Kaya Scodelario e o sexismo nosso de cada dia | JUDAO.com.br

Em entrevista ao JUDÃO, a Teresa de Maze Runner falou sobre um problema que ela — e todas as mulheres — experimentam o tempo todo em seus trabalhos, especialmente em Hollywood.

“Com o trabalho, te dizem como se vestir, como você deve ser, por seis meses da sua vida. Eu queria fazer algo que fosse escolha minha, que fosse diferente. Se eu não tivesse feito agora, eu talvez me arrependesse de nunca ter pintado meu cabelo”. Foi só uma pergunta sobre aquele cabelo, com as pontas esverdeadas, querendo sinceramente saber se aquilo tinha alguma relação com o seu papel no novo Piratas do Caribe. Uma sereia, talvez? Mas a resposta de Kaya Scodelario é mais um daqueles momentos em que um homem percebe (ou pelo menos deveria) que as coisas nunca são tão simples assim pra uma mulher. E o quão babaca eu fui por imaginar, automaticamente, que a menina linda de cabelo colorido só poderia ser uma sereia. Eu errei. Muito.

“Eu interpreto uma astrônoma, procurando pelo Tridente de Poseidon. Ela tá numa jornada pra encontrá-lo, encontra Jack Sparrow no meio do caminho e ele obviamente fode a porra toda!”, disse a atriz em entrevista ao JUDÃO, explicando melhor o que ela vai fazer no próximo filme dos Piratas. Pois é.

“Acho que não existe nenhum trabalho no nundo no qual uma mulher possa dizer que não teve de enfrentar sexismo. Ainda é uma coisa que tá por aí, que ainda acontece. Toda mulher com quem você conversar vai te contar de alguma vez que foi dito que ela não poderia fazer bem o trabalho por ser mulher e é o mesmo na nossa indústria”, afirmou a inglesa de mãe brasileira. “Mas finalmente várias atrizes resolveram se posicionar contra isso, falando abertamente sobre o fato de que ainda recebemos menos que os homens, e isso é ridículo. Nós literalmente temos a mesma quantidade de trabalho, é a exatamente a mesma coisa. E ainda é mais difícil pra mulher conseguir respeito, conseguir trabalhar pelo mesmo tempo que os homens. É um momento legal, em que conversamos sobre isso mas, sim, ainda é um problema”.

Um problema que, segundo ela, aparece logo nas primeiras páginas de um roteiro. “Tem vezes que eu leio o roteiro e em cinco páginas eu já sei que é um cara escrevendo, sem vontade de escrever sobre mulher, sem se importar”.

Kaya esteve no Brasil pra assistir a Corinthians VS. Fluminense em Itaquera e também divulgar Maze Runner: Prova de Fogo, um FILME interessante (ainda que não tanto quanto o primeiro), mas que segue contando uma história ridiculamente pobre em diversos níveis. Do óbvio relacionado ao motivo pelo qual sequestram aquelas pessoas, ao fato de Teresa, a personagem de Kaya, cair na chamada “Síndrome de Trinity”, em que aquela personagem que parece ser sensacional, no fim, não serve pra absolutamente nada — e, estando nós no segundo filme de três, isso talvez seja mais importante do que você pensa.

“Nós temos o mesmo tanto de trabalho, mas ainda recebemos menos que os homens. Isso é ridículo”

“O que eu amo nela é que, no primeiro filme, ela literalmente acorda num mundo cheio de homens. E a primeira coisa que ela faz é tacar pedra neles, apontar facas, dizer pra ficar longe dela”, lembrou Kaya. “Não acho que ela seja fraca, nunca. É uma ideia errada e comum a de que se você interpreta uma personagem forte, ela não pode ser vulnerável. Enquanto mulher, enquanto pessoas, você pode ser incrivelmente corajosa, forte, e ter momentos de vulnerabilidade. É humano. Eu gosto que ela possa ser vulnerável”, disse, nos fazendo imediatamente lembrar de toda a polêmica que envolveu a Viúva Negra e Joss Whedon em Vingadores: Era de Ultron.

Kaya está certa, nesse ponto. A diferença, porém, é que se em um determinado momento de Era do Ultron alguém perguntar “onde tá a Viúva Negra?”, você saberia exatamente a resposta. Quando o mesmo acontece em relação à Teresa, você se surpreende com o fato de que nem você se lembrava dela. E isso incomoda. Porque a ÚNICA coisa que ela faz nessa história toda, além de ser uma menina no meio de todos aqueles caras, acontece justamente quando ninguém tá vendo. E fica pro terceiro filme. “Ela não é vilã, não é má. No próximo filme a gente deve entender mais as razões dela, suas opiniões e, espero, as pessoas não vão odiá-la tanto...”, explicou, quase se escondendo na cadeira.

O que ela fez não se faz, mesmo, ainda mais do jeito que fez. Mas ajuda a ressaltar a pobreza da história, já que parece muito mais certo do que tudo o que você tá vendo leva você a acreditar. E isso é tão errado... ¯\_(ツ)_/¯

São todos ótimos personagens. Mas Teresa é a única que só está lá porque sim. :/

São todos ótimos personagens. Mas Teresa é a única que só está lá porque sim. :/

“Cada trabalho que você faz, você precisa entrar com a mesma paixão. Seja cinema, TV, pequeno ou grande orçamento”

Kaya, que fala um português delicioso de ouvir — ainda que seja “só” a sua segunda língua, o que faz com que ela prefira responder tudo em inglês, mesmo que você possa perguntar em português — tem só 23 anos, mas é extremamente consciente do mundo em que vive (e no qual trabalha) e, num universo de tantas entrevistas feitas apenas pelo marketing, surpreende por falar o que pensa e o que sente. “Cada trabalho que você faz, você precisa entrar com a mesma paixão. O mesmo foco, o mesmo nível de trabalho, não importa se é TV, filme, orçamento mínimo, orçamento gigante. Quando você tá no set, quando dizem ‘AÇÃO!’ você precisa ser a mesma”, contou. “Skins pra mim era tipo uma família, bem inglês, só a galera cool conhecia, e agora isso toooodo mundo conhece. Tem uma pressão a mais, porque parece maior, mas você ainda tem de agir com a mesma atitude”.

E que seja sempre essa mesma atitude, Kaya. Por aqui, eu prometo que vou sempre e sempre e sempre perceber que a gente é que precisa mudar. :)