É, você mesmo tá fazendo isso. Sem perceber. E são aqueles idiotas que você diz que odeia. Pare de fazer o jogo deles DE UMA VEZ POR TODAS.
Stop making stupid people famous. A frase, cuja origem real oficial é de fato desconhecida mas tem uma dezena de teorias diferentes sobre seu surgimento, virou camiseta, adesivo, meme, o pacote completo. No geral, as pessoas a usam pra se referir à cultura das celebridades instantâneas, do chamado consumo rápido e imediato do finado Ego, aquele time que o TMZ e o TV Fama adoram ver e fazer acontecer.
Quando começa a temporada de reality shows, em especial os de confinamento, e um Big Brother e/ou A Fazenda se tornam mais uma vez mania nacional, inevitavelmente a expressão reaparece, geralmente seguida de “vai ler um livro”. Já falamos sobre isso aqui, aliás, mas este não é o ponto.
“Pare de tornar pessoas estúpidas famosas”, é o que diz a expressão, que cabe PERFEITAMENTE no atual contexto das redes sociais, igualmente cheia de celebridades instantâneas, algumas delas com discursos machistas, racistas, fascistas. Mas aí, senhoras e senhores, não é o caso de apenas usar a frase como ACUSAÇÃO e sim como REFLEXÃO. Porque você, que acha esta ou aquela figura absolutamente deploráveis, é JUSTAMENTE quem mais ajuda a torná-la ainda mais RELEVANTE. É, guarda aí esta última palavra.
Ó só, vou contar uma coisa pra vocês. Todas as redes sociais, todas elas mesmo, Facebook, Twitter, Instagram, a porra toda, funcionam à base de um treco chamado “algoritmo”. O Google também, aliás. O YouTube, até.
Mas o que é isso, este tal de algoritmo? Em termos leigos e práticos: é um robozinho que aprende com você. Que entende do que você gosta e, portanto, te entrega mais conteúdo sobre aquele assunto e produzido por aquela pessoa / página / jornal / revista, tanto faz. E quanto mais gente falando sobre aquele assunto, mais o tal do robôzinho entende que aquilo é (olha ela aí) relevante e ajuda a passar a parada ainda pra frente. Se o algoritmo entende que aquilo é relevante, seja uma marca ou uma pessoa física, que tem um monte de gente compartilhando, comentando, marcando, ele vai AMPLIAR o alcance. Ou seja: mais e mais gente vai ver aquilo.
Algoritmos, pelo menos até o momento, não entendem ironia (ou não do jeito que deveriam, hehe). Não entendem se você tá comentando e/ou compartilhando alguma coisa, mas com um tom de crítica, dizendo “olha que bosta este cara falou”. Não é assim. Algoritmos só entendem que você é MAIS UM comentando e compartilhando aquilo. UM NÚMERO. Logo, pra você, deve ser um bom conteúdo. RELEVANTE. Logo, se você, eu, meu vizinho, todo mundo tá compartilhando, todo mundo deveria ver.
A explicação que eu dei é BEM simplista, mas creio que seja BEM lógica, certo? Legal. Então. Ela serve como um aviso pros amiguinhos. Quer dizer, aviso não, eu diria. Serve como um pedido...
Por favor, parem de compartilhar conteúdo bosta
Sabe aquele pastor que falou um caminhão de merda sobre a Disney estar “incentivando as crianças a se tornarem homossexuais” e propondo um boicote? Então. Ele gravou um vídeo sobre isso tem um tempo, não sei se vocês lembram disso. E este vídeo apareceu CINCO vezes na minha timeline em menos de 24 horas. Mas com gente criticando o cara, óbvio, ninguém defendendo. Ufa, ainda bem. Minha bolha tá limpinha. Né…? Não, não, ainda bem não.
Porque vocês tão dando visualização pro diacho do vídeo do cara. E cada vez que colocam o link no Facebook pra dizer “que absurdo o que este cara tá falando, vejam só”, o robôzinho não entende que você tá puto da vida. Mas sim que você acha este vídeo interessante o bastante pra compartilhar com os seus amigos, familiares, seguidores. Logo, deve alcançar ainda mais gente.
É isso que este pastor quer. Mais e mais visualizações. Mais e mais gente falando dele. Porque quanto mais gente falar dele, mais gente vai saber sobre ele e vai ver seus vídeos, seus posts no Facebook, seus tweets pavorosos cheios de ódio. Mais o YouTube vai recomendar o vídeo dele, olha só.
É isso que uns e outros liberais revolucionários querem. É isso que querem aqueles velhos roqueiros, o “comediante” de stand-up em sua jornada contra o “politicamente correto”, o filósofo e colunista “polêmico” em busca de cliques. É isso que querem até mesmo determinados políticos atualmente no poder ou em campanha franca e direta pra tentar alcançar seu lugarzinho na Câmara, no Senado, no Planalto. Manda lá uma frase contra estas “malditas feministas” ou “os comunistas que estão dominando o Brasil” e PRONTO. “Fale bem ou fale mal, mas fale de mim”. A frase da época da minha e da sua avó continua valendo.
Perceberam, aliás, que eu nem sequer CITEI os nomes destas pessoas aqui? Sabe por qual motivo? Porque não quero ser mais um a ajudar os caras a ganharem força em mecanismos de busca. Eu não falo e nem sequer vou falar os nomes deles. Quanto mais menções a eles, vejam vocês, mais o Google e similares entendem que eles são RELEVANTES e lhes dão mais e mais destaque.
Vamos falar. Vamos criticar. Vamos discutir. Vamos problematizar. Vamos botar a boca no trombone. Mas sem ajudar a dar visibilidade para esta galera e seu afiadíssimo discurso de ódio.
O que eu tô querendo dizer com isso? Vamos lutar contra o racismo, o machismo, a intolerância. Vamos espalhar a porra do amor, vamos compartilhar notícias lindas, iniciativas boas e fodas... Putz, VAMOS. Só vamos. Vamos continuar criticando? Claro que vamos, é importante pra caralho, não dá pra bancar a Poliana e viver só de glitter, confete e serpentina (seria lindo, confesso). Tem um monte de merda acontecendo no mundo, não vivemos numa realidade fofa. Mas é hora de fazer isso com cada vez mais inteligência. Para que a gente não jogue o jogo que eles querem que joguemos.
E, PELAMORDEBAST, comece a compartilhar pra caralho, loucamente, como se não houvesse amanhã, aquilo que você acha FODA. O projeto legal demais que tem um cara fazendo pra acabar com a fome. A mina fodástica que desafiou um ambiente machista e conseguiu emplacar um aplicativo que promete mudar o mundo. E mesmo aquele site que tá fazendo a diferença, dando murro em ponta de faca enquanto desafia as obviedades do mercado e perde campanha de banner, aquela história.
É assim que você faz a parte pra mostrar ao tal do algoritmo o que (e QUEM) merece atenção ou não. “Pare de tornar pessoas estúpidas famosas” não se refere apenas às pessoas intelectualmente incapazes, que certos sujeitos automaticamente chamariam de “burras” pra se colocarem automaticamente do outro lado do espectro, como “inteligentes”. Nada disso. As pessoas “estúpidas” da frase são, principalmente, aquelas brutalizadas, grosseiras, a quem falta bom senso ou discernimento. Tá lá no dicionário, pode ver.
Parte da responsabilidade em tornar famosas ESTAS pessoas estúpidas é SUA.
Sei que é difícil pacas. Juro. Às vezes você fica puto, indignado, perde a cabeça, quer xingar, espalhar pro mundo. Eu entendo. Já passei por isso. Continuo passando, aliás. Não tiro a razão. É válido. Mas sabe aquela coisa de “o mundo mudou”? Pois é. Deste OUTRO lado, também mudou BEM.
A tecnologia também tem suas regras. E temos que tomar cuidado para que estes caras não ganhem ainda mais armas do que já têm. E que você, que se opõe a eles, não se torne seu principal divulgador.
Era isso. ‘Bora voltar à programação (entendeu o que eu fiz aqui?) normal.