Na semana em que comemoramos 20 anos de Procura-se Amy, obra máxima do cineasta independente Kevin Smith, a gente vai celebrar os independentes de todas as partes e de todos os cantos da cultura pop
“Ser independente é difícil pra caralho, cara”, diz Paulão, o vocalista das Velhas Virgens, antes da introdução de uma de suas canções no disco ao vivo Abre Essas Pernas, gravado em São Paulo no distante mês de Junho de 2001. Embora o frontman já estivesse meio BREACO, seu discurso tem uma puta relevância — afinal, estamos falando da maior banda independente do país, que montou uma enorme estrutura ao seu redor sem ter nunca assinado um contrato com uma grande gravadora.
“Tudo que tá acontecendo aqui tá sendo pago, direta ou indiretamente, pela gente”, continua ele. “E não custa pouco não. Mas é o seguinte: a gente não pode se deixar dominar pela porra do poder capitalista dos grandes meios de comunicação e das gravadoras. A gente tem que botar pra foder mesmo porque o meu pau é maior que o deles”.
Claro que o recado de Paulão foi ENTUSIASTICAMENTE aplaudido por seus fãs, ali, na beira do palco. Ele jogou pra galera. Mas deixando um pouco de lado os exageros etílicos, vamos lá: o cara tem muita razão. Ser independente é, sim, difícil pra caralho. A gente do lado de cá entende muito bem. Ser independente, muitas vezes, quer dizer não ter grana. Não ter editoras, gravadoras, produtoras para colocar uma grana no seu projeto. É só você e aquela ideia.
Mas ser independente não quer dizer abaixar a cabeça e pensar “putz, fodeu”, chorar num canto e fazer as contas das dívidas — quer dizer, não sempre. Ser independente é também ter coragem de levantar a cabeça e pensar “quer saber? Foda-se. Vou colocar esta merda na rua do meu jeito e que não me venham encher a porra do saco”.
Na melhor tradição do movimento do it yourself, do movimento punk, que gravava na garagem, prensava como dava, distribuía manualmente como podia. Que fazia zine, fazia cartas, fazia banquinha pra vender camiseta artesanal pintada à mão, fazia coletânea pra rachar entre as bandas, fazia rádio pirata pra mostrar o som que ainda não tinha Spotify ou Deezer que revelasse. O DIY que virou tradição também pra quebrada do rap, pra turma do metal, pra toda uma geração de quadrinistas...
Esta semana, o filme Procura-se Amy, que Kevin Smith dirigiu na cara e na coragem, peitando a Miramax e dizendo que ia rodar do jeito dele, com os atores que escolheu e que, se eles curtissem o resultado, aí iam poder distribuir, completa duas décadas de seu lançamento.
Goste você ou não do cara, acredite você ou não no hype que ele mesmo construiu ao seu redor, o que não dá pra dizer é que ele nunca colocou a mão na massa. Quando ele acredita, por mais que um estúdio não bote fé, o sujeito vai lá e faz do jeito dele. Tipo foi com O Balconista: ele vendeu parte da sua coleção de gibis, queimou os limites de mais de uma dezena de cartões de crédito, raspou as economias que estavam guardadas para a sua faculdade e ainda gastou o seguro de um carro que tinha perdido numa enchente, juntou US$ 27.575 e foi em frente.
Aqui no JUDÃO, vamos dedicar parte do nosso conteúdo dos próximos dias a celebrar a força dos independentes na cultura pop. Gente do mundo dos quadrinhos, do cinema, na música, da literatura, dos joguinhos, que não fica esperando cair uma fortuna do céu, vinda de alguém que milagrosamente descobriu o quanto eles são maravilhosos. Uma galera que prefere se mexer, que prefere ir lá e FAZER, que quer manter o controle criativo sobre suas obras por mais que isso signifique uma puta criatividade e quase nenhum CASCALHO.
É como diz a letra de Levanta e Anda, do Emicida: “irmão, você não percebeu que você é o único representante do seu sonho na face da Terra? Se isso não fizer você correr, chapa, eu não sei o que vai”.
Sabe quem também é independente, que rala PARA CARALHO e que, se deixa a peteca cair uma ou outra vez, continua fazendo, tirando forças da casa do caralho mesmo quando tá foda — e já esteve muitas vezes e sabemos que ainda vai ficar muitas outras mais? Sim, isso, nós aqui do JUDÃO. Não temos investidores bilionários botando grana no nosso trabalho, não tem nenhum portal transbordando acessos pra nóis, o dinheiro que entra de publicidade mal nos sustenta. Ah, cêis acharam que aqui era o mundinho dos sonhos, que era tudo fofo e meigo, só porque viajamos o mundo fazendo entrevistas, assistindo a filmes e coisas assim? Porra nenhuma. Mas a gente continua tentando fazer jornalismo, apurando, cruzando informações, questionando, sempre com opinião, nem sempre defendendo o lado mais fácil.
É assim que o JUDÃO roda, entendam de uma vez. Não há qualquer outro interesse no que fazemos, ainda que, lá no começo, a gente tenha tido a ideia de “dominar o mundo”. Não. A gente não precisa, a gente NEM QUER.
MAS, pra continuarmos rodando assim, pra gente ser um bando cada vez maior e mais diverso de fanáticos por cultura pop que fazem o conteúdo do jeito que a gente acha que é mais certo e não necessariamente do jeito que traz mais cliques, contamos com uma PUTA força de vocês lá no Apoia.se/JUDAOcombr. É financiamento recorrente a partir de 1 FUCKING REAL, cara. Um valor que com certeza não faz lá muita diferença pra vocês mas que, porra, faz uma diferença BRUTAL pra nós.
Porque, assim como as Velhas Virgens, tudo que a gente faz, ou faz por conta, ou faz na base da amizade. Todo esse conteúdo que vocês consomem de graça por aqui, custa uma grana pra ser feito. Custa tempo. Contribuindo, vocês ajudam a gente a mostrar, de uma vez por todas, que o nosso pau é maior que o deles. Ainda que seja um pau metafórico, que signifique “nosso tesão por fazer e por colocar a alma em conteúdos cada vez mais únicos, cheios de opinião e personalidade”.
Tá na nossa mão. E na sua também.
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