Banda de metal extremo de Phoenix, no Arizona, faz sucesso com seus integrantes tocando vestidos como o vizinho CAROLA de Homer Simpson
Thrash, power, death, black, doom, folk, crossover, industrial, tradicional. A gente já falou aqui algumas vezes, mas não custa ressaltar que cada hora surge um novo subgênero na complicada árvore genealógica do heavy metal.
Em agosto do ano passado, um quinteto da cidade americana de Phoenix, lá no Arizona, resolveu acrescentar o seu próprio tempero nesta história ao criar o chamado NEDAL. A combinação é bem simples: misture pancadaria brutal da melhor qualidade com Ned Flanders. É, ele mesmo, o vizinho bondoso, conservador e ultrarreligioso da família Simpson.
“O Ned não tem mesmo absolutamente nada a ver com heavy metal”, diverte-se Head Ned, vocalista do grupo, em entrevista para o JUDÃO. “Eles são opostos completos e esta é a deliciosa ironia da coisa. É muito engraçado, pelo menos pra gente”. Os cinco integrantes da banda batizada de Okilly Dokilly se vestem exatamente como Ned (óculos, camisa rosa por baixo do suéter verde, calças cargo e bigodão) e inclusive preferem ser chamados, a la Ramones, por suas alcunhas de palco: além de Head, completam o time Stead Ned (guitarra), Thread Ned (baixo), Bled Ned (bateria) e Red Ned (teclado).
Depois de soltarem um EP com quatro músicas no ano passado e chamarem a atenção pelo inusitado da coisa (em menos de duas semanas, já tinham organicamente mais de 30.000 fãs no Facebook), agora eles voltam às notícias com o lançamento de Howdilly Doodilly, seu primeiro disco completo, com 13 faixas que fazem referência direta ao universo do personagem na série animada de Homer e cia. Estão lá canções como Vegetables e Donut Hell, numa contracapa que traz apropriadamente uma usina nuclear explodindo. Tudo disponível para ser ouvido em qualquer plataforma de streaming da vida.
“Tudo começou comigo e o Bled Ned jogando conversa fora na fila do açougue”, conta Head, sobre o início PROSAICO de suas atividades. “Já estávamos querendo montar uma banda e ficamos falando um monte de nomes adoráveis que poderiam servir como contraponto para bandas realmente agressivas. Aí, chegamos em Okilly Dokilly, que poderia ser algo tranquilamente vindo do vocabulário do Ned”.
As piadas continuaram chegando conforme o assunto foi sendo desenvolvido e, bom, aqui estão eles, com letras que são essencialmente falas do Sr.Flanders ou então de alguma forma relacionadas ao camarada. A principal diferença: não é uma banda formada apenas por canhotos, como o próprio Flanders. Mas tudo bem, isso a gente perdoa.
É importante, no entanto, que se ressalte uma coisa aqui. Vejam, por exemplo, o single White Wine Spritzer, que virou o primeiro clipe oficial da banda. Estamos falando da bebida alcoólica favorita de Ned, aquela que o deixa maluco no episódio em que ele e Homer vão para Las Vegas. Está tudo aí, o humor, a piração, uma dose de bizarrice no visual.
Mas tem também algo que não dá pra negar: o som é pesadíssimo. Metal com ares death, furioso e muito bem executado, com vocal gutural e a porra toda. Do tipo que surpreenderia quem chegasse neles e inesperadamente fosse dar um play, com a expectativa de escutar apenas uma sátira do tipo Massacration.
Não se engane com a doçura com a qual eles agradecem todo o apoio de seus neighborinos porque, como o próprio Head descreve, a intenção foi fazer o som mais brutalino possível. Se um fã de metal mais extremo escuta sem saber do que se trata, sem se focar na tiração de sarro, certeza que vai sair batendo cabeça como se não houvesse amanhã, procurando o primeiro wall of death mais próximo pra se jogar em cima dos amiguinhos cabeludos.
Godspeed Little Doodle, por exemplo, é bem Pantera, a maior faixa do disco e com um groove foderoso. Certeza que seria algo que os músicos do Lamb of God adorariam gravar, por exemplo. E enquanto You’re a Jerk e Panic Room são uma mistura interessante de metal com música country (cada uma a seu jeito, é bom que se diga), Press Destruction Button tem aquela simplicidade reta e direta nos acordes que lembra muito um bom flerte com o punk. E o que dizer da modernidade sonora de uma More Animal Than Flan, um lance até meio eletrônico a la White Zombie e que mistura um vocal mais limpo com aquele berrado enquanto a guitarra chega a fazer uns riffs meio metalzão tradicional? Vale DEMAIS a audição. :D
Basicamente, o que Howdilly Doodilly mostra é que tem muito metal aqui para ir além da piada, feito por músicos talentosos de verdade. Se a coisa toda perder a graça em algum momento, basta largar a roupinha do Ned de lado, meter uma camisa preta e bermudão e continuar quebrando tudo.
Depois que se tornaram sensações na internet, era de se esperar que seu primeiro show, na cidade natal dos cinco, fosse ultrapassar e muito a capacidade de 100 pessoas do pequeno clube local Trunk Space. Desde então, eles têm sido convidados frequentes pra um monte de pequenos festivais.
“A gente sempre toca ao vivo devidamente caracterizado, jogamos boias em formato de donut pra galera”, conta, lembrando que, por enquanto, eles não vivem apenas da música e têm que se sustentar com outros trabalhos em suas identidades secretas. “E pensar que tudo começou como uma ideia boba, assim, meio maluca. Tudo tem sido maravilhoso. Temos tido mais apoio do que eu sequer podia imaginar e eu não podia estar mais agradecido”.
Mas fica uma dúvida no ar: eles não têm um medinho de receber uma cartinha de um advogado da Fox? “Honestamente, eu esperava que fosse rolar logo no começo”, confessa o frontman. Ele explica que o grupo tem tentado ser cauteloso, como por exemplo ao tratar a sua fonte de inspiração apenas como Ned, sem usar o nome completo. “Um monte de fãs dos Simpsons são nossos fãs agora. Eles estariam deixando putos os seus próprios consumidores”.
Seria lindo se a grande indústria do entretenimento realmente seguisse sempre esta lógica mas, por enquanto, vamos que vamos, incomodando a vizinhança de Springfield e adjacências com um tipo de som que Bart Simpson colocaria no talo para tirar o próprio Ned do sério.