Superman VS. Muhammad Ali | JUDAO.com.br

Quando um dos maiores heróis de todos os tempos enfrentou aliens. E o Superman.

Existem nomes que transcendem uma mídia, um esporte. Tornam-se famosos, míticos, memoráveis. Ultrapassam qualquer barreira, indo além do real e do irreal. Este é o caso do boexador Cassius Clay, o campeão mundial Muhammad Ali, que se tornou tão importante para a cultura pop que conseguiu encontrar com ninguém menos que o Homem de Aço em Superman VS. Muhammad (All New Collectors Edition C-56), um clássico que foi relançado em edição de luxo pela DC nos Estados Unidos em 2010 e, depois, pela Panini por aqui.

O inusitado confronto aconteceu no final da carreira profissional de Ali, em 1978. Por reunir um personagem imaginário com um esportista importante, a HQ logo se tornou um clássico, o que foi ressaltado pelo fato dela nunca mais ter sido republicada, o que aconteceu por conta dos direitos de imagem de Ali e pela capa com uma plateia recheada com 172 famosos, celebridades, quadrinistas e executivos da (na época) Warner Communications. Há gente como Kirk Alyn, Pelé, Andy Warhol, Cher, Frank Sinatra, Cary Bates, Christopher Reeve, Lucille Ball, Jimmy Carter, Noel Neill e Don King; personagens como Oliver Queen, Hal Jordan, Dick Grayson, Barry Allen, Lex Luthor, Diana Prince e, claro, o Batman; e quadrinistas como Jerry Siegel, Joe Shuster, Walt Simonson, Julius Schwartz, Paul Levitz e o próprio autor Neal Adams.

Essa capa, aliás, foi refeita por Neal Adams depois que a DC Comics considerou a original, de Joe Kubert, muito “severa e séria”, com uma plateia ~normal de uma luta de boxe.

Além de ser considerado o maior boxeador de todos os tempos, Muhammad Ali ficou conhecido também por suas posições políticas, como quando se negou a servir o Exército dos EUA na guerra do Vietnam. “Por que eles me pediriam pra colocar um uniforme e viajar pra dez mil milhas longe de casa e jogar bombas e balas em pessoas marrons enquanto os chamados Pretos em Louisville são tratados como cachorros e tem direitos humanos negados?”, justificou ele que, por isso, acabou sendo condenado à prisão e suspenso do esporte. “Se eu pensasse que eu iria para a guerra e trazer a liberdade e igualdade ao meu povo, eles não teriam de me convocar, eu iria amanhã. Mas eu tenho de obedecer as leis da terra ou as leis de Allah. Eu não tenho nada a perder por ser fiel ao que acredito. Então eu vou pra prisão. A gente já está na prisão por quatrocentos anos”.

Ali também protagonizou lutas histórias, como a Rumble in the Jungle, contra George Foreman, na na qual retomaria os cinturões da WBA e da WBC perdidos pra Joe Frasier e que é, pra muitos, a maior luta da história — e foi realizada no ZAIRE.

Superman VS. Muhammad Ali

Com todo este histórico, seria interessante levar o Superman para a realidade de Ali, mostrando ao Azulão — e aos leitores de HQ da época — as dificuldades do povo e problemas como o racismo. A equipe criativa escolhida pela DC, inclusive, seria ótima para este direcionamento. Neal Adams e Denny O´Neil já tinham feito algo neste sentido nas páginas da revista Green Lantern, na fase na qual o Lanterna Verde dividia a sua própria revista com o Arqueiro Verde. Mas, na introdução da republicação, Neal Adams, que desenhou e adaptou o roteiro de O’Neil, deixa claro que houve restrições políticas, tornando necessária, inclusive, a aprovação da HQ pelo honorável Elijah Muhammad, mentor de Ali e líder da Nação do Islã. Sendo assim, foi decidido que Muhammad Ali iria para o contexto do Superman, enfrentando ao lado do Azulão uma RAÇA ALIENÍGENA.

É, isso. A história, inclusive, abre com um passeio de Clark Kent, Lois Lane e Jimmy Olsen pela periferia, onde encontram Ali jogando basquete. De repente aparece um ET de uma raça chamada SCRUBB SURGE, alegando estar acompanhado de uma grande armada para destruir a Terra. O Supinho logo se junta à brincadeira e o alien decreta: ambos devem decidir quem é o campeão do nosso planeta e, em seguida, enfrentar o campeão deles. Depois que o nosso maior campeão fosse subjulgado, o nosso povo seria humilhado e nós, como uma raça naturalmente guerreira, não ameaçaríamos mais os scrubbs, como eles temiam que acontecesse. Simples? Até que sim.

Apesar de fantasiosa, o crossover rende grandes momentos, como o treinamento de Kal-El (sob a luz de um Sol vermelho, para tirar seus poderes) com Ali, que ensina os principais golpes do boxe. Em pouco tempo fica claro que, em condições iguais, Ali tem muito mais técnica para lutar do que o kryptoniano. A luta derradeira entre os dois também é histórica.

Superman VS. Muhammad Ali

Pra quem lê hoje, há um certo ar de ingenuidade na forma que as ações vão acontecendo, além de alguns errinhos de continuidade, que ficam claros no “tira e coloca” da capa do Azulão durante o treinamento. Também pode ser estranho ver a caracterização do Superman da década de 70, quando o personagem era muito mais forte que hoje, no nível de um Deus, praticamente. Além disso, Clark Kent, Lois Lane e Jimmy Olsen eram funcionários da Rede Galáxia de Televisão, já que o Planeta Diário havia sido comprado pelo Sistema Galáxia de Comunicação, do magnata da mídia Morgan Edge.

No clímax da HQ, o discurso de Ali sobre enfrentar o alien no ringue (com o destino da Terra em jogo), tanto pelo texto como pela forma que foi diagramado e desenhado, tornam o personagem ainda maior, mesmo em relação a um cara capaz de parar explosões, destruir naves e acabar com exércitos inteiros. “I’m glad I got the stage set! All these suckers are thinkin’ this is a tough fight! I’m gonna give ‘em all a lesson! I’m gomma whup ‘im an’ spank ‘im! I’m the greatest! I’m the king!!”, diz o lutador, do seu jeito característico de falar — que, se traduzir pro português, se perde complemente.

O verdadeiro herói é Muhammad Ali, que supera suas limitações, suas dificuldades, e faz a diferença. É isso que faz o personagem um mito.