Sim, sim, eles têm uma função no processo – assim como VOCÊ também tem a sua
A-Arca JUDÔNICA tem como INTUITO resgatar algumas das melhores publicações dos quase 15 de existência do Judão... e d’A-Arca. Republicaremos por aqui algum artigo, entrevista, podcast ou qualquer coisa que tenhamos feito na nossa vida que faça algum sentido nos dias de hoje. Gotta get back in time!
“Ah, é? Então faz melhor!”. A fatídica frase que todo crítico, do que quer que seja, escuta assim que não se derrama em elogios sobre um produto que todo mundo ama. Achei um disco ruim e escrevi uma crítica desfavorável? “Ah, é? Então faz melhor!”. Aquele filme é uma bomba e a minha crítica desce o malho nele? “Ah, é? Então faz melhor!”. Sabe aquela coisa de que todo crítico de cultura é um artista frustrado? Bem isso.
Nesta coluna do meu finado espaço 88FM, eu falo sobre o real papel de um crítico e sobre como as pessoas deveriam, em tese, se relacionar com uma crítica. Pensando bem, tá bem alinhado com o que a gente pensa atualmente como sendo o papel do JUDÃO. O texto já foi escrito tem um bom tempo, verdade, mas ainda é um dos que mais curto na antiga fase do site – e cujo novo link vou fazer questão de mandar para a pessoa que me soltou esta frase, outro dia, quando disse que não gostei de um determinado álbum... :D
Nas últimas semanas, os temas abordados nesta coluna têm surgido quase como num passe de mágica, caindo no meu colo bem no meio da correria do dia-a-dia justamente quando eu estava mais desesperado em busca de inspiração. “Uau, como não pensei nisso antes?”. No caso do texto desta semana, no entanto, a coisa deu-se de maneira bem diferente. Há muito tempo eu venho querendo escrever sobre o assunto, dos mais espinhosos e complicados, mas estava me segurando, talvez para tentar ganhar a familiaridade e simpatia dos caríssimos leitores judônicos antes de entrar com os dois pés no peito.
Mas nunca fui daqueles que têm medinho de comentários negativos, então resolvi largar o receio na gaveta do criado-mudo e botar os dedos para funcionar nestes toques malditos. Seja o que Odin quiser.
A pergunta que me chegou por e-mail dias atrás era: “Pra que servem os críticos?”. O sujeito parecia incomodado com o que eu falei sobre o Nirvana (e olha que não disse nada de tão grave assim, entenda) e levantou a bola não só sobre os críticos de música, mas de cinema, de teatro, de literatura e demais manifestações culturais. Tenho ouvido (e recebido) demais esta pergunta em diversos fóruns pela internet afora, assim como as questões que seguem abaixo e que eu tento responder pacientemente –- mas cuja decisão sobre o que está certo ou errado eu deixo para vocês, leitores-ouvintes da 88 FM. Vamos como Jack, por partes:
Qualquer um pode ser crítico? Não basta saber se você gostou ou não deste filme ou daquele CD para se achar crítico e sair escrevendo das suas por aí, se achando a última bolacha do pacote. Pode parecer uma postura arrogante, mas é a verdade. Não custa nada considerar o assunto por um momento. Para trabalhar com textos, você precisa escrever minimamente bem. Ter bom domínio da língua portuguesa, ter fluidez na redação e saber construir uma estrutura textual atraente para o leitor. Além, é claro, de ter personalidade. De saber construir um estilo de texto de maneira que as pessoas se identifiquem com ele e, mais do que isso, identifiquem-no de bate-pronto como sendo seu. Como dizia um professor meu: “Todo mundo escreve. Então, todo mundo acha que sabe escrever bem”.
Existe uma diferença considerável aí no meio do caminho. A outra coisa é que um crítico, de qualquer meio, precisa ter excelente argumentação para expor suas opiniões (pois o “porque gostei” é muito mais importante do que o “gostei”) e um forte embasamento cultural no assunto. Para fazer críticas de música, o cara tem que entender de história da música, de teoria, tem que ter ouvido muita coisa na vida (dos mais variados gêneros) para poder identificar sutilezas, influências, referências, cruzamentos, experimentações… Pode parecer fácil, mas não é.
Os críticos devem ser imparciais? Esta é uma questão que divide profissionais e teóricos da comunicação. Eu tenho a minha postura de que, se o jornalismo noticioso já é carregado de uma farta dose de opinião (e interesse) pessoal, o que esperar então do papel de um crítico? Muitos defendem que não, mas para mim é impossível dissociar uma coisa da outra. Quando eu ouço um disco, eu gosto dele ou não gosto. Não existe meio-termo. Posso gostar menos ou mais, mas a coisa é bem no esquema do “sim” ou “não”.
Somos todos humanos. Como impedir que isso reflita no nosso texto? O que eu acho que não pode existir, e aí existe uma diferença muito grande, é o pré-conceito. Veja: eu posso não gostar, como ouvinte, da banda X ou do estilo Y. Mas quando me cai um trabalho relacionado em mãos, não posso ligar o automático “não gosto” e dane-se. Nops. ISSO é errado. Vou escutar de coração aberto, pronto para ser surpreendido, de verdade, tentando ao máximo evitar concepções anteriores que possam deturpar a audição daquela obra. Posso não gostar da banda X, mas ouvir o disco e achar interessante. E aí? O que acontece? Vou dizer que o álbum é ruim só para manter a minha posição anterior?
Todo crítico é um artista frustrado? Isso é um baita papo-furado, numa boa. “Ah, todo crítico de música é um músico frustrado”. Discordo. Como eu disse antes, o crítico deve ser, antes de tudo, um estudioso e especialista em sua área. É um teórico. Mas não precisa necessariamente ter o talento natural para a música, que é coisa com a qual a gente nasce (pelo menos em 88% dos casos). O crítico de música não precisa ser músico –- ele precisa é ENTENDER de música, transfigurando-se em alguém que possa servir de ponte entre o músico e seus ouvintes. E eu já conheci muito crítico que entende muito mais de música do que determinados músicos de cabeça-vazia e olhos injetados.
Todos os críticos são pentelhos/arrogantes? Toda generalização é burra. Julgar que uma pessoa qualquer, só porque exerce o trabalho de crítico, vá ser imediatamente um pentelho de carteirinha, é bobagem das grossas. Ou vá me dizer que você não conhece um pentelho que não seja crítico? Uma coisa não é pré-requisito para a outra. Não se deixe levar por meia-dúzia de críticos mal-humorados e que aparentemente não gostam de nada. Sei que muitos destes malas estão nos principais veículos de massa do Brasil e mesmo do mundo. Mas você precisa aprender a ignorá-los. Faça como eu e finja que eles não existem, que a página deles na revista é somente uma falha na Matrix.
Então…pra que servem os críticos? Para servirem como uma espécie de bússola, uma orientação, uma opção, mas nunca como verdade definitiva. É isso que os leitores precisam entender. Se você está lendo a MINHA crítica para um CD, saiba que ela está imbuída da MINHA opinião, que pode não ser necessariamente a sua. A diversidade de mídias existe para que você possa colher as opiniões mais variadas sobre qualquer tema. Internet, rádio, revista, jornal, TV, você escolhe onde encontrar suas opções de informação.
Se você costuma se identificar com as opiniões daquele crítico, você sabe que existe a possibilidade de gostar de alguma coisa que ele diz que é boa. Mas se o que acontece é o contrário, tenha em mente que você possivelmente não gostará daquela obra que o crítico diz ser excelente. Mas CUIDADO: ele pode surpreender você ao elogiar uma coisa que é realmente boa. De qualquer forma, não seja preconceituoso. Leia muito mais do que uma crítica sobre aquele CD recém-lançado ou sobre o filme da semana. No fim das contas, a opinião que mais importa é a SUA. Aprenda a formá-la de maneira sólida e não deixe que qualquer outra opinião contrária à sua abale o quanto você gostou (ou não) daquele CD, filme, livro, peça, exposição…
Seja o juiz de si mesmo. Você consegue.