O novo Superman pode ser até legal, mas não é o Superman | JUDAO.com.br

DC inicia uma série de grandes mudanças no Homem de Aço a partir desta semana, mas… Será que é disso que precisamos?

SPOILER! Eu confesso: sou fã do Superman old school. Quer dizer, não tão old assim: comecei a ler o personagem na primeira metade dos anos 90 e, pra mim, aquela acaba sendo a versão para a qual olho com mais carinho. Depois, mais velho, conheci as clássicas histórias que foram feitas antes, o que veio depois e passei a admirar ainda mais tudo aquilo que esse herói representa.

E, de certa forma, ele representa ser chato, ser o Escoteiro, poderoso, certinho, mesmo que eventualmente com suas falhas e erros — como matar um adversário. Porém, nos últimos anos, com o crescimento dos anti-heróis entre os leitores de quadrinhos, o Homem de Aço foi tomando um outro caminho, que ganha um novo estágio a partir da saga Truth, que começou a ser publicada nos EUA esta semana, em Superman #41.

Basicamente, o arco, que vai estabelecer o status quo do personagem na nova fase da editora (chamada DCYou), quer descontruir o Superman, deixando de lado uma parte do que é feito o personagem clássico e aproximando mais do que é visto em outras publicações que andam vendendo bem.

“Descontruir?”. Pois é. Já a algumas edições o personagem tinha um novo poder, o Super Flare, que faz com que ele dê uma grande descarga de energia, mas fique totalmente sem poderes por um tempo — inicialmente 24 horas, mas, depois, esse tempo de “black out” diminuiu a partir do momento que ele consegue controlar esse poder de forma mais eficiente. A ideia ali era fazer com que o super-herói, mesmo que por pouco tempo, deixasse de ser “super”, ficando efetivamente humano, além de mais próximo dos leitores.

Capa Superman #41Mas isso era pouco. Em Truth, Lois Lane vai publicar na primeira página do jornal que, na real, Clark Kent é o Superman, acabando assim com uma identidade secreta que dura quase 80 anos. E que, bom, esteve muito bem guardado por baixo de um óculos.

“Sempre houve essa tensão com o Superman. Ele luta pela verdade, mas ele tem esse grande segredo então ele nunca conta a verdade sobre si mesmo”, conta o novo roteirista do gibi, Gene Luen Yang, em entrevista ao CBR. “E até além disso, como profissão, ele escolher ser um repórter, e o ponto principal é que seu trabalho é comprometido com a verdade. Essa tensão, essa dinâmica, é algo que queremos brincar nesse arco”.

Digamos que, ao menos nessa primeira história, Yang consegue contar uma boa HQ, por mais que o traço do John Romita Jr, do qual nunca fui muito fã e parece estar cada vez mais preguiçoso, atrapalhe. Before Truth nos entrega inicialmente uma clássica história do Superman, naquele estilo bem anos 90, com Clark Kent se envolvendo em uma investigação para o Planeta Diário depois de uma denúncia anônima via celular (sim, ele usa WhatsApp!) sobre contrabandistas de armas poderosas construídas com grandes impressoras 3D (afinal, estamos em 2015...). Kent vai lá com o Jimmy Olsen, tudo dá errado e, claro, o Superman tem que se meter na história. Depois, com uma força da Lois Lane, conseguem uma matéria de capa no Planeta, com aquelas manchetes enormes que só existem nos gibis. Todo mundo fica feliz. Só que o “estilo anos 90”, mesmo que ~moderninho, acaba aí.

Quem deu a dica pra pauta acaba revelando que sabe que Clark Kent é o Superman, ameaçando-o revelar o segredo pro MUNDO via fotos numa fan page do Facebook se ele não entrar no esquema. Quase uma ~caída na net.

Superman #41 ainda deu, logo na primeira página, uma amostra de como o seu protagonista vai acabar no final do arco: com novo visual, incluindo novo corte de cabelo e esse estilo “camiseta com S e jeans” (que lembra o que foi visto nas primeiras edições de Action Comics pós-reboot e que já está circulando no material de divulgação da DC há alguns meses e apareceu em Superman/Wonder-Woman #18); e voando por aí de avião (ou por fora dele) enquanto foge de tudo e de todos.

Apesar dessa primeira história ser boa (tirando, talvez, uma passagem de um Clark Kent sem poderes e agindo ao velho estilo do DEMOLIDOR), fica a dúvida se este é o melhor caminho. É realmente muito difícil escrever histórias para o Superman, simplesmente porque ele é muito poderoso, e “quebrá-lo” não é apenas um caminho para tentar alguma identificação com os leitores, mas também pra facilitar na hora de escrever os roteiros. Mas, depois, o resultado que fica pode ser ainda mais difícil de trabalhar.

No fim de tudo, o Superman vai ficar assim...

No fim de tudo, o Superman vai ficar assim...

Afinal, sem uma identidade civil, um trabalho ou uma vida normal, o que ficará poderá ser mais distante dos leitores do que o herói inicialmente era. É só lembrar do Homem-Aranha: foi uma boa ter revelado que ele era o Peter Parker durante Guerra Civil? Pro crossover, foi incrível, mas deixou uma batata quente na mão dos roteiristas, que foi resolvida de uma forma que é bom nem lembrar.

Olhando lá pra trás

É bom que se diga que os elementos (ou objetivos) de Truth não são assim tão novidade. Alguém agindo para acabar com a identidade secreta do Superman foi, por exemplo, o enredo do arco A Morte de Clark Kent, lá nos anos 90. Em um dos trechos da saga, o Azulão vai trabalhar no meio do mato, com barba grande e tudo mais.

Tentativas para deixa-lo mais humano, mais moderno e menos “super” são ainda mais antigas. A primeira delas foi em 1971, na clássica Kryptonita Nunca Mais, quando Dennis O’Neil e Neal Adams tentaram deixar o personagem mais ~descolado pra época, não só colocando-o como âncora de TV, mas também diminuindo drasticamente seus poderes, que naqueles tempos eram no nível de um deus. Outros gibis com o mesmo objetivo, mas caminhos e conceitos diferentes, vieram depois, incluindo aí o reboot do John Byrne nos anos 80 e o do Geoff Johns no finalzinho dos anos 2000.

Acontece que, em todas essas vezes, as mudanças com o Superman foram feitas mantendo mais o pé nos conceitos clássicos, consolidados na Era de Prata, e pensando em como manter o personagem ainda interessante nos anos seguintes. Não é o que parece, infelizmente, em Truth, que está justamente jogando fora partes desses conceitos para atingir seus objetivos.

Talvez (TALVEZ!) fizesse mais sentido substituir Clark Kent por outra pessoa com o S no peito — a Marvel está fazendo isso de forma competente com seus heróis, e a própria DC já fez isso recentemente na Terra 2, por exemplo. Alguém que fizesse mais sentido ter essa pegada mais underground, mais rebelde, mais Wolverine...

Até porque, no final, o que fica de Truth é um super-herói que pode ser tudo, incluindo legal, mas menos ser o Superman. Ou, talvez, essa história de esconder a identidade secreta com óculos tenha ficado muito boba pra esse (chato) mundo moderno...