Nove anos depois, o público não é mais o mesmo — e parece que ninguém se preocupou com isso. Ou com qualquer outra coisa, na verdade.
O problema tinha de ser eu. Era óbvio que eu é que estava errado, não era possível que houvesse outra opção. Gostei tanto do primeiro Sin City, queria tanto uma seqüência! Se algo ali não se encaixava, claro, era eu.
Só que esse eu, hoje, tem quase 31 anos, cheio de responsabilidades, pensamentos, idéias e visões que eu não tinha nove anos atrás. Tinha acabado de passar pelos 20, tudo era muito mais legal, tudo brilhava mais aos olhos. Aquele filme impressionava pela questão da fidelidade aos quadrinhos, do visual noir, da violência. Foi um marco na minha carreira, foi um marco entre as adaptações de HQs, foi um marco pro cinema.
Fiz até questão de reassistir ao primeiro filme — queria mesmo provar pra mim mesmo que a culpa era minha. Eu envelheci, eu fiquei mais ranzinza, isso é claro. Mas, ao gostar do mesmo jeito que gostei quando assisti ao filme na década passada, percebi que o problema não sou eu. O problema é o próprio Sin City: A Dama Fatal. O problema é Robert Rodriguez, o problema é Frank Miller.
O problema é que eles não tentaram fazer nada pra chamar aquela mesma audiência que tava maluca por uma sequência nove anos atrás. O problema é que eles não fizeram nada pra fazer com que o público de hoje enlouquecesse por uma sequência e uma série de outros filmes. O problema é que A Dama Fatal, assim como tantas outras coisas que Frank Miller tem feito nos últimos anos — a maioria dela sequências — não deveria ter sido feito.
Nenhuma das histórias é interessante por si, e a maneira como elas são contadas e ligadas faz com que qualquer um perca o interesse. Bruce Willis, Mickey Rourke, Joseph Gordon-Levitt, todos, sem exceção, parecem que estavam lá porque não tinham nada melhor pra fazer em casa, mesmo. E a culpa poderia ser dos atores, se fosse um caso isolado, mas é geral. O material que eles tinham pra trabalhar era absolutamente nulo. Uma pena pra Jessica Alba, já que enquanto os caras interpretando eles mesmos podem dar em alguma coisa, deixá-la solta assim, bem...
A violência, que poderia fazer muita gente vibrar nos cinemas, é outra que tá completamente perdida no meio do que fizeram. Tirando uma cena sensacional com a pequena e letal Miho arrancando algumas cabeças, nada. Sem aflição, sem que você torça pra um ou pra outro, nada. Não há qualquer tipo de sentimento. Nem mesmo de satisfação visual.
O filme é 102% filmado em estúdio, tela verde, com cenários digitais e, nessa linguagem criada por Frank Miller pras HQs e assumida por Robert Rodriguez nos filmes, acho lindo. Mesmo! Mas só no primeiro. Em A Dama Fatal, eu jurava que tava assistindo a Chaves em alguns momentos, tamanha a falta de interação entre cenário e personagens. E ainda era algo meio cartunesco...
E como se não bastasse, ATÉ os peitos da Eva Green, que aparece pelada em 99% do tempo, perderam a graça. Quer dizer, não os peitos dela, que são lindos e <3, mas o uso deles. O apelo de "Dama Fatal" só dura uns 5mins e perde-se qualquer vontade de matar por ela. Chega um momento em que você só quer mesmo levantar da poltrona e ir até a tela de cinema oferecer um blusão, pro caso de ela ficar gripada. • LEIA TAMBÉM! As mulheres de Sin City
Foi isso o que Sin City: A Dama Fatal fez, perceba. E é a a segunda vez que o nome de Frank Miller está envolvido em “nem a Eva Green pelada salva”, já que o mesmo aconteceu em 300: A Ascensão do Império.
O que será que tá acontecendo com ele? E por que que eu tenho essa impressão de que o Robert Rodriguez, que poderia salvar a porra toda, transformando Sin City: A Dama Fatal num filme divertido, nos seus termos, simplesmente cagou e andou pra tudo? Nem mesmo no fanservice ele deu certo, como nas participações da Alexa Vega stripper (sério, ela aparece, dá umas reboladas e acaba) ou da Lady Gaga. Eu poderia dizer que aconteceu com ele o mesmo que aconteceu com o elenco, mas... Ele é um dos responsáveis pelo material. Fazer por obrigação não parece ser do feitio do Robert Rodriguez, ele nunca foi de bancar um diretor contratado, mesmo quando era.
Teria ele vendido a alma pro Frank Miller?
Fato é que Sin City 2: A Dama Fatal não é um filme que pode ser analisado por si só, por N razões. Ainda assim, se fosse, seria um filme sem graça nenhuma. Colocando-o lado a lado com o primeiro, A Dama Fatal consegue fazer do capítulo inicial um clássico do cinema, uma obra-prima. E, de si mesmo, só mais uma sequência de Frank Miller. Se você conhece O Cavaleiro das Trevas 2, nos quadrinhos, deve saber que esta combinação é fatal de tão ruim.
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Hora de parar, então? “(...) Agora que fizemos o segundo, partiremos para o terceiro rapidamente”, diz ele, em entrevista para o jornal Folha de S.Paulo. Se depender apenas das bilheterias nos EUA, talvez os planos dele fracassem. Mas ele parece não se importar. Diz que não vai voltar às grandes editoras porque está “guardando tudo para o cinema”.
Engraçado ouví-lo dizer isso. Ele vai e faz um primeiro Sin City e acerta. Aí, ele resolve dirigir sozinho um filme baseado nos quadrinhos que inspiraram Sin City visualmente (Spirit, no caso) e fracassa miseravelmente ao tentar fazer a obra de Eisner se parecer com a sua. Eis que ele então retorna para a própria obra – e parece mais perdido do que cego em tiroteio, seja ele no território das damas da noite ou do Senador Roark.
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Quer saber? Miller se tornou a prova viva de que um mestre não pode passar a vida inteira sendo reverenciado sem contestação – porque ele pode se acomodar neste papel. E aí já viu.
O tempo realmente passa para todo mundo. E para alguns, de maneira mais implacável do que deveria.
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