A abordagem é diferente? Claro que é. Mas este lance de “mais adulto” da nova série, calma, não é nada pra assustar ninguém…
Esta semana, a gente falou por aqui sobre a campanha que uma ONG de assustadas mamães americanas fizeram pelo boicote da nova série dos Muppets. Segundo elas, a abordagem adulta que a emissora estava dando aos bonecos destruiria a sua imagem como ícones infantis dos anos 70 e os tornaria absolutamente impróprios para o público infantil, uma afronta aos valores familiares, aquela coisa congressobrasileirica, enfim.
Pois bem. Depois de assistir ao primeiro episódio do programa, que tem produção do mesmo Bill Prady de The Big Bang Theory, tenho uma notícia que não sei bem se vai tranquilizar as tais mamães tendo um ataque de nervos, mas com certeza vai bater fundo no coração dos fãs dos personagens – como eu, por exemplo. Estes são rigorosamente os Muppets que você sempre viu. Ponto. Não são “os Muppets falando de pinto, peito e bunda”, como alguns andaram retratando por aí. Nem de longe.
O formato, claro, é diferente, esta coisa tipo mockumentary, a la The Office, câmera seguindo todo mundo, entrevistas de olho diretamente no público. Mas esta abordagem de misturar os Muppets com os seres humanos como se fosse uma coisa absolutamente natural e colocá-los nos bastidores da indústria do entretenimento é um verdadeiro clássico para os personagens, já vimos uma porrada de vezes. E continuam lá, firmes e fortes, as participações das celebridades e as muitas referências à cultura pop.
A diferença aqui é que estas coisas vieram para a linha de frente.
Aliás, é por isso que muita gente diz que estes Muppets viraram “adultos”. Porque assim como acontece, sei lá, com os filmes da Pixar, os Muppets SEMPRE tiveram duas camadas de compreensão: aquela mais óbvia e direta, focada nas crianças, e aquela um tanto mais profunda, que apenas os papais e mamães entenderiam. Nesta nova série, a camada de compreensão mais adulta se tornou protagonista e a coisa mais infantil, mais pastelão, virou pano de fundo. Mas ainda está lá. As sacadinhas espertonas dividem espaço com tiradas mais físicas, mais bobonas, torta na cara, que arrancam gargalhadas da molecadinha e de moleques mais grisalhos como eu, continuando divertidas como há 30 anos. O que é o Scooter tentando impedir a Elizabeth Banks de chegar ao palco a qualquer custo? :D
O Caco*, claro, fala de maneira sutil sobre sexo – mas está longe de ser algo explícito, uma versão verde e anfíbia de qualquer personagem de Parks & Recreation. Não, gente, menos, bem menos. “O que eu posso dizer, eu gosto de porquinhas”, diz, resignado, quando conhecemos Denise, a garota do marketing da emissora que ele passou a namorar depois que terminou com a Piggy. E lá está ela, no fundo da tela, olhar maroto, tomando um suco de canudinho. Sem exageros. Sem insinuações. Ao mesmo tempo, se repete a eterna gag da Piggy fazendo uma interjeição do tipo “HÁ!” para interromper o sapo quando ele quer dizer algo que ela não está no barato de ouvir.
A trama já é um lance amplamente divulgado. Piggy apresenta um talk show, todos os principais Muppets trabalham nele, Caco* é produtor executivo, Gonzo roteirista, estas paradas. E, neste ponto, tudo funciona perfeitamente, do jeito que todos os vídeos promocionais prometeram. O Electric Mayhem, óbvio, é a banda residente do programa da Piggy, mas eles sempre têm uma banda convidada – que, neste caso, foi o Imagine Dragons. E quando os músicos humanos resolvem convidar o Animal para fazer uma palhinha em sua apresentação, cara, ele simplesmente rouba a cena. Porque ele é o Animal, né. E ver o Animal tocar sem ter pelo menos um instrumento destruído no palco não é um bom dia.
A subtrama do Fozzie enrolado com uma namorada humana e buscando a aprovação de seus pais (por mais que o paizão da garota faça uma piada “realmente ofensiva” a respeito dos ursos fazerem suas necessidades no mato, tsc, tsc) é bacana. Mas nada supera o fato de que o emprego do urso é o de aquecer a plateia do programa contando piadas antes da atração começar (o que, aliás, acontece de verdade em todos esses talk shows que você vê por aí — os gringos, pelo menos). E a gente sabe bem qual é o nível das tiradas do Fozzie (a minha principal referência de humor, gostaria de deixar claro). Só que adivinha quem está na primeira fila, reclamando das tiradas do urso e da piada do tornado que ele conta TODAS AS NOITES? Statler e Waldorf, claro, a dupla de velhinhos reclamões que já brincava de trollar antes mesmo desta palavra ser inventada.
Diabos, ver esta cena foi praticamente me sentir em casa de novo. :D
Mas é óbvio que boa parte da história vai girar em torno do fato de que, adivinha só, Caco* e Piggy ainda se gostam. E nestes momentos, quando se percebe o que um ainda sente pelo outro, a série ganha um ar de fofura, de uma ingenuidade até angelical, eu diria. Sabe aquela coisa meio Ross e Rachel? O casal que você torce para que dê certo, por mais que tenha consciência das merdas que eles fizeram? É bem isso.
A Piggy é uma pentelha egocêntrica que fica brigando com a sua principal convidada da noite, Elizabeth Banks, por causa de uma audição fracassada para o filme Jogos Vorazes (ou quase isso...)? É, claro que é. Mas chega a dar uma dor no coração quando vemos um vídeo de paparazzi que registra o momento em que o casal termina – incrivelmente, por iniciativa do próprio Caco*, conhecido pela timidez e passividade, mas cansado do deslumbramento que Piggy vinha demonstrando em seu momento “oi, agora sou de verdade a estrela que sempre quis ser!”.
Estamos falando de um sapo e de uma porca de espuma. Mas esta bem que poderia ser a história de qualquer casal por aí, que eu e você conhecemos. No fim das contas, talvez este seja o mais perto de “adultos” que estes Muppets poderiam chegar...
Ah, sim. As mamães da América podem ficar tranquilas porque existe um legítimo representante de seus interesses no programa. Trata-se de Sam The Eagle, a águia careca com cara de mal-humorada que é também responsável por analisar as piadas do roteiro do talk show e dizer quais termos ficam e quais termos são “inapropriados”.
Enquanto você fica aí pensando no quanto isso é genialmente metalinguístico, guarde na memória o fato de que Sam tem uma explicação perfeitamente racional para o motivo do verbo “gesticular” estar terminantemente proibido. É, tá aí uma destas piadas que as crianças não entenderiam... e talvez nem alguns adultos. ;)
A música tocou e as luzes se acenderam. Tomara que, até o final da temporada, possamos dizer que esta série também é “the most sensational inspirational celebrational Muppetational”.
* Sim, continua sendo Caco.