Bryan Singer já comentou que existem ideias para o crossover e a HQ, que está sendo republicada agora no Brasil, tem nas entrelinhas um caminho até maior do que um simples encontro de heróis
As adaptações dos heróis da Marvel pela Fox sempre tem alguma polêmica envolvida. Se, por um lado, o estúdio parece ter encontrado um caminho para os X-Men, não se pode falar o mesmo do Quarteto Fantástico. E não é só nós que achamos isso: neste momento, o reboot do Quarteto está com 10% no Rotten Tomatoes. Até o diretor Josh Trank foi pro Twitter (e depois deletou) pra dizer que, se o filme fosse como ele tinha imaginado, as críticas seriam positivas. Ou, pra ser bem exato, seriam “Fantásticas”.
Em paralelo, surgem informações sobre um possível crossover na tela grande entre os mutantes e a família fantástica da Casa das Ideias. Bryan Singer, diretor de quatro dos seis filmes do grupo mutante (o último é X-Men: Apocalypse, que tá sendo rodado nesse momento) já disse em entrevista ao Yahoo UK que “as ideias estão rolando. Esse seria um encontro natural, porque ambos são filmes de grupo e há um mecanismo natural para fazer isso”. E ainda deu uma ideia de como juntaria as duas franquias: “Teria a ver com o tempo. Isso é tudo que eu vou dizer”.
Porém, o produtor/roteirista das duas franquias, Simon Kinberg, foi ao New York Daily News contar uma outra história um pouco diferente. “Eles existem em outro universo. O Quarteto Fantástico vive num mundo sem mutantes. E os X-Men vivem num mundo sem Quarteto Fantástico”.
O que talvez Singer e Kinberg não percebam – ou já tenham até notado, vamos dar esse crédito – é que não só esse crossover existe nos quadrinhos, como seria o contexto perfeito para introduzir uma versão definitiva da família heroica no mesmo universo dos mutantes. Algo que funcione melhor pro público.
Fantastic Four versus the X-Men foi uma minissérie em quatro partes publicada no início de 1987. Nessa fase, o Quarteto é aquele conhecido por todos nós – Sr. Fantástico, Mulher Invisível, Tocha Humana e Coisa, que tinha retornado ao grupo depois da passagem da Mulher-Hulk (que também participa da HQ, fazendo quase um Quinteto Fantástico). Do outro lado, os X-Men são bem diferentes daqueles que você conhece.
Charles Xavier, depois de sofrer graves ferimentos, deixou o comando da escola que leva seu nome. O substituto? Magneto, que, nos anos anteriores, havia rejuvenescido, se arrependido do passado vilanesco e até sido ~julgado por uma corte internacional. Jean Grey estava ~morta, Ciclope abandonado o time e a Tempestade, sem poderes, era a líder. Por conta da saga Massacre de Mutantes, Colossus estava preso em sua forma metálica, Noturno em coma e Kitty Pryde, já usando o codinome Lince Negra, se viu presa em sua forma etérea.
Magneto, Tempestade, Wolverine, Vampira, Psylocke e os recém-chegados Destrutor, Cristal e Longshot são os X-Men, com base na Ilha Muir.
Tudo que é bom pode piorar, claro: Kitty está, aos poucos, se desfazendo. Mesmo com o uso de uma contenção especial e dos poderes psíquicos da Psylocke, as células da mente e do corpo da mutante estão se separando aos poucos e, eventualmente, ela vai se desfazer. Magneto então percebe que a única chance dela é um equipamento criado por Reed Richards, o Senhor Fantástico.
Só que Reed tem seus próprios problemas. Em meio à objetos esquecidos no Four Freedoms Plaza, Sue encontra um antigo diário do marido, que revela os erros dele naquela viagem que levou os quatro ao espaço para serem acidentalmente bombardeados pelos raios cósmicos.
Quando a DR vai começar, Reed é salvo pelo gongo: é Magneto em pessoa, pedindo ajuda dos heróis pra salvar Kitty. Relutantemente, Reed, Johnny, Ben e a Mulher-Hulk vão até a Ilha Muir – Sue fica, enfrentando os fantasmas do passado.
Fantasmas que também atormentam a cabeça do Sr. Fantástico. Ele errou antes e colocou os amigos numa vida difícil, será que ele não errará novamente com a Lince Negra? E assim, sem confiar em si mesmo, ele nega ajuda. Wolverine fica puto, enfrenta o ~Emborrachado e a luta começa.
Uma luta típica de seres superfortes. Reed acaba com o olho roxo e a Tempestade com graves queimaduras de 2º e 3º graus no braço... E a disputa só se encerra com a interrupção do... DOUTOR DESTINO!
É Destino que oferece ajuda, afirmando que supera o intelecto de Reed e que pode não só recriar o equipamento do herói, mas também superá-lo. Sem alternativa, os X-Men expulsam o Quarteto e vão até Latvéria vender a alma ao diabo.
De volta à Nova York, Sue conta aos companheiros sobre o diário e eles confrontam Reed. O líder então relembra da origem do time, das pesquisas na época de faculdade e como ele errou ao não contar com os Raios Cósmicos. Só que tinha mais. Ele estava preocupado com o crescimento da ameaça alienígena, que sabia dos efeitos dos Raios Cósmicos e que deliberadamente deixou a blindagem da nave fraca para que eles fossem atingidos.
O Quarteto Fantástico acaba ali.
Ao mesmo tempo em que os mutantes vão até a Europa, os integrantes do Quarteto vão enfrentar seus próprios demônios. Ben, um homem duro de coração mole preso em um corpo de pedra, percebe que tudo que o acidente o privou na vida foi completado do outro lado, com a possibilidade de ajudar as pessoas. Johnny, intempestivo e arrependido pelo que fez com a Tempestade, se dá conta de que não era nada antes do acidente, que deve muito ao Reed. E Sue, ao ver o marido brincar com o filho Franklin, se dá conta de que ele nunca poderia ter escrito aqueles trechos do diário. Ele não é um homem frio e calculista. É um gênio, mas com coração.
Franklin, aliás, tem papel importante na minissérie. É ele, com seus sonhos, que prevê todo esse rolo da briga entre os times, do diário e que faz a ponte com os X-Men, indo em sua projeção astral até a Latvéria para ajudar a Kitty.
No final, claro, tudo se resolve: Reed e Destino trabalham em conjunto e a Kitty é salva. Mas, o ponto alto MESMO, é quando Sue confronta Doom, revelando que sabe que o diário veio dele. Os X-Men e o Quarteto Fantástico se preparam, juntos, pra ter que separar essa que seria a maior briga da história. “Já imaginou, Victor, o quão letal meu campo de força pode ser... Se eu decidir lutar segundo suas regras? [...] Tenha cuidado Victor. Uma leoa é sempre mais perigosa quando defende o parceiro e sua prole. Mas não precisamos falar de provas ou desafios. Porque a partida terminou e nós vencemos”.
Na disputa infantil entre dois homens, é a mulher que demonstra ter as garras mais ameaçadoras.
A HQ é assinada pelo roteirista Chris Claremont, de longa passagem pelos títulos mutantes (e, depois, pelo Quarteto). Tudo bem característico do estilo dele, pro bom e pro ruim. Ou seja, tem um aprofundamento psicológico nos personagens e em seus relacionamentos, mas peca nos recordatórios enormes, balões em excesso e falas que muitas vezes repetem o que tá claro na arte.
Falando na arte, uma confissão: eu não era muito fã do trabalho do Jon Bogdanove. Porém, isso foi mudando aos poucos, ao perceber que o estilo dele consegue deixar ainda mais clara a ação e a movimentação dos personagens, além das próprias expressões em seus rostos. Em Fantastic Four versus the X-Men, Bodganove talvez esteja um pouco com as mãos atadas pelo estilo obrigatório da Marvel naqueles tempos, mas ainda assim o toque dele tá lá — e é ótimo. Fora quando há os trechos em flashback, da origem do Quarteto, no qual o artista fica muito próximo do traço do Jack Kirby. Uma ótima homenagem.
Esquece o que você viu nos filmes do Tim Story. Ou até mesmo no reboot que tá em cartaz. Como o próprio Kinberg disse, são universos diferentes.
Quarteto Fantástico vs. X-Men, o gibi, é, na prática, uma apresentação do Quarteto aos leitores dos mutantes. Cada passagem e cada página define os elementos do time, as personalidades de Reed, Sue, Ben e Johnny, além do histórico. Também apresenta de forma bem interessante quem é Victor Von Doom, esse ódio quase infantil que ele tem por Reed ser mais inteligente do que ele.
Isso tudo, no cinema, cairia como uma luva. Imagina uma continuação de X-Men: Apocalypse, com os mutantes buscando ajuda após os ferimentos sofridos por integrantes do time durante a batalha contra o Apocalipse. Pronto, encontram Reed e um Quarteto já estabelecido, operando em Nova York — mas não precisa ser necessariamente tão velhos, com um filho. Claro, existe o diário, flashbacks, e o Sr. Fantástico é confrontado com o fato de ter enviado ele e os amigos ao espaço não porque temia o perigo alienígena, mas sim o perigo mutante. Von Doom se coloca no meio, os times brigam...
Obviamente teriam que mudar o final. Uma disputa científica entre Victor e Reed pra ajudar uma garotinha fica legal numa minissérie dessas, mas não funciona na tela grande. Pode ser aquele clichê mesmo: Destino está colaborando só pra usar os poderes de um dos X-Men feridos pra um plano mais elaborado. Os times descobrem e vão finalmente lutar contra o real inimigo. Fim.
Além de ser uma disputa épica, que movimentaria muito a bilheteria pelo lado mutante, a Fox poderia se dar ao luxo de colocar um Quarteto Fantástico consolidado, já em ação, próximo daquelas características que fizeram as melhores HQs da equipe. Nada de filme de origem, por mais que a origem estivesse lá no meio. A história pode até se passar nos próprios anos 80, década no qual está atualmente a franquia dos mutantes e na qual se passa a minissérie original. Talvez até o Quarteto funcione melhor numa época (um pouco) mais inocente do que hoje.
Depois, com todos os demônios exorcizados, é só continuar a franquia dali.
Bom, se X-Men: Apocalypse fizer o sucesso esperado, assim como Batman vs. Superman (por ser o primeiro filme de embate entre super-heróis, também criado pra introduzir um Batman já em ação), podemos dizer que esse caminho vai ficar cada vez mais óbvio lá pros produtores do Estúdio da Raposa.
Até porque, não sei, o futuro não parece ser muito promissor pra continuações desse filme que tão lançando agora...
Se você é meio cético sobre a possibilidade de ver Quarteto Fantástico vs. X-Men no cinema (ou que, sei lá, isso seja BEM FEITO), ao menos dá pra ler a HQ. A Panini está republicando agora no Brasil a minissérie como parte do encadernado Vingadores vs. X-Men vs. Quarteto Fantástico.
Como o nome entrega, a edição traz também as quatro edições de The X-Men vs. The Avengers, outra minissérie de 1987. A história, que é escrita pelo Roger Stern e desenhada pelo Marc Silvestri, também traz uma versão bem diferente dos Vingadores — que, na época, tinham Capitão América, Thor (que tava longe da melhor forma), Capitã Marvel (Monica Rambeau), Cavaleiro Negro, Dr. Druida e Mulher-Hulk (sim, ela tá nas duas histórias) — indo atrás do Magneto pelos crimes que cometeu no passado, enquanto o próprio só pensa em recuperar equipamentos do finado Asteroide M.
A história, apesar de alguns bons momentos e de servir como uma bela parte da transição do Magneto de vilão à herói, acaba se perdendo em clichês da Guerra Fria (os Supersoldados Soviéticos tem bastante importância, junto com o Dínamo Escarlate) e num enredo apenas “ok” praqueles tempos. É bom dizer também que a formação dos Maiores Heróis da Terra não ajuda muito.
De qualquer forma, a Panini faz um bom trabalho nessa edição, publicando num momento pertinente sobre rumores (e vontades) de ver essas superequipes saindo na mão no cinema. Poderiam apenas ter mantido a ordem correta de publicação: enquanto cronologicamente a luta entre X-Men e Quarteto Fantástico acontece antes, a edição traz primeiro o embate contra os Vingadores. Pra piorar, erraram nas datas das publicações originais, o que confunde ainda mais nisso.
Ao menos há indicação pra todas as histórias referenciadas no enredo, seja pra republicações mais recentes, pras publicações originais (quando não há reedições) ou pra edição original (quando nunca saiu por aqui). No final, tem também os primeiros encontros entre esses personagens, na época de Stan Lee e Jack Kirby.
Esse pode não ser o melhor da Marvel, mas, com toda a certeza é um pedaço importante da história, que poderia render um bom filme. Pena que você não tem (agora) a chance de vê-lo no cinema mais próximo, apenas na banca mais próxima de você...