Amazon Prime está retirando do catálogo filmes de cineastas independentes | JUDAO.com.br

De oásis para produções fora do circuito a pesadelo dos pequenos criadores em um estalar de dedos

Lembra daquela época em que acreditávamos que os serviços de streaming seriam o nosso destino ideal não apenas para o blockbuster da vez, mas também para aquele filme superinteressante que você não conseguiria de alguma forma ver no cinema? Pois bem, bons tempos, né? Mas, segundo o Hollywood Reporter, a Amazon está retirando discretamente do seu catálogo filmes que o serviço não acredita serem “atraentes” para os assinantes. E adivinha qual é o perfil aqui?

O roteirista Mark Bomback (da série Umbrella Academy) também acreditava neste potencial para conhecer histórias diferentes de novos diretores e escritores — isso aconteceu quando ele descobriu o trabalho do cineasta Alejandro Adams (Canary, Amity) no Prime Video da Amazon. Além de ser apresentado a um novo filme que ele não acharia facilmente nas comercialmente disputadas programações das salas de cinema, essa busca acabou aproximando os cineastas, agora trabalhando juntos em um projeto mais ambicioso. “Foi como encontrar um diamante na praia”, disse Bomback. “Nada disso teria acontecido sem a Amazon”, completa.

Portanto, foi uma imensa surpresa para o cara quando ele descobriu que três dos quatro filmes de Adams foram retirados da plataforma de streaming em 2019. E esse não é um caso isolado, porque vários cineastas emergentes também constataram o mesmo problema.

Todos esses filmes chegaram à Amazon através de uma plataforma de autodistribuição intitulada Prime Video Direct, lançada em 2016. Esse programa ofereceu aos cineastas de todos os tamanhos a possibilidade de terem seus filmes distribuídos em uma plataforma de longo alcance.

Com o Prime Video Direct, um cineasta iniciante ou pouco conhecido poderia transmitir seus filmes em pé de igualdade com produções de financiamentos muito maiores – ou com qualquer tipo de financiamento. Em alguns casos, os próprios cineastas faziam upload dos vídeos, enquanto outros trabalharam com distribuidoras de filmes que usam o programa para fazer uma divulgação mais ampla do seu catálogo. É a terra das oportunidades para qualquer um que quer que seu filme chegue ao público certo, por menor que seja.

Esse tipo de iniciativa é um dos maiores orgulhos da Amazon, que sempre gostou de frisar que sua plataforma de vídeo abre espaço para criadores independentes — e a empresa até chegou a afirmar que pagou dezenas de milhões de dólares em direitos apenas no primeiro ano de funcionamento do Prime Video Direct.

Recentemente, aliás, a Amazon começou a patrocinar seu próprio festival de curtas-metragens, disponibilizando uma grana aos vencedores e com promoção garantida. “O Prime Video oferece aos criadores a oportunidade de se conectar com o público em todo o mundo”, disse uma porta-voz da empresa em um comunicado. “Ficamos felizes em ajudar os criadores a apresentar sua visão aos membros Prime e ficamos animados em ver como os clientes respondem a um conteúdo único e atraente”.

Embora o Prime Video Direct tenha recebido comparações com o YouTube por causa da tal autodistribuição, a Amazon diz que avalia regularmente os materiais disponíveis no Prime. Basicamente, todos os títulos podem ser removidos se não forem vistos por uma parte considerável de assinantes. E é aí que a porca torce o rabo.

De acordo com a Amazon, os cineastas podem conferir todos os detalhes sobre o desempenho dos filmes. “Os provedores de conteúdo têm acesso a uma variedade de métricas de desempenho que os ajudam a entender como os membros Prime respondem ao seu material”, continuou o comunicado. “Avaliamos continuamente nossas ofertas para garantir que estamos entregando o máximo de valor aos nossos membros Prime e, como resultado, ocasionalmente removemos títulos do Prime Video que nossos clientes não consideram atraentes.”

Mas, como você já deve imaginar, aparentemente, os cineastas não sabem exatamente QUAIS números precisam ser atingidos para ser mantido no serviço. No fim, qual é a nota de corte para ser considerado “atraente”, conforme define a Amazon? “É desanimador porque os filmes ESTAVAM sendo vistos”, diz o cineasta Scout Tafoya, que teve três filmes de baixo orçamento retirados do Prime Vídeo, incluindo o drama House of Little Deaths, que conta a história de profissionais do sexo na Filadélfia.

Mesmo que a Amazon afirme ter boas razões (comerciais) para fazer as remoções, os criadores dizem que a empresa não é exatamente transparente sobre isso. Apesar de Adams reconhecer que seus filmes são “desafiadores”, ele ficou chocado quando recebeu da empresa a notificação sobre a retirada do conteúdo por não atender às suas “expectativas de qualidade do conteúdo do cliente”. Então a questão é a qualidade questionável a partir de feedbacks dos assinantes ou a falta de interesse no material?

Mesmo que a plataforma pague valores BEM baixos pelos filmes disponíveis – o Prime Vídeo compartilha entre 4 e 10 CENTAVOS a cada hora que um título for visto nos EUA -, esse espaço era importante para CRIAR um público que os conheça e se interesse por seus materiais, assim como foi com Bomback.

Embora eles possam distribuir em outras plataformas, como o Vimeo, os criadores afirmam que o Prime Vídeo oferece uma visibilidade importante para o crescimento de suas carreiras. Com uma plataforma acessível, se torna mais fácil mostrar seu trabalho para atores e produtores e convencê-los da sua capacidade. Basicamente, acabaram com a possibilidade do público descobrir esses filmes e da indústria os enxergar para um eventual salto.

Assim como os grandes estúdios, as plataformas de streaming também lidam com as dores do crescimento neste mundinho chamado “capitalismo”. Quanto mais essas empresas crescem, mais podem recorrer a projetos “mais confiáveis”, apostando em nomes já estabelecidos. Além de criar um sistema de codependência, o cineasta ainda precisará lidar com um vínculo passageiro que pode ser quebrado quando o serviço quiser.

Atualmente, existe uma campanha no Change.org que pede que a Amazon devolva essas produções para o serviço, mas não está claro QUANTOS cineastas tiveram seus filmes removidos do Prime. Para Linda Nelson, fundadora da distribuidora independente Indie Rights, os diretores devem começar a explorar ao máximo todas as oportunidades possíveis para garantir que seus filmes sejam vistos, ainda que isso signifique rever estas parcerias...

Então, se você está esperando para ver aquele filme independente disponível na Amazon (ou, vamos lá, em QUALQUER plataforma de streaming), é bom correr antes que ele suma.