Contos do Amanhã, filme do diretor Pedro Marques, já está em pre-produção e pretende derrubar preconceitos típicos que rondam a produção nacional
O ano é 1999. Um jovem recebe alguns arquivos de áudio com estranhos depoimentos sobre um crime que vai acontecer no futuro. É a partir daí que passa a se desenvolver uma trama de ficção científica que, pulando para 2165, vai mostrar uma grande cidade devastada por catástrofes climáticas e governada por uma organização secreta. Parece atraente o suficiente para você? É, então que tal você pensar que a sinopse deste filme está ambientada não em Nova York (sempre ela...) ou Londres/Paris ou qualquer variante europeia possível, mas sim no Brasil. Ah, claro, então é em São Paulo ou no Rio de Janeiro? Não, errou de novo. Estamos falando de Porto Alegre.
O garoto é um estudante de nome Jefferson – e os áudios que recebe dizendo respeito ao sequestro de Michele de Madeiros, importante figura política cujo desaparecimento pode disparar uma verdadeira guerra civil na chamada Porto Zero Um.
O responsável pelo filme, batizado de Contos do Amanhã, o diretor Pedro Marques sabe da cultura bairrista que existe em seu estado, mas justifica a escolha em um papo exclusivo com o JUDÃO. “A trama se passa em Porto Alegre, mas poderia ser em qualquer cidade do mundo. O foco não é a cidade, mas sim como os habitantes se organizaram depois do evento. Mas de uma certa forma, a ideia de uma cidade no sul da América Latina ser uma das únicas sobreviventes a uma catástrofe é algo curioso e que foge do que estamos acostumados a assistir. Algo a ser pensado”. E completa, bem-humorado: “Para você ter uma ideia, recentemente a ONU considerou Porto Alegre como uma das cidades com grande capacidade de resiliência após uma catástrofe climática. Então acho que estamos no caminho”.
Atualmente em pré-produção, Contos do Amanhã é um projeto da Bactéria Filmes e marca a estreia de Marques, que tem mais de uma década de experiência como diretor de televisão e voltado ao mercado publicitário, nos cinemas. As filmagens, envolvendo um elenco de cerca de 21 atores, devem se estender até março do ano que vem, passando não apenas por Porto Alegre, mas também por algumas cidades do interior e do litoral do Rio Grande do Sul.
O cineasta conta que a ideia surgiu numa manhã muito quente de verão em Porto Alegre, há mais ou menos uns dez anos. “Levantei cedo, com muita sede e não havia água na torneira. O filtro estava seco e na geladeira não tinha nada para beber. Saí então minha busca por água. O mercado em frente ao prédio estava fechado e precisei caminhar algumas boas quadras com sede e muito calor. Nesse momento pensei na minha fragilidade, pois mesmo com dinheiro em mãos não conseguia encontrar água. Pensei no quanto somos vulneráveis e dependemos de coisas tão simples e tão frágeis quanto a água. Pensando sobre isso, e aquecimento global e tal, comecei a refletir em como nos organizaríamos caso tudo fosse subitamente modificado por alguma força maior da natureza e como seriam as nossas vidas”.
Organizando aqueles que seriam os relatos dessas pessoas num futuro apocalíptico, começaram a surgir os primeiros contos, que ele foi guardando. “O primeiro roteiro com o título Contos do Amanhã surgiu há oito anos e era um curta-metragem; o de longa-metragem, há quase dois anos”.
Em 2013, Contos do Amanhã foi selecionado no edital para receber o apoio financeiro do Fumproarte, o Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural de Porto Alegre. Com esta verba, conseguiu garantir a produção de sets virtuais, cenas subaquáticas e a integração de computação gráfica 3D com ações reais, entre outras ferramentas que se fazem necessárias em uma produção contemporânea de ficção científica. Aliás, Marques sabe exatamente que um dos principais questionamentos com relação às produções brasileiras de gêneros como fantasia, terror e ficção científica são justamente os efeitos especiais. “Nosso objetivo é fazer com que o efeito visual seja um suporte para ajudar a contar a história, para retratar esse universo pós-apocalíptico, futurista”, confessa. “Achar a medida certa na utilização fica mais fácil quando você tem um orçamento limitado, pois você precisa aproveitar ao máximo os recursos que tem, pensar muito em cada plano e no impacto que ele deve gerar”.
Marques tem experiência no assunto, já que foi supervisor de efeitos visuais no elogiado longa de zumbis Porto dos Mortos, do colega gaúcho Davi de Oliveira Pinheiro (que, aliás, será produtor executivo de Contos do Amanhã), além de ter atuado como motion designer em Xico Stockinger, documentário sobre o escultor austríaco naturalizado brasileiro de mesmo nome.
Para o lançamento, a primeira ideia é justamente disponibilizar o filme gratuitamente na internet, junto com tutoriais de produção para atingir os interessados da área durante a realização do projeto. “O objetivo é mostrar cada detalhe, da criação até a finalização, e assim apresentar mais do que o filme, mas todo o processo”, planeja Marques. Além disso, a equipe estuda possibilidades para o lançamento simultâneo na TV, cinema e VOD (video on-demand). “Um dos focos do filme é a distribuição internacional, para isso o filme será lançado já com legendas em espanhol e dublado em inglês. Além de uma versão com tradução em libras, prevendo uma acessibilidade maior à produção”, revela.
Mais informações a respeito da obra estão disponíveis em www.contosdoamanha.com.br.