A viagem espacial sonora e retrô do Uridium | JUDAO.com.br

Trio recorre a sintetizadores antigos para transformar em música uma loucura com gosto de anos 1980 e inspirada na série Cosmos, de Carl Sagan

“Um grupo de música eletrônica à moda antiga que faz músicas inspiradas na imensidão do Cosmos, nos mistérios do Universo, com sintetizadores analógicos ou que simulam o modo de operação dos analógicos”. É desta forma que um dos integrantes do Uridium, Marcus Garrett, descreve o grupo, atendendo à minha provocação de descrevê-lo em duas linhas para alguém que não saberia absolutamente nada sobre ele. Logo depois, ele se corrige, brincando: “Droga, deu três linhas!”.

O trio acaba de lançar, pelo igualmente recém-lançado selo LowFi Records, seu álbum de estreia, Beyond the Shores of the Cosmic Ocean. Totalmente independente, o disco é descrito como o resultado de uma brincadeira que rapidamente virou coisa séria. Ou quase isso.

“Desde sempre gostamos de música eletrônica e, em especial, de sintetizadores. Compramos alguns equipamentos e quisemos, além de incomodar a família e os vizinhos, produzir algo de positivo que saísse daquele monte de teclados, cabos e gravadores”, revela Marcus. “Entre 2010 e 2011 decidi chamar alguns amigos e começamos a brincar, de maneira ocasional, com as ideias. Demorou... Depois de quatro anos, de alguns tropeços e de algumas demos, o disco saiu da forma como queríamos”.

Os amigos, no caso, são Richard Valdivia, um estudante de piano e amante de música erudita; e Mauro Berimbau, apaixonado por videogames e cuja principal influência são justamente as músicas dos games (principalmente as da era Mega Drive e Super NES). Considere ainda que Garrett é também um fanático por games e computadores antigos, autor do livro 1983: O Ano dos Videogames no Brasil, e você vai entender o quão retrô é a sonoridade do Uridium.

Capa do CD UridiumA começar pelo nome do grupo – que vem de um jogo de nave que existia para alguns microcomputadores dos anos 1980, hoje antigos, em especial o ZX Spectrum e o Commodore 64. “Era bem divertido e muito desafiador, eu gostava bastante apesar de jogar mal. Além disso, Uridium lembra o nome de um elemento químico especial, o Iridium (Irídio), utilizado em geradores termoelétricos de radioisótopos (os RTG), como os usados nas sondas espaciais da NASA, a Voyager e a Pioneer, para encapsulamento do combustível nuclear”.

As inspirações dos caras são muitas, fartas e variadas: Jean Michel Jarre, Vangelis, Kraftwerk, Giorgio Moroder, Alan Parsons, Tangerine Dream, Isao Tomita, Jan Hammer, Wendy Carlos e outros artistas. “A outra grande inspiração óbvia, que vem da temática espacial, é a série Cosmos, de Carl Sagan”, conta Garrett. “Quando moleque, eu não conseguia desgrudar os olhos da TV quando o programa começava, fiquei apaixonado pelo Universo e pelos seus mistérios, foi um caso de amor à primeira vista. O título do disco, bem como os títulos de algumas das músicas, foram tirados diretamente da série”.

Uma coisa bem divertida é que, à exceção do Richard, nenhum dos outros dois estudou música de maneira mais “formal”. O jeito foi meter as caras. “Ficamos por horas e horas em cima dos sintetizadores até que as coisas começam a surgir e a fazer algum sentido”. Na real, cada um ia gravando em sua própria casa, com seu próprio equipamento, e eles iam trocando à distância e lapidando. “Foi um caos comparável ao do Big Bang”, brinca Marcus, mantendo a temática espacial.

“Tínhamos que segurar o Mauro, por exemplo, porque ele vinha com ideias para 500 músicas. O Richard, como se fosse a coisa mais trivial do mundo, abriu a partitura em minha casa e fez a belíssima versão sintetizada de uma peça do compositor Robert Schumann (Lembranças da Terra), talvez a música mais bonita e delicada do disco”. No final, admite, quem precisou dar jeito na coisa toda, fazer com que o disco tivesse sentido, foi o engenheiro de som e amigo Eduardo Avellar, do Avellaria Studio, que remasterizou o álbum depois de muito trabalho.

Material em mãos, eis que entrou em cena outro amigo: o também músico Eric Parton, que havia acabado de inaugurar o seu selo, o LowFi Records, e precisava compor catálogo, buscando artistas novos para o portfólio.

“Aconteceu conosco a velha máxima de juntar a fome com a vontade de comer. O Eric fez tudo, registrou as músicas para nós, fez a divulgação, acreditou no trabalho...”. A venda, no entanto, está sendo feita diretamente por eles – para saber tudo, basta clicar aqui.

Uma coisa importante para quem for ouvir o disco: os caras mandam avisar que a sequência das músicas não é aleatória. A intenção era mesmo a de acompanhar a jornada de uma viagem ao espaço, começando pelo deslumbre e pela poesia (The Ancient Wish), seguindo com a ciência entrando em cena (Billions & Billions), a decolagem (Blast Off!), a era espacial e as primeiras sondas (Space Age e Voyager) e vários outros “acontecimentos” ao longo do caminho.

Marcus Garrett em foto de 2011“Até que um dos astronautas, o Major Thomas (nome sugestivo, não?), encontra um certo monolito e acaba se transformando em algo, em algo além...”, sugere Marcus. “Mas chega de spoilers, vão ouvir o disco!”.

Embora um segundo álbum já esteja nos planos dos caras, intitulado provisoriamente de Mergulho no Hiperespaço, eles não são músicos profissionais. Logo, shows são uma realidade complicada.

“Não vivemos disso, cada membro do grupo tem seu trabalho, seu day job”, confessa Garrett. “Mas já vamos ficar felizes se soubermos que conseguimos fazer alguém sonhar com nossas músicas”.

Ele afirma que este é o objetivo do Uridium. “É tentar transpor para a música o deslumbre que sentimos quando olhamos para o Universo, para os quasares, os pulsares, as galáxias, as nebulosas, as estrelas, os buracos negros”, filosofa.

“É aquele calafrio que sentimos, que percorre todo o corpo como se houvesse um chamamento, um chamamento para as estrelas. Você já sentiu isso?”.

Eu já. E você? ;)