Um único Universo DC pra TV e Cinema? Geoff Johns diz que não. | JUDAO.com.br

E isso, vamos combinar, casa bastante com o histórico da própria DC

Um universo único. Foi esse o grande trunfo da Marvel pra conquistar o sucesso nos cinemas. Afinal, o primeiro Homem de Ferro poderia ter sido só apenas “mais um filme legal pra caralho” se não tivesse surgido a oportunidade de colocar Samuel L. Jackson naquela famosa cena pós-créditos, citando as palavras “Iniciativa Vingadores” em uma fala escrita às pressas por Brian Michael Bendis. Ali, naquele momento, surgia o Universo Marvel dos cinemas. Surgiam Os Vingadores. Surgiam milhares de verdinhas em muitos bolsos.

Anos depois, a Marvel foi comprada pela Disney – um enorme conglomerado, que inclui diversos canais, estúdios, produtoras e, claro, a ABC, um dos principais canais abertos dos EUA. Empreender essa formula de sucesso na TV, unindo-a com o universo dos cinemas, parecia até um caminho natural. Surgia Agents of S.H.I.E.L.D. – e, em breve, teremos Agent Carter, Demolidor, Jessica Jones, Punho de Ferro, Luke Cage e até Os Defensores. Tudo muito legal.

Corta pra Warner. Depois do sucesso desse universo Marvel, muita gente começou a ver como uma “obrigação” que a Casa do Pernalonga fizesse a mesma coisa com o Universo DC. Talvez por falta de crença interna nos heróis que não usam cueca por cima da calça ou orelhas de morcego, ou por qualquer outro motivo, isso demorou pra acontecer. Bom, Batman v Superman: Dawn of Justice foi anunciado, teremos os dois maiores super-heróis da DC juntinhos na tela grande mais a Mulher-Maravilha e um monte de gente – algo que culminará num plano com 88 filmes e com a Liga da Justiça no topo.

Batman VS Superman

Ao mesmo tempo, a Warner Bros. mandou bala em seu esforço na TV. Afinal, se a novata Marvel (mesmo com a força da Disney) estava fazendo isso, o que imaginar então de uma empresa que sempre se deu bem nessa mídia? É aí que começa a verdadeira dominação da DC na TV: se há dois anos só havia Arrow estreando, na temporada 2014-15 veremos as estreias de The Flash, Constantine, Gotham e iZombie – fora planos em andamento pra produções com Supergirl, Novos Titãs e até o LÚCIFER.

Só que aí também ficou claro uma coisa: o universo da TV da DC anda separado daquele do cinema. O Oliver Queen de Arrow não será o mesmo que poderá fazer parte da Liga da Justiça na tela grande, por exemplo. E, provavelmente, nunca saberemos se Gotham e The Flash estão no mesmo universo, afinal, estão até em canais diferentes (no caso, o CW e a Fox). Já a Supergirl, bom, ela provavelmente nunca verá o Flash, não ao menos aquele da série do CW. Parece um enorme CUÉN para os fãs, tendo em vista o Método Marvel para o live-action. Mas... Não é bem isso que pensa Geoff Johns, que é o CCO (o chefão criativo) da DC Entertainment.

“Nós queremos dar liberdade aos criadores... Então eles podem pegar as suas paixões e fazer o melhor programa, o melhor filme, o melhor game sem se preocupar com encaixar em outras coisas”, contou o executivo/quadrinista para a Variety, que credita o sucesso das séries não ao fato de serem do mesmo universo, mas por serem próximas à fonte. “Sim, tem que ser adaptado e expandido, não importando se vai da TV pros quadrinhos ou dos quadrinhos para o filme, mas o DNA é sempre verdadeiro”.

A Caçadora de Arrow

A Caçadora de Arrow

Em Arrow, por exemplo, temos Helena Bertinelli, a Caçadora. A personagem nos quadrinhos é muito ligada ao Batman e, se tudo fosse junto, acabaria obrigando os produtores de Gotham a usar a mesma personagem, caso quisessem ter a Caçadora. Ou ainda, nos novos filmes do Batman do Ben Affleck, também estariam presos à mesma encarnação. O mesmo acontece com o vilão Ra’s Al Ghul, uma peça importante do quebra-cabeça de Arrow e que estará presente na terceira temporada da série, o que é algo que poderia limitar um possível uso em Gotham e/ou em futuros filmes.

Do outro lado do muro, Edgar Wright recentemente deixou a direção do filme do Homem-Formiga por “diferenças criativas”. Ninguém sabe exatamente quais são essas diferenças, mas chutam que seriam coisas no roteiro que a Marvel acreditava serem muito arriscadas. O longa está sendo produzido e pensado há muito mais tempo do que foi definido o tal Universo Marvel nos cinemas e ousaria chutar que algumas dessas “diferenças” podem ter sido também mudanças na história para conseguir encaixar melhor o Homem-Formiga com os outros filmes e séries.

Por outro lado, ao separar o que se você da TV de outra TV e dos cinemas, se perde, por exemplo, o potencial de um impacto como foi o final da primeira temporada de Agents of S.H.I.E.L.D., casando completamente com os eventos de Capitão América: O Soldado Invernal e com toda a certeza levantando a bola pra Os Vingadores: A Era de Ultron. Por outro lado, se não houvesse essa obrigação, a própria série da Marvel poderia ter escolhido um caminho próprio, quem sabe mais interessante (ou não).

Um fundo histórico

Coincidência ou não, os posicionamentos das duas empresas refletem o passado das histórias em quadrinhos. A DC Comics foi uma das pioneiras da mídia, liderando o mercado com folga entre o final dos anos 30 e o começo dos anos 60. Os personagens deles, na época, eram simplesmente os mais conhecidos. Porém, havia pouca ou nenhuma interação entre eles.

Veja bem, tínhamos as equipes, claro. Turma Titã, Sociedade da Justiça e Liga da Justiça estavam lá, fora World’s Finest, que juntou uma galera. Mas um título não combinava com o outro e não havia um senso muito grande de cronologia. Pra piorar, cada herói ficava em sua cidade fictícia. Não era um universo único e coeso, por mais que fosse a mesma coisa.

World's Finest

Na Marvel o pensamento era outro. No começo, houve crossovers entre Namor e o Tocha-Humana original. Depois, nos anos 60, Stan Lee era responsável por escrever praticamente todos os heróis da editora, então começou a fazer com que eles interagissem de forma mais constante, dividissem a mesma cidade (Nova York) e tudo mais. Era, aí sim, o surgimento de um universo com uma cronologia mais exata. Talvez tenha sido meio que o acaso do destino, mas deu certo – e influenciou a DC.

Quando a DC passou a fazer parte do grupo Time-Warner e os personagens foram para outras mídias, passou a se empreender um conceito que dividiu as criações da editora em “propriedades”. A “propriedade” Superman foi negociada com os Salkind e virou uma série de filmes. A “propriedade” Batman virou uma série de filmes por Tim Burton e, depois, Joel Schumacher. A “propriedade” Mulher-Maravilha virou uma série de TV para o canal ABC nos anos 70. A “propriedade” Liga da Justiça entrou num acordo com a Hanna-Barbera e virou os Superamigos. Tudo como pedaços de um bolo – um bolo geralmente muito gostoso, mas que teve uns pedaços podres no meio (como os filmes Mulher-Gato e Lanterna Verde).

Pelos lados da Marvel, a visão não era tão assim. A então Marvel Films Animation produziu algumas séries animadas que mesclavam eventualmente vilões e heróis, ou ainda tinham participações especiais. Porém, quando a Casa das Ideias negociava suas propriedades com outros estúdios – principalmente quando estava perto da falência, no final da década de 90 – particionava seus heróis da mesma forma, como “propriedades”. Fazer um universo coeso live-action só foi possível mesmo anos depois, com uma boa dose de risco, sorte e audácia que foi a criação da Marvel Studios – e a tal cena do Nick Fury... E deu certo.

Assim como a ideia da Warner / DC Entertainment pode também dar certo. E se acontecer isso, mesmo, ótimo: todos nós ganhamos. :)