Grande nome por de trás das animações da DC nos anos 90 e 2000 está de volta com um conceito novo em Liga da Justiça: Deuses e Monstros — pena que a edição nacional do lançamento não esteja a altura dele
Esquece o Superman escoteiro, filho de Jor-El, criado por uma família de fazendeiros do Kansas. Desencane da Mulher-Maravilha princesa das Amazonas, que vai até o mundo do patriarcado como embaixadora das mulheres mais fortes da mitologia. Muito menos lembre do Batman rico, filho de Thomas e Martha Wayne, que foram assassinados num beco em um crime que motivou o filho a se vestir de Morcego para instigar o medo nos corações dos criminosos.
Esqueça tudo que você leu, viu ou assistiu sobre esses super-heróis.
Seja bem-vindo ao novo mundo de Bruce Timm, que ganha forma definitiva no filme animado Liga da Justiça: Deuses e Monstros, que acaba de ser lançado no Brasil e nos EUA.
Se você não conhece, ao menos já deve ter ouvido falar do nome de Timm. Ele foi o produtor, animador, designer de personagens e quadrinista que desenvolveu (ao lado de Eric Radomski) a já clássica Batman: The Animated Series, nos anos 90, e, dali em diante, começou a produzir aquele que hoje é o Universo DC Animado, com The Adventures of Batman & Robin, Superman: The Animated Series, The New Batman Adventures, Batman do Futuro, Super Choque, Projeto Zeta, Liga da Justiça, Liga da Justiça Sem Limites…
Em 2013, Timm deixou o cargo de produtor supervisor da Warner Animation, pelo qual cuidava dos filmes que eram adaptação das HQs da DC (outro projeto de sucesso), e tirou um período pra desenvolver uma nova ideia, justamente de uma visão própria dessa mitologia toda.
Nascia assim Deuses e Monstros.
O projeto já começou inovador, simplesmente por envolver mídias diferentes pro mesmo objetivo. Primeiro veio uma série animada com três episódios para a web, via Machinima, que serviu para introduzir as encarnações completamente diferentes de Superman, Mulher-Maravilha e Batman — sobre a qual já falamos aqui no JUDÃO. Todos vivendo num outro Universo DC, mas que mantém o famoso traço do Bruce Timm.
Além disso, junto com o filme, estão sendo lançadas nos EUA quatro HQs que contam ainda mais da origem desses heróis e de sua Liga da Justiça. Mas... Não se preocupe, você não precisa ler e ver tudo isso pra conseguir curtir o filme.
O longa começa revelando como o Superman pode ser filho de Zod e como foi criado por imigrantes latinos, sob o nome de Hernan Guerra. Pouco depois, já nos mostra que o Batman não é Bruce Wayne, mas sim Kirk Langstrom, que os leitores dos gibis conhecem como Morcego-Humano. Quem pode deixar os telespectadores um pouco mais confusos é a nova Mulher-Maravilha, que não é Diana, mas sim Bekka, uma integrante menos conhecida dos Novos Deuses criados por Jack Kirby. Na nova versão, ela assume um posto parecido com o do Senhor Milagre nas HQs clássicas e, no processo, vem pra Terra.
Mas, na boa: também não encane muito com essas referências. Elas são o tipo de joia pros fãs, mas que não fazem muita falta pro espectador eventual. O mais importante é entender que são heróis que não tiveram uma vida perfeita, como suas contrapartes originais. Eles sofreram, passaram por coisas horríveis e não possuem a bondade no DNA. É a Tríade da DC que mata sem pensar duas vezes, se for necessário.
O importante é que o filme funciona com um conceito que pode parecer pra alguns que já tá ficando batido (é só lembrar de Injustice, ou da antiga Terra-3 dos próprios gibis). Há uma ou outra falha — como, por exemplo, não dar uma transição clara entre o que rola no passado e no presente no começo do filme, mas Deuses e Monstros tem um enredo bem interessante, fechado e com um certo ar de mistério. Serve pra definir bem não um fim, mas um começo de jornada pra essa nova Liga da Justiça alternativa.
Problemas MESMO, porém, são com a versão brasileira. Pra começar, a Warner ainda mantém a ~tradição de lançar os filmes animados da DC apenas em DVD, sem versão em Blu-ray – isso em 2015. O único extra que acompanha essa edição é um preview, com entrevistas, do próximo filme deles, Batman: Bad Blood.
Enquanto isso, nos EUA, a versão em BD vem com extras sobre realidades alternativas, os Novos Deuses, a produção de Deuses e Monstros, desenhos animados antigos de bônus... Aliás, lá tem até uma edição especial com o action figure da Mulher-Maravilha, justamente num momento que se debate o protagonismo feminino e a presença das mulheres em produtos licenciados.
Outra questão também é a dublagem. Veja, só há uma coisa pra reclamar dela, tecnicamente falando: a tradução de “mother box” pra “caixa mãe”, e não “caixa materna”, como é feito nas HQs há décadas. Porém, a questão é mais na escalação das vozes.
Nesses filmes normalmente os produtores procuram escolher nomes diferentes, atores e dubladores que podem trazer algo a mais pra uma encarnação alternativa. Tanto é que, em inglês, o Superman é dublado por Benjamin Bratt (que você deve conhecer como o detetive Rey Curtis de Law and Order), Batman por Michael C. Hall (o DEXTER!) e a Mulher-Maravilha pela Tamara Taylor (a Dr. Camille Saroyan de Bones).
Agora, veja como é no Brasil: o Homem de Aço é dublado pelo onipresente Guilherme Briggs e a Maravilhosa pela Priscila Amorim, os mesmos das séries animadas do começo dos anos 2000 e de vários dos filmes mais recentes. O Cavaleiro das Trevas tem a voz do Duda Ribeiro, que também tem se tornado uma das vozes-padrão do herói.
Sempre o mesmo de sempre.
Inovação. Foi isso que prometeu (e está cumprindo) o Bruce Timm. Tá na hora da Warner Brasil assumir o mesmo espírito.