Eu tinha por volta de 10, 11 anos de idade quando séries como Jaspion e Changeman começaram a ser exibidas por aqui, na finada e saudosa Rede Manchete. E confesso que uma das coisas que eu mais curtia nesta safra de tokusatsu que tomaram conta das nossas telinhas eram as músicas de abertura.

Porra, Cybercops, Flashman, Maskman. Sério. Era alucinante. Ainda é, na real, porque invariavelmente estas canções vão parar no meu iPod. Eu não entendia (e ainda não entendo) picas do que os caras estavam cantando em japonês. Mas a pegada, o feeling, pombas, não tenho qualquer dúvida de que ajudaram a plantar a semente do fã de hard rock/metal melódico em mim – já que estes são gêneros que ainda são enormes no Japão. O mesmo acabou acontecendo com o paulistano Ricardo Cruz, que tem mais ou menos a mesma idade que eu e que também foi regado à base de grupos de heróis multicoloridos, monstrengos de espuma, robôs gigantes e explosões em pedreiras abandonadas.

A grande diferença é que eu virei publicitário e jornalista especializado em cultura pop, ainda um fanático por rock mas com experiência zero cantando ou tocando qualquer instrumento. E o Ricardo se encontrou no mundo da música e, diabos, foi pro Japão e tornou-se parte do cultuado JAM Project, supergrupo formado por cantores de animes e séries de TV. ;)

Aos 17 anos, fascinado pela cultura japonesa, Ricardo partiu para a Terra do Sol Nascente em um intercâmbio, com o objetivo de aprender japonês. Logo descobriria o quão grande é por lá o mercado fonográfico para as chamadas animesongs. Quando voltou, aproveitou a fluência em inglês e japonês e foi trabalhar como tradutor, como jornalista da revista Herói e até ajudou a plantar as sementes do primeiro Anime Friends, em 2003. Foi lá que conheceu ninguém menos do que Hironobu Kageyama, voz de Cha La Head Cha La (abertura de Dragon Ball Z) e da canção-tema dos Changeman. E, claro, um dos integrantes do JAM Project.

Não demoraria até que Cruz mandasse suas fitas-demo pra Kageyama, gravadas meio que em tom de brincadeira, os dois começassem a conversar e, ka-boom!, surgisse o convite para integrar a banda, ainda que de maneira semi-integral (já que o Ricardo agora aqui no Brasil). Isso já faz 10 anos. “Foi um processo meio surreal, porque comecei como (e ainda sou muito) fã deles. Aprendi bastante durante esse tempo”, conta Cruz, em papo exclusivo com o JUDÃO. “Quando comecei, caí de paraquedas no centro de uma estrutura enorme lá no Japão, fazendo shows grandes, etc. Tinha muito pouca experiência em ser artista ainda. Foi complicado, mas muito bom porque precisei crescer relativamente rápido pra dar conta do recado”.

Além das viagens ao Japão e apresentações eventuais ao lado de Kageyama, Masaaki Endoh (Street Fighter Victory), Hiroshi Kitadani (One Piece), Masami Okui (Slayers, Yu-Gi-Oh) e Yoshiki Fukuyama (Macross 7), gravou singles como Stormbringer, Transformers EVO, Waga Na wa Garo e Mirai e no Chikai. Aqui no Brasil, foi responsável pelas versões em português dos temas de abertura de Hunter x Hunter e Os Cavaleiros do Zodíaco: Hades – A Saga do Inferno. Esta última, aliás, lhe valeria um espaço ao lado de Rodrigo Rossi, Edu Falaschi e Larissa Tassi na turnê Cavaleiros in Concert, reunindo todos os cantores nacionais de temas dos desenhos de Seiya e sua trupe.

A grande novidade, no entanto, é a sua recém-iniciada carreira solo, gravando canções próprias pela primeira vez em dez anos de trajetória musical. “Acho que abrir um caminho paralelo de material autoral vira uma necessidade artística natural depois de um tempo fazendo música em grupo”, opina Ricardo. O primeiro filhote desta nova fase é o EP On the Rocks, que traz três músicas mais as respectivas versões instrumentais e cuja versão física é vendida apenas em seus shows.

“Compus as três, música e letra. O arranjo foi criado pelo produtor Carlos Tsukada, que também cuidou de toda a gravação dos instrumentos”. A ideia foi mesmo prestar homenagem às séries de super-herói japonesas, que foram a base do seu interesse pela cultura pop japonesa. “Se isso não tivesse passado na TV, não teria feito intercâmbio pro Japão no colegial e, consequentemente, nunca conheceria os artistas com quem trabalho hoje”. A sonoridade é um verdadeiro tributo ao estilo de som mais clássico das séries. E tudo obviamente cantado em japonês. :D

Só que Ricardo não planeja parar por aí. Este ano, ele ainda pretende lançar um disco completo, mais longo, no qual já está trabalhando atualmente. “Quero fazer duetos com alguns veteranos desse gênero lá do Japão”, confessa. “O projeto ainda está tomando forma na minha cabeça”. Mas, desta vez, talvez tenhamos pequenas surpresas – com um leque musical mais aberto. “Não sei se já é hora de fazer isso. Mas quero arriscar uns flertes com outros universos musicais de que eu gosto”. Ele conta que estava bolando meio brincando, meio sério, com um amigo produtor sobre como ficaria uma versão em japonês de Iracema, do Adoniran Barbosa. “Mantendo a levada de samba, mas com um arranjo mais moderno. Tenho pirações desse tipo o tempo todo. Uma hora sai”.

Enquanto isso, o que deve estar prestes a sair é o clipe da canção On the Rocks, produção caprichada que deve ter uma cara meio Jaspion. “Tinha essa ideia faz muito tempo: fazer uma música enérgica totalmente inspirada nos temas abertura típicos de tokusatsu e, como clipe, gravar numa pedreira como se estivesse no meio de um episódio do Jaspion!”. Abaixo, você confere um teaser do vídeo:

A gravadora do JAM Project, a Lantis, adorou a ideia e patrocinou a produção – e com a ajuda da Yamato, do Anime Friends, Ricardo conseguiu garantir a participação do ator Hiroshi Watari (o Boomerman do Jaspion e também estrela de Sharivan e Spielvan). O líder dos vilões vai ser o youtuber Cauê Moura. “O projeto cresceu muito e virou uma produção grande. Filmamos em Barueri, numa pedreira impressionantemente parecida com a que os japoneses usavam. Vai ter robô gigante e tudo. Estou superansioso pra ver isso pronto”.

O lançamento está programado para este mês, via site oficial e canal oficial do YouTube.