Diário JUDÔNICO da Mostra: Dois Dias, Uma Noite | JUDAO.com.br

E lá vamos nós para o segundo dia da 38.ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo!

Dia corrido, esse segundo, com três filmes e um espaço de 1,1 km entre uma sala de exibição e outra, para percorrer em 15 minutos! Pois é, nunca me arrependi tanto de ter abandonado a academia em favor da Internet, hehehe. :)

A maratona desta sexta-feira, 17/10, começou cedo com a sessão até que tranquila de um western alemão, O Vale Sombrio (Das Finstere Tal). Um belo faroeste à moda antiga, com influência direta dos clássicos intimistas, como Era Uma Vez No Oeste, mas que também tem os seus momentos-pancadaria a la Django Livre. Neste longa, Sam Riley (de Control) é um andarilho que, lá pelos idos de 1880, chega a um vilarejo alemão pedindo abrigo durante o inverno, trazendo consigo uma máquina do demônio chamada “câmera fotográfica” e um pouco de dinheiro. Logo, o camarada revela-se uma máquina de matar sedenta por vingança... Uma história simples, bem filmada, com uma edição de som SENSACIONAL, que não vai marcar a vida de ninguém mas que vale o ingresso – por sinal, O Vale Sombrio venceu várias categorias do German Film Award (o correspondente ao Oscar da Alemanha), além de ser também o indicado pelo país para representá-lo na próxima edição do Academy Awards.

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O Vale Sombrio

Na sequência, vamos logo para a primeira fita ruinzinha que eu peguei nessa escala. O Idiota (Durak) é um drama russo que narra a história de um estudante de engenharia que também é funcionário do governo, e que todos insistem em tratar como um mané só porque o sujeito é íntegro em um ambiente dominado por gaviões. E eis que o cara descobre que um prédio na periferia, habitado por 820 pessoas paupérrimas e que representam “a escória da sociedade”, possui uma ruptura que causará um desmoronamento em questão de horas. E como convencer a prefeitura, que está mais preocupada com seus próprios interesses, de que é preciso fazer algo com urgência? A ideia é promissora, mas a fita está longe de ser. O elenco é patético, os diálogos são tenebrosos de tão melodramáticos e a direção, de um camarada chamado Yuriy Bykov, prioriza os momentos melôs com uma musiquinha edificante enquanto o cara fala “não importa se eles são bandidos, mas eles também são gente!”. Em vários momentos, tive a sensação de que o roteiro era escrito pela Glória Perez. :(

Foi nesta sessão também que presenciei um problema pontual, mas presente, nas edições da Mostra: O Idiota não foi comprado por nenhuma distribuidora, portanto sua exibição apresentava legendas fixas em inglês na película e legendas eletrônicas em português projetadas por uma equipe técnica durante a sessão. Não houve cinco minutos em que a legenda em português estava sincronizada com o que era dito na tela, e em vários momentos ela simplesmente sumia. Depois de 40 minutos de filme, desisti das legendas em português e me concentrei nas legendas fixas em inglês – se alguém ali na sessão não entendia inglês, das duas uma: ou se lascou, ou aproveitou para tirar o sono atrasado. É o que eu faria, já que o filme estava ajudando muito. :)

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Dois Dias, Uma Noite

O último filme, e o melhor do dia, é o impressionante drama franco-belga Dois Dias, Uma Noite (Deux Jours, Une Nuit), indicado pela Bélgica a concorrer ao Oscar, que segue à risca a tradição de seus diretores, os irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne, de contar histórias simples do cotidiano, com recursos mínimos de técnica (tanto que nem há trilha sonora), metragem reduzida, mas muita profundidade emocional. Não foi difícil se emocionar com a história de Sandra (uma luminosa Marion Cotillard), que descobre que seus colegas de trabalho foram forçados a escolher entre ela e um gordo bônus, o que a faz percorrer o tempo do título entre as casas de cada um deles para convencê-los do contrário e evitar sua própria demissão. Indicado à Palma de Ouro no último Festival de Cannes, Dois Dias, Uma Noite já tem data de estreia no Brasil (30/10) e é muito indicado a quem curte um cinema intimista, com concentrado no poder da trama e na poderosa atuação de seu elenco. Mas leve uma caixa de lenços e não tenha medo de se descabelar! Metade dos hipsters presentes na sessão fizeram o mesmo, de verdade. Inclusive eu. Hehehe!

Outros filmes importantes do dia 02: Leviathan, suspense russo de Andrey Zvyagintsev (O Retorno) vencedor do prêmio de Melhor Roteiro em Cannes e Melhor Filme no Festival de Munique; Horas de Verão (França), belo drama de Olivier Assayas com Juliette Binoche no elenco; Falstaff – O Toque da Meia-Noite (França/Espanha), drama shakespeariano de 1965 comandado por ninguém menos que Orson Welles; e o início das apresentações especiais em homenagem a Pedro Almodóvar (disso, eu falo nos próximos capítulos deste diário).

E a lição que fica deste segundo dia: ao entrar em cada sala de exibição, evite sentar atrás de uma poltrona ainda vazia. Como rege a Lei de Murphy, na sua frente sentará um cabeção que certamente ficará entre a sua visão e as legendas do filme... :(