Jimi Jamison, vocalista do Survivor e responsável pela música-tema de Baywatch, o cantor americano virou especialista em dar aquela deliciosa voz farofenta às histórias de heróis em Hollywood
Quando você escuta aquela batida, é, AQUELA mesma, devidamente seguida do pianinho maroto, não tem como negar: dá uma vontade desgraçada de sair correndo em câmera lenta pela praia. Por mais que você esteja sentado em casa, de pijama, numa puta friaca, ou no cinema assistindo ao novo filme, sua cabeça te leva imediatamente de ROUPAS DE BANHO para a areia, enquanto a introdução de I’m Always Here rola solta, cantada por ninguém menos do que Jimi Jamison, americano nascido na região rural do Mississippi mas criado a vida toda em Memphis, no Tennessee.
“Este piano tem um quê de Bruce Hornsby, que foi a minha inspiração aqui”, explicou Jamison certa vez, a respeito da música composta para ser a abertura oficial de Baywatch, num papo com o site Melodic Rock.
A inspiração a qual o vocalista se refere é, caso você não tenha ligado o nome à pessoa, é o cantor e tecladista que transita por uma série de gêneros (clássico, jazz, folk, soul, blues) e que, além de sua bem-sucedida carreira solo, tornou-se conhecido pelo trabalho com o Grateful Dead na reta final. “Sempre que tinha a chance, eu ia em seus shows. Tive inclusive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente. Virei fã”.
Um verdadeiro apaixonado por música desde que viu um tal de Elvis Presley andando de moto pelas ruas de Memphis, Jimi Jamison também conquistou a sua própria parcela de fãs, na real. E desde cedo. Aprendendo a tocar guitarra e também o danado do piano sozinho ainda criança, no ensino fundamental, por volta dos seus 14/15 anos de idade teve sua primeira banda, The Brutes — todos os integrantes eram do time de futebol da escola, logo Jimi achou o batismo bastante apropriado.
Pouco depois, à frente de outro projeto, chamado de The Debuts, chegou a gravar uma canção que se tornou um hit local, lá em 1968: If I Cry, um presente de seu amigo de infância Alex Chilton, vocalista do The Box Tops, uma mistura típica de soul, rock e blues que muito se via na cena musical de Memphis.
“Eu estava cercado de R&B, blues e soul”, relembrou Jamison, em entrevista ao The Guardian. “Então, naturalmente eu era influenciado pela soul music, pelos lançamentos da Stax Records (de caras como Isaac Hayes e Albert King). Até aprendi a tocar trompete – porque, vamos lá, o que é uma banda de soul se não tiver trompete e saxofone?”.
Depois de passar por um grupo chamado D-Beaver, que até lançou um disco (Combinations, de 1971), o músico começaria a consolidar a carreira no comando de uma banda de Memphis chamada Target. Embora fossem relativamente desconhecidos nacionalmente, conseguiram fechar um contrato com a A&M Records, lançando dois álbuns e ainda abrindo shows pra caras como Black Sabbath e Kiss.
O Target não teria lá vida muito longa, não, mas a pegada de Jamison para aquele hard rock de arena cheio de carisma logo chamaria a atenção de um suíço chamado Mandy Meyer. O guitarrista, conhecido por sua passagem pela fase mais comercialmente bem-sucedida do Gotthard e também por hoje integrar o Unisonic de Michael Kiske e Kai Haisen, tinha acabado de sair do Krokus, o gigante suíço do heavy metal. Meyer procurava integrantes para seu projeto solo e acabou encontrando, nos EUA, dois compatriotas xarás, Tommy Andris (vocal) e Tommy Keiser (baixo), ambos ex-integrantes do Roxane. Mas quando o trio foi parar em Memphis, Meyer sacou que o primeiro Tommy não tava funcionando e, com a ajuda do empresário Butch Stone, que tinha cuidado do Target lá atrás, acabou chegando em Jimi Jamison. Nascia aí o cultuado combo conhecido como Cobra.
Surgida no final dos anos 70, a banda lançaria apenas um único disco, First Strike, de 1983. Os caras não chegaram a explodir e vender milhões de cópias como rolou com tantas outras bandas de refrões grudentos e cabelos ao vento da mesma época, mas canções como Blood On Your Money foram parar na programação da MTV – que, vamos lembrar, naqueles anos era fanática para encontrar o Mötley Crüe da vez – e ajudaram a construir uma pequena e fiel base de seguidores, a mesma que ficaria ligadíssima em tudo que os caras fariam a seguir, depois que decidiram se separar, em 84, com Meyer indo parar na piração progressiva do Asia enquanto Jamison acabou no comando dos microfones do Survivor.
Quer dizer, apesar de sabermos que seu período no Survivor foi excelente tanto para ele (que, enfim, se tornaria internacionalmente conhecido) quanto para a banda, o casamento entre os dois não foi tããããããããão simples quanto pode parecer. Pra começar, Jamison nem queria aceitar o trampo. O som do Survivor parecia pra ele muito mais suave, mais pop, do que o hard que vinha fazendo no Cobra. Mas eles eram os caras que tinham lançado o megahit Eye of the Tiger, da trilha de Rocky III, vinham fazendo um trabalho consistente e não queriam colocar tudo a perder por conta dos problemas que seu então vocalista Dave Bickler vinha apresentando com a voz graças aos PÓLIPOS nas cordas vocais e ele aceitou o trabalho.
Aí, o primeiro trampo de Jamison com os novos coleguinhas foi justamente The Moment of Truth, canção da trilha de Karate Kid, que já chegou bombando nas paradas da Billboard, preparando caminho para seu primeiro álbum como frontman do Survivor, Vital Signs (1984). Com sucessos como The Search Is Over e High on You, a banda estava preparada para brilhar novamente. No ano seguinte, o Survivor voltaria a embalar a história de outro herói, retomando a parceria com Sylvester Stallone. Em Rocky IV, o GARANHÃO ITALIANO ganhou outra canção de impacto, Burning Heart, agora com a voz de Jamison (e que, cá entre nós, foi uma das poucas boas coisas daquele filme de merda).
Na discografia do grupo com Jamison, viria então o igualmente estrelado When Seconds Count, lançado em 1986 e, quando Too Hot to Sleep saiu, em 1988, o sucesso definitivamente não foi o mesmo. Era um disco ligeiramente mais pesado, lembrando os anos iniciais do Survivor e, obviamente, influenciado pela presença cada vez maior de Jamison como compositor, que inclusive apontava aquele álbum como o seu favorito com a banda. As vendas deixaram todo mundo, CONJUNTO e gravadora, bastante desapontados e Jamison, que pouco antes recusara um convite para assumir os vocais do Deep Purple pós-demissão de Ian Gillan (a vaga acabou ficando com Joe Lynn Turner) justamente porque tinha acabado de gravar seu disco solo, foi esfriar a cabeça fazendo uma turnê sozinho. Nada de sair da banda em definitivo, claro. Mas foi aí que começou a treta.
Foi o período em que ele aproveitou a relação com Stallone para fazer sua própria versão de Ever Since the World Began, faixa do Survivor gravada antes de sua entrada na banda, que acabou tocando no filme Condenação Brutal (1989). E também foi quando ele atendeu ao chamado da NBC para gravar a música-tema de uma série sobre um grupo de salva-vidas no condado de Los Angeles. Originalmente, a canção de abertura na primeira temporada era Save Me, de Peter Cetera. Mas quando o programa foi sindicalizado e distribuído pra tudo quanto é canto dos EUA, os produtores acharam que Baywatch merecia se renovar usando uma música com mais PEGADA.
O acordo rolou porque tanto os discos do Survivor quanto When Love Comes Down, o primeiro disco solo de Jamison, saíram pela Scotti Brothers Records, dos irmãos Tony e Ben Scotti. A gravadora, que mais tarde se tornaria a All American Music Group (cujo catálogo, atualmente, está nas mãos da Volcano Records), tinha um braço de produção televisiva independente, a Scotti Bros. Pictures. Foi esta empresa, dentro da holding All American Communications, que se envolveu com a produção/distribuição de Baywatch, negociando até para que artistas de seu cast aparecessem nos episódios da série e tudo mais.
A partir da terceira temporada, junto com a estreia de Pamela Anderson, essa passou a ser a abertura da série. :)
Jamison aproveitou o momento, com o sucesso de Baywatch (“eu sempre coloco a música no setlist e as pessoas ficam pensando que conhecem aquilo de algum lugar”), para capitalizar a parada. Tinha um Greatest Hits do Survivor rolando nas lojas, vendendo relativamente bem, a galera relembrando os sons do grupo. E aí que ele começou a fazer shows tocando com músicos locais, escolhidos a dedo, batizando a atração como Jimi Jamison’s Survivor.
As apresentações começaram a ficar lotadas. Frankie Sullivan, o guitarrista do Survivor, chegou a tocar com ele em um pedaço da turnê e, como a tal da coletânea tava vendendo bem, a gravadora chegou a pedir que eles se reunissem para gravar umas duas canções inéditas para meter como bônus em OUTRA coletânea, que serviria de pretexto para uma turnê mundial, aquela coisa toda. Os músicos se reuniram em estúdio mas acabou não dando assim tão certo, as negociações esfriaram. E aí o cantor preferiu não ficar parado esperando a definição e colocou novamente a sua Jimi Jamison’s Survivor na estrada.
Só que aí complicou. Porque Sullivan e Jim Peterik, guitarrista/tecladista e outro membro fundador do Survivor, se reuniram com o cantor original Dave Bickler pra dar continuidade àquela história de Greatest Hits com canções inéditas. E aí o Survivor volta à ativa e resolve fazer uns shows por aí. Mas como fica a cabeça das pessoas com um Survivor aqui e um outro Survivor acolá? Confusão à vista, processinho também. No fim, a briga na justiça durou mais do que devia mas, depois de perder uma primeira vez, Sullivan ganhou os direitos do nome Survivor, Jamison teve que meter o rabo entre as pernas e escrever nos cartazes de seus shows apenas “Jimi Jamison”. Se quisesse, no máximo, podia meter um “cantando os sucessos do Survivor”.
Apesar de ter mantido uma carreira solo bastante ativa, participando até do projeto alemão Rock Meets Classic, que traz astros do rock clássico cantando seus sucessos com a participação da orquestra Bohemian Symphony, de Praga, Jamison nunca se afastou do Survivor por completo. No ano 2000, chegaram a se reunir novamente pra gravar Velocitized, prevista para entrar no filme Alta Velocidade (de 2001, com Sylvester Stallone, claro). Mas embora a música não tenha sido utilizada na película, os integrantes gostaram de voltar a trampar juntos e lançaram um novo disco de inéditas, Reach, em 2006.
Em novembro de 2011, Jamison foi convidado para cantar uma versão de Eye of the Tiger para servir como introdução do boxeador Manny Pacquiao em sua luta contra Shane Mosley. Dias depois, ele anunciaria seu retorno em definitivo à formação do Survivor, após um sumiço de cinco anos. Desde então, ele continua fazendo turnês ao lado dos caras (incluindo uma série de shows com ele e Dave juntos no palco) até o dia de sua morte, em agosto de 2014, vítima de um ataque cardíaco, aos 63 anos.
Enquanto o Survivor tenta seguir em frente, desta vez com o jovem Cameron Barton nos vocais (tentando se espelhar no exemplo dos parceiros do Journey), o legado de heroicas canções ENTOADAS pelo vozeirão poderoso de Jamison permanece. LaRusso, Balboa e Buchannon agradecem.
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