2015, o ano das minas | JUDAO.com.br
18 de dezembro de 2015
Etcetera

2015, o ano das minas

De Maria do Rosário a Viola Davis, passando pelas minas das Ocupas

Jessica Jones. Think Olga. Viola Davis. Laerte. Shonda Rhimes. Deputada Maria do Rosário. Jamie Clayton. Mães de Maio. Patricia Arquette. Clarice Falcão. Jennifer Lawrence. Malala. Pitty. Emma Watson. Abuelas de Plaza de Mayo. As meninas guerreiras das Ocupações escolares em São Paulo e Goiás. Estou sendo injusto, com absoluta certeza, pois são muitas mais, mas 2015 foi o ano delas. Não o ano de homenagens aguadas com rosas vermelhas na mesa da firma ou na porta do colégio no Dia Internacional da Mulher, mas um ano de luta, finalmente, visível.

Ofensa por ofensa, conquista por conquista, olho por olho, mente por mente, elas sangraram sob o cassetete da PM ou subverteram Holywood, a imprensa ou mesmo o Congresso Nacional com discursos sobre igualdade racial, de espaço, por direitos, contra o silêncio conformista que as assassina dia a dia, mês a mês, ano a ano.

As subestimadas hashtags marcaram um ano de militância com popularidade inédita nas redes sociais, quando #meuprimeiroassédio, encampada pelo coletivo Think Olga e motivada por atitudes pedófilas abertas sobre uma participante de 12 anos do MasterChef Júnior nas redes sociais, ganhou Trending Topics mundo adentro e trouxe para o celular nas mãos de todo mundo o horror da violência verbal e física contra a mulher desde a mais tenra idade.

Após defender a Comissão da Verdade e a investigação dos crimes cometidos por militares no período da Ditadura Militar, a deputada Maria do Rosário teve que lidar com uma tentativa de repressão que não podia prever, embora fosse previsível o emissário da nojeira: Jair Bolsonaro.

Acostumado a falar os maiores absurdos no plenário da Câmara ou mesmo aos microfones da mídia e não sofrer qualquer repreensão, o deputado afirmou que “não estupraria Maria do Rosário porque ela não merecia”. Pois o silêncio acabou ali, processado pela deputada, Bolsonaro foi finalmente condenado a alguma coisa, no caso, o pagamento de uma minguada indenização de 10 mil reais. A vitória, no entanto, não é sobre dinheiro, mas evidenciar que defensores do estupro não mais passarão batidos.

Não a citei na abertura do texto, mas um fato em especial destaca a presidente da República, Dilma Rousseff, em meio a essa retrospectiva, que é a Lei do Feminicídio, bandeira pela qual ela e suas companheiras de luta batalharam por anos e finalmente emplacou.

O feminicídio é caracterizado quando a mulher é assassinada justamente pelo fato de ser mulher, algo sempre negado pela hipocrisia da sociedade macha brasileira, mas superada no momento que a lei foi sancionada. Vitória histórica da verdade.

https://www.youtube.com/watch?v=685jYZGcFh8

Em Hollywwod, Viola Davis fez história ao receber o Emmy de Melhor Atriz, abordando a questão da falta de oportunidade a atrizes negras na indústria. Patricia Arquette também fez bonito no primeiro semestre, ao abordar o abismo salarial entre homens e mulheres no mesmo mercado.

Jeniffer Lawrence veio a público com um artigo sensacional sobre o mesmo tema, onde deixa claro o constrangimento que é falar de dinheiro num mundo onde as mulheres precisam parecer legais para serem aceitas num clube de homens, mesmo quando subjugadas por tratamentos que as inferiorizem.

Em meio a um processo de impeachment que beira a ilegalidade, onde alegações machistas são utilizadas o tempo todo para desclassificar a Presidente da República, uma força feminina explodiu no Estado mais conservador da Federação quando o Governador Geraldo Alckmin, motivado por sua busca pela privatização do ensino em São Paulo, teve que lidar com protestos pacíficos e Ocupações absolutamente produtivas das escolas.

A resposta de Alckmin foi o esperado uso daquele recurso universal que ele tanto estima: a PM. Violência do Estado contra menores de idade, alguns na faixa dos 12 anos, e um espetáculo vergonhoso de bombas de efeito moral e surras vieram na sequência.

O procedimento policial rendeu que a Justiça não concedesse a reintegração de posse das escolas por considerar as manifestações legítimas e desmoralizou mais uma vez a truculência do governo de São Paulo, que suspendeu a organização, primeiro por pressão, e agora por força da Justiça, que ainda o obriga a tomar o remédio mais amargo para ditadores de meia tigela: conversar com o povo antes de decidir algo sobre a educação.

A luta da Malala pelo acesso a educação pelas meninas, a militância das Mães de Maio contra a repressão assassina do Estado brasileiro, as manifestações da Laerte sobre as questões de gênero no país que mais mata transsexuais no mundo, a narrativa feminina badass de Jessica Jones, a batalha por identificação e recuperação de filhos e netos desaparecidos na ditadura militar argentina assumida pelas Abuelas de Plaza de Mayo, o #heforshe de Emma Watson na ONU e pelo planeta e tantos outros exemplos vieram à tona com força e convergiram em 2015.

O caminho é longo e a luta só está começando, mas a esperança fecha o ano de mãos dadas com as minas e cabe aos homens virmos logo atrás, seguindo o coro.

Para encerrar com um astral digno delas, taí Laerte lendo “Filó, a Fadinha Lésbica”, da infalível Hilda Hilst. Boas festas e um 2016 coisa linda pra nós.