O retorno do Comendador: quando uma novela é um pouco gibi | JUDAO.com.br

O final de Império, com o protagonista aparecendo na última cena, pode ter surpreendido o telespectador comum, mas é algo pra lá de manjado pra quem lê histórias em quadrinhos

O Comendador, aquele de Império, morreu. E voltou – like a Bia Falcão, entre aqueles personagens de novela que me lembro de terem forjado a própria morte. Aí, no último capítulo, morreu de novo. Tomou tiro nas costas, foi cremado, suas cinzas (que na verdade eram apenas CARVÃO EM PÓ) foram jogadas do alto do Monte Roraima... E reapareceu, arrumando seu indefectível bigode, na última cena, ali no cantinho.

Bom, nem tanto no cantinho, já que a câmera focou e se aproximou da janela onde ele apareceu. Era o caso de ter sido apenas um EASTER EGG, tal qual Três Solteirões e um Bebê... Falariam daquele final por décadas — e a reprise, no dia seguinte, teria explodido de audiência.

Não faço a menor ideia de quantas vezes o protagonista já morreu em uma novela (quem dirá duas vezes...) e ainda deixando um gancho tão aberto sobre o retorno do personagem no final. Muita gente caiu matando (peço desde já desculpas pelo trocadalho), mas, hey, pra quem é leitor/fã de quadrinhos, mortes e retornos de personagens ~queridos fazem parte do dia a dia.

Seria só um Comendador de PAPELÃO?

Seria só um Comendador de PAPELÃO?

É complicadíssimo encarar o fato, mas sim, todos nós vamos morrer. Não há vida sem morte — nem a nossa, nem se alguém que a gente goste. É tudo uma incógnita, que demora pra que a gente se acostume com a ideia de nunca mais vermos essa pessoa.

Isso vale também pra ficção, com um bônus: a famosa curiosidade mórbida.

Na novela, todo mundo sabia da primeira morte do Comendador, mas quem acompanha minimamente tava lá, assistindo, querendo saber como ia rolar. O mesmo foi sobre o último capítulo: o autor da novela, Aguinaldo Silva, chegou a falar abertamente na véspera do último capítulo que mataria o protagonista. Ainda assim, audiência foi lá pra cima.

Pois é, fica fácil entender o porquê a morte de um personagem importante e querido é um plot sedutor para qualquer roteirista.

Nos gibis, primeiro caso do tipo, que comoveu os leitores, foi a morte de Gwen Stacy, no já longínquo 1973. Não que o tema fosse totalmente inédito na mídia — o próprio pai da Gwen, o capitão George Stacy, já tinha morrido em 1970, além do Bucky Barnes e outros diversos casos, mas foi a primeira vez que uma editora teve coragem de dar cabo de uma personagem no auge da popularidade. O assassino, o Duende Verde (Norman Osborn), morreu na edição seguinte, alçado imediatamente ao posto de maior vilão do Homem-Aranha, superando o Doutor Octopus.

ASM

Digamos que o motivo da morte da Gwen não foi por conta das vendas – na real, havia uma corrente dentro da Marvel que temia a grande aproximação dela com o Peter Parker, o que inevitavelmente levaria os personagens ao altar e ao envelhecimento do Homem-Aranha perante os leitores. Só que a Marvel soube explorar na época o acontecimento, com duas famosas capas, e A Noite em Que Gwen Stacy Morreu se tornou uma obra prima ganhando diversas republicações e inspirando o enredo de um filme. Ou seja, $$$.

A partir daí, a curiosidade sobre mortes de personagens entre leitores só aumentou e o caminho foi se tornando mais e mais comum – gerando boas histórias no processo. Uma delas foi A Morte do Capitão Marvel, também anunciada logo na capa de Marvel Graphic Novel #1, de 1982. Mais uma vez a surpresa não era saber se ele ia morrer ou não, mas saciar a curiosidade de COMO ele ia morrer – no caso, vencido pelo câncer.

A parte de ressuscitar é mais recente – não que fosse incomum antes, mas foi A Morte e o Retorno do Superman, de 1993, que colocaram a tática no imaginário popular.

No caso do Azulão, isso foi parte de um plano bem elaborado, criado pra superar uma adversidade. Desde o reboot pós-Crise nas Infinitas Terras, em meados dos anos 80, os roteiristas da DC estavam aproximando Clark Kent e Lois Lane, planejando o casamento deles. Só que a Warner estava planejando pra 1993 uma nova série com os personagens, chamada Lois & Clark: As Novas Aventuras do Superman, e alguém teve a ~genial ideia que seria melhor juntar o casal da série e do gibi ao mesmo tempo. Sem uma previsão de quando isso ia acontecer na TV, mas com as coisas bem adiantadas na revista, a DC então resolveu que a forma ideal para adiar tudo era matar o noivo.

E, claro, depois ressuscitá-lo.

Foram, ao todo, três grandes arcos – que começaram em outubro de 1992 e terminaram em outubro de 1993. Desse período, Kal-El ficou morto por cerca de 8 meses e as vendas foram às alturas – não só motivadas pela curiosidade e pelo desejo do retorno do herói, mas também por um grande mercado especulativo que existia naqueles tempos.

Mas... Se as pessoas querem ver alguém morrer, porque depois querem acompanhar o seu retorno? Simples: a curiosidade mórbida passa assim que você descobre o motivo da morte. Depois, é como lidar com a morte de alguém: ela não está mais lá pra você. Fica um grande vazio e você, invariavelmente, se pega desejando que aquela pessoa estivesse ali com você, num momento ou outro.

Morto! Morto?

Morto! Morto?

Com personagens da ficção é a mesma coisa. A diferença é que lá, pra voltar, só é necessária a boa vontade de roteiristas, editores, produtores, atores... Não à toa, mortes e retornos se tornaram parte comum das histórias em quadrinhos americanas. É algo que hoje faz, definitivamente, parte da mídia.

E é por isso que o Comendador voltou. Se a morte parecia um fim no auge para um personagem de novela que passou por tudo que ele passou, não ia parecer justo aos telespectadores imaginar que ele nunca mais ~estará entre nós, por mais que fosse o último capítulo da novela.

A saída? Um final aberto, saciando a vontade de quem não o queria ver morto, mas mantendo o respeito por aqueles que acham que uma novela precisa ter algum compromisso com a realidade. Mais quadrinhos que isso, só se fizerem uma Império 2 – O Retorno do Comendador... ;)

(Não que um FANTASMA NA JANELA seja algo tão real assim, mas o pessoal acredita tanto em tanta coisa esses dias... ¯\_(ツ)_/¯)