, é terrir puro e escrachado, o que está longe de ser uma crítica mas é a realidade das coisas.
Mas para quem está querendo fazer um reboot, do zero, recomeçar uma franquia e capturar a atenção de uma nova audiência, este de fato não seria o caminho. Nada de continuações intermináveis, nada de depender de um amor retrô ao clássico. Seria a hora de mudar o tom e ampliar o foco para algo mais moderno e atual. E é isso que o diretor norueguês Lars Klevberg (Morte Instantânea) parece que tá querendo fazer.
Se vai ficar bom, só vendo pra descobrir. Mas que, pelo vídeo divulgado até o momento, a parada tá estranhamente assustadora, ah, isso tá sim. Já é um ótimo sinal.