Parte 05 – Uma Comic Con é, também, um momento para comprar colecionáveis de todos os tipos. Por isso, o JUDÃO foi avaliar como foi essa experiência na CCXP
Quarta-feira de San Diego Comic-Con, a noite de prévias. O centro de convenções está aberto há cerca de uma hora, mas já há um fluxo grande de pessoas saindo de lá com enormes caixas. É gente que não estava ali por painéis, trailers, estreias e atores famosos. Uma galera que comprou ingressos para todos os dias apenas por aquele momento. Nos dias seguintes, filas se formam durante a madrugada, bem longe do Hall H, e pouco tempo após a abertura do espaço, pela manhã, a cena se repete.
O que há de tão interessante lá dentro? Muita coisa. Action figures e estátuas exclusivas, numeradas, produtos esgotados em outros lugares, colecionáveis com descontos, gibis antigos e raros, gibis antigos e não tão raros, encadernados dos mais diversos tipos, camisetas, memorabilias, miniaturas... A SDCC (ou a NYCC, enfim) é, além de uma convenção, um verdadeiro shopping.
Tudo isso é algo que faz parte da experiência de uma Comic Con.
E foi essa experiência que os organizadores da Comic Con Experience se propuseram a trazer para o público brasileiro na última semana – uma visão que, por exemplo, a Yamato não teve com a sua Brasil Comic Con, onde poucas realmente interessantes e lojas estavam disponíveis.
Para não repetir esse quadro, houve um grande esforço nesse sentido na CCXP, anunciando logo de cara a parceria com fabricantes e revendedores de colecionáveis. Em parte, a estratégia deu resultado e tivemos, nesse sentido, um evento inédito no Brasil. Só que há um outro lado: da mesma forma que com os painéis, o evento mirou no grande e esqueceu do pequeno. Pra piorar, esbarrou naquele tal de jeitinho Brasileiro.
Artigos exclusivos são coisas que fazem valer a presença do público em um evento como esses. É algo que só estará a venda oficialmente lá, terá algum selo indicativo, tiragem limitada... Quem não foi, bom... Vai ter que se contentar em comprar em outro lugar, pagando um ágio. Mercado especulativo que faz parte dessa brincadeira desde que ela começou.
Por isso, a CCXP investiu em 11 produtos “exclusivos”, que iam de R$ 39,99 (um chaveiro “battle damaged” do Homem de Ferro da brasileira Iron Studios) a até R$ 1.499 (o capacete do Senna da Sid, do lendário Sid Mosca). Só que esses exclusivos não eram tão exclusivos assim. As figuras da Hot Toys, por exemplo, já haviam sido “exclusivas” da Toy Fair. Já os Cavaleiros do Zodíaco da Bandai (da linha Cloth Myth Ex) podem ser adquiridos na Amazon dos EUA. Outro repeteco foi o R2-Q5 ARTFX+, que já tinha sido “exclusivo” da New York Comic Con... de 2013.
A organização também pecou um pouco na... organização. O formato de venda desses produtos foi interessante: um estande único, com os produtos exclusivos, logo na entrada – e havia cotas de cada um dos produtos a serem vendidos por dia, além de um limite por pessoa. Só que ouvimos relatos de visitantes que entraram no São Paulo Expo logo na abertura dos portões e, ao chegar esse estande, os mais procurados estavam esgotados. Na fila, gente com credencial (expositores, jornalistas, convidados) já faziam suas compras, deixando o público comum para trás.
Claro, os colecionáveis exclusivos não são as únicas coisas a venda. Diversas lojas estiveram presentes na Comic Con Experience, vendendo seus produtos – com preços altos, infelizmente.
Digo infelizmente, nesse caso, porque preços altos em action figures, estátuas e coisas do tipo são reflexo de um problema muito maior, ligado à pouca produção nacional, custos altos de importação, dólar caro, impostos, muitos encargos trabalhistas, aluguéis caros e, claro, a ganância de alguns lojistas. Nesse cenário, quem acaba destoando mesmo é a Iron Studios, por conta da produção nacional amenizar a parte do dólar e importação.
Só que, esquecendo um pouco o chamado Custo Brasil, a experiência de uma Comic Con também envolve descontos, pechinchas, negociações. Não é uma Black Friday, com os menores preços do ano, mas o vendedor sabe que ele vai atingir na veia o público alvo em uma convenção como essas, que é hora de queimar estoques, sair do vermelho e, bom, fazer isso dando alguma vantagem ao comprador, quem sabe fidelizando o cara.
Com isso em mente, o JUDÃO verificou colecionáveis à venda em três estandes da CCXP – e encontramos três cenários completamente diferentes.
Comparamos 12 produtos da Fantoy Colecionáveis à venda na CCXP com os preços praticados na loja. Em rigorosamente todos os casos os valores eram idênticos. Não houve ganho nem cá, nem lá. Nesse comparativo, os valores cobrados variaram entre R$ 55 e R$ 1.999.
Já na Jovanelli Modelismo, comparando os preços de nove produtos no estande e que estão como disponíveis no e-commerce da própria empresa, vimos um aumento médio de 20% para quem fez compras na convenção. No caso da estátua do Joker DX01 feita pela Hot Toys com base no filme Batman – O Cavaleiro das Trevas, a diferença entre os valores praticados chegou a R$ 210. Em outros três casos, a diferença ficou em R$ 200. As exceções foram na estátua do General Zod também da Hot Toys, que no site e no evento tinham o mesmo valor (R$ 999,99); e uma do Loki do mesmo fabricante, que estava por R$ 50 a menos no evento (de R$ 899,99 por R$ 849,99).
Entramos em contato com a loja para entender essa diferença de valores. “Na verdade, devido a correria das semanas que antecederam a Comic Con Experience, não conseguimos atualizar o site, tanto preços como produtos. Começamos a fazer os acertos na quinta feira”, nos informou Sérgio Jovanelli, que esclareceu que os preços vão subir na loja online. “Enquanto o dólar estiver subindo a tendência é esta, infelizmente”. Além disso, o empresário afirma que a convenção atendeu todas as expectativas de vendas. “O evento foi épico!”.
Apesar do aumento do dólar, vimos uma tendência completamente oposta na Toy Show. O JUDÃO comparou os preços de três colecionáveis e identificou uma REDUÇÃO média de 20%. Em um dos casos, uma estátua do Wolverine do filme X-Men: O Confronto Final, a redução foi de R$ 240.
Uma “Convenção de Quadrinhos” precisa, obviamente, vender quadrinhos. Nos eventos do tipo nos EUA, comic shops de todo o país estão presentes, oferecendo descontos em encadernados (com reduções que podem ser maiores se o lançamento for mais antigo) e, claro, oferecendo suas raridades colecionáveis. Amazing Fantasy #15, Amazing Spider-Man #1, Amazing Spider-Man #50, The Avengers #1, The Walking Dead #1, Hulk #181, entre inúmeros outros gibis desejados, podem ser encontrados. Os preços variam bastante, mas mais por conta do estado e da procura pelos títulos, e não por estarem a venda em um evento.
No final, dá pra fazer a festa – e colocar a coleção em dia.
Na CCXP, tivemos uma reprodução de parte disso, mas em menor escala. Algumas editoras estiveram presentes, vendendo os títulos diretamente, além da Comix – que é a maior neste mercado no Brasil.
Quem melhor entendeu o que é uma Comic Con foi claramente a Panini. Primeiro porque a editora preparou uma série de lançamentos para o evento, fora o fato de ter trazido capas “exclusivas” – umas não tão exclusivas assim, celebrando o evento e que também foram pras bancas – e outras mais legais, com a capa em branco, especialmente criadas para fomentar as vendas dos quadrinistas no Artists’ Alley. Ah, sim: eles também publicaram o especial da Arlequina lançado pela DC Comics na San Diego Comic-Con, com a personagem no próprio evento californiano.
Em relação aos preços desses exclusivos, dá pra dizer que a Panini foi até além do que é feito lá fora – dando descontos nos preços de capa. A DC também faz esse tipo de venda em convenções, só que as publicações variantes de uma SDCC, NYCC ou WonderCon saem mais caras do que está na capa (US$ 10 ou 15, contra os US$ 2,99 ou U$ 3,99 cobrados normalmente).
Os descontos, aliás, se estendiam por todo o estande, um formato conhecido por quem visita a editora em eventos como a Bienal do Livro de São Paulo. Nada assim incrível (em diversos casos é possível achar mais barato em liquidações de livrarias online), mas diria que já está dentro de uma postura de Comic Con.
Por outro lado, a Comix preferiu não praticar desconto algum. Os preços eram os de tabela e os atendentes apenas informavam que, “dependendo do preço”, era possível conceder “10% de desconto no caixa”. Muito pouco.
Quando falamos que a organização da Comic Con Experience sonhou alto, mas esqueceu do mais simples, não é por acaso.
Pequenos lojistas foram aglomerados em minúsculos 25 estandes, no chamado “Stores’ Alley”. Ali, por exemplo, havia as únicas lojas vendendo HQs antigas em toda a convenção. Também estavam os únicos concorrentes das grandes lojas de colecionáveis.
Isso gerou alguns problemas práticos na CCXP. A Panini e a Comix tinham filas enormes, já que a concorrência pouco chamava a atenção, sem falar que praticamente não houve disputa de preços entre estandes concorrentes, o que é comum em um evento que reúne todo um mercado.
Inclusive, ouvimos relatos de varejistas que estiveram no Stores’ Alley aumentaram os preços para a convenção e, mesmo assim, venderam praticamente todo o estoque – sendo obrigados a até a recorrer as outras lojas (lembra daquele pessoal que assumia a fila antes do público comum?) para ter algo pra vender.
Esses pequenos comércios também são responsáveis por diversificar os produtos à venda. Lá fora são comuns, por exemplo, acetatos de animações clássicas como He-Man e os Mestres do Universo, X-Men, Batman – The Animated Series... Até pinturas (pinturas mesmo, óleo sobre tela ou acrílico sobre tela) com super-heróis são vendidas.
Por fim, como já foi dito, esse tipo de espaços e de lojas também é o que ajuda a caracterizar uma Comic Con. Nesse sentido, a Santos Comic Expo (um evento gratuito) conseguiu reproduzir melhor essa experiência este ano. E, por lá, não foi preciso prometer isso.
Para 2015, fica uma lição de casa para os organizadores da Comic Con Experience: aumentar o número de lojas presentes, sejam elas pequenas, médias ou grandes. Para os lojistas, fica a nossa esperança de que eles finalmente entendam o que é uma Comic Con: mais do que aumentar os lucros, uma oportunidade para fomentar a cultura pop – e, claro, de formar novos consumidores.