Quinta-feira nos cinemas | JUDAO.com.br
28 de fevereiro de 2014
Filmes

Quinta-feira nos cinemas

A partir do dia 13 de março, a nova programação dos cinemas começará nas quintas-feiras, incluindo as estreias — mas, o que está por de trás dessa mudança? E o que isso mudará na rotina do mercado, do público e da imprensa?

“Quinta-feira nos cinemas”. Em breve, é isso o que você vai ouvir aquele véio falando e é o que vai aparecer no fim dos trailers. Não vai ser erro ou um feriadão, não. A partir do dia 13 de março, as quintas serão o dia oficial das estreias dos filmes aqui no Brasil.

Isso significa, por exemplo, que aquelas primeiras exibições de 0h vão fazer você ir pro cinema na noite de quarta-feira, que toda a sua rotina de sair do trabalho ou da escola na sexta-feira e ir assistir a um filme estreando vai ter de ser adiantada em um dia, que nós teremos um dia a menos pra escrever sobre esses filmes, as empresas de cinema — distribuidoras e exibidoras — vão ter de mudar completamente o esquema de trabalho e, é ÓBVIO, isso tudo pode refletir na sua ALGIBEIRA.

Sem HISTERIA, fomos atrás de todos os envolvidos pra entender melhor essa história — as razões e os reflexos disso. Porém, há mais, MUITO mais do que os posicionamentos oficiais (ou, em alguns casos, a falta deles) dão a entender.

A mudança de datas já é uma discussão antiga entre o pessoal que produz e/ou lança cinema no Brasil. Quando você fala em grandes cidades, como São Paulo e Rio, a sexta-feira já deixou de ser há tempos o “começo do fim de semana”, comportamentalmente falando. Talvez pelos novos tempos, talvez pelos lugares extremamente lotados nas sextas, a quinta se tornou também um dia para bares, baladas e por aí vai. Assim, a quarta-feira vai virando opção pra quem quer ser mais alternativo...

Mas a questão não é o bar, a balada, a NIGHT. É o cinema em geral. Os exibidores começaram a ficar pra trás com essa mudança de comportamento, já que eles não têm nada de novo nas quintas, só os filmes da semana anterior, salvo raríssimas exceções relacionadas as feriados ou pré-estreias. Essa, então, passou a ser a principal justificativa para a troca de datas. “Hoje a quinta-feira é agitada, animada em várias cidades do Brasil. Mas o público interessado em filmes não encontra novidade neste dia. A partir de 13 de março, o cinema entra também no cardápio de opções da quinta-feira”, comentou Paulo Lui, presidente da Federação Nacional das Empresas Exibidoras Cinematográficas (FENEEC) no comunicado que oficializou a decisão. O posicionamento foi acompanhado pela Cinemark, que apoiou — e, pelo que ouvimos, foi um dos principais INCENTIVADORES da decisão. “A quinta-feira é um dia de grande afluxo de público para as diversas ofertas de entretenimento. Com a mudança, os cinemas passam a entrar no cardápio de opções do espectador, agora com os filmes novos”.

Cinema

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Ouvindo as distribuidoras

[/one-half][one-half last=”true”]As distribuidoras — também conhecidas como as empresas que colocam os filmes nos cinemas depois de longas e muitas vezes complicadas negociações com os exibidores — não necessariamente pensam da mesma maneira. A Sony e Universal, que trabalham conjuntamente no Brasil, foram as únicas entre as chamadas majors que se posicionaram. “Esta foi uma decisão exclusiva dos exibidores, responsáveis pelo relacionamento com o público. De nossa parte, a única coisa que pedimos foi para que o dia de estreia fosse o mesmo para todo o País”, afirmou Rodrigo Saturnino, diretor geral. Por outro lado, o vice-presidente da independente PlayArte Pictures — que também atua como exibidora –, Otelo Bettin Coltro, comentou para o JUDÃO que “a mudança é positiva”.

Enquanto isso, a Fox informou que não havia um executivo disponível pra responder sobre o assunto; a Warner disse que não se pronunciará sobre a mudança; a Paramount afirmou que o diretor que poderia nos responder sobre isso não está falando sobre o assunto; e a Disney simplesmente não respondeu os nossos contatos.[/one-half]

Bastante estranho esse silêncio todo, já que, segundo o que a gente ouviu de fontes de dentro desse mercado, apenas UMA dessas majors se opôs. E essa quase unanimidade faz bastante sentido: o primeiro fim de semana é justamente aquele que indica o sucesso e fracasso do filme (com um dia a mais, também ganha-se tempo para turbinar a divulgação na mídia nesse período) e a semana de estreia é aquela que traz a maior fatia da bilheteria para a distribuidora, e não para os cinemas. Ganhar a quinta como parte do FDS é claramente positivo para elas, financeiramente falando.

Outra justificativa oficial usada pela FENEEC foram os filmes médios e nacionais — aqueles que tem até um número razoável de salas na estreia, mas não tem a mesma força na divulgação. “Eles ganham mais um dia de boca a boca”, explicou Lui. Coltro, da PlayArte, também vê vantagens para o público em geral. “A mudança permitirá ao público conhecer um dia antes os grandes lançamentos. Agora temos um final de semana de 4 dias ao invés de 3, o que dá mais flexibilidade para o público escolher quando assistir ao seu filme preferido em primeira mão”, conta.

Ok, muda-se o dia e acompanha-se os novos tempos. Mas é só isso? Não.

Além da quinta ser um dia mais vazio nos cinemas — aquela coisa de todo mundo já viu as novidades e tá esperando mais –, também é um dia no qual se cobra uma tarifa menor que a do fim de semana, mas igual a de segunda e terça. Nenhuma exibidora ainda confirmou o aumento de preços de quinta-feira, mas a ação é praticamente certa, por conta dos lançamentos que passarão a ter na vitrine. Dessa forma, você aumenta o rendimento financeiro na semana, fazendo um dia antes vazio não só ter mais público, como também render mais. Isso sem falar que, claro, o aumento de preço vai se estender aos longas que já estão na sua segunda, terceira, quarta semanas e por aí vai.

No final das contas, quem fica com o impacto negativo é o bolso do público? Não exatamente. Pensa comigo: quem vai aos cinemas às quintas, hoje? Pouca gente. No máximo, é pra ver aquele filme que você não liga de ver na estreia, prefere a sala mais vazia, esse tipo de coisa. Comportamento que você pode ter nas segundas, terças e quartas-feiras — sendo que este último, vamos lembrar, é o dia do desconto na maioria das redes exibidoras.

Fila do Cinema

Mudando o jogo

Quando falamos da realidade das distribuidoras no Brasil, nem sempre é uma tarefa fácil determinar o dia da estreia de um longa-metragem. Nos casos de alguns blockbusters, filmes de grande investimento de uma distribuidora em todo o mundo, é a matriz quem dita a data. Outras vezes, de forma até que comum, a distribuidora tem uma janela com datas possíveis para o lançamento e, a partir daí, define o melhor fim de semana. Uma semana a mais ou a menos nessa conta pode ter vários resultados financeiros, influenciados pela pirataria (vinda de lugares nos quais o longa já foi exibido), feriados nacionais, regionais, Copa do Mundo, final de campeonato e por aí vai.

Só que fica a pergunta: com as estreias acontecendo nas quintas, teremos produções com lançamento mundial chegando ao Brasil um dia antes? Ou uma semana depois? A nota oficial da FENEEC apenas afirma que “alguns filmes estrearão no Brasil antes até que em seus países de origem, como os Estados Unidos” – algumas mudanças na data de estreia, como a de O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro (de 2 para 1º de maio), Guardiões da Galáxia (1º de agosto para 31 de julho) e Need for Speed (14 para 13 de março) corroboraram essa afirmação. Porém, novamente Warner, Fox, Disney, Sony/Universal e Paramount não responderam ao JUDÃO sobre esse assunto. Apenas a PlayArte comentou, afirmando que já é procedimento padrão em outros mercados nos quais as estreias ocorrem nas quinta (cerca de 20) que os filmes cheguem um dia antes do que nos EUA.

Fomos ver, então, ao que acontece justamente nos países que já adotam a quinta-feira como o dia das estreias pra conferir isso. No caso, escolhemos Portugal e Argentina. Não dá para dizer que é uma regra, mas com O Espetacular Homem-Aranha 2 e X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido, entre outros, as estreias rolam antes dos Estados Unidos. No caso do Cabeça-de-Teia, o adiantamento é maior que um dia: uma semana na Argentina e DUAS semanas em Portugal, situando a estreia em 17 de abril, provavelmente no início da janela estipulada pela Sony matriz. Por outro lado, Guardiões da Galáxia estreia em 24 de julho para os hermanos (uma semana antes do Brasil e oito dias antes dos EUA), mas chega apenas em 8 de Agosto para os portugas.

No final das contas, não dá para botar um possível adiamento de filmes no futuro na conta das quintas-feiras – mas sim na estratégia das próprias distribuidoras. A mesma que, por exemplo, fazia com que os filmes da Marvel estreassem por aqui uma semana antes dos EUA.

O que pelo jeito parece estar preocupando mais as distribuidoras não são exatamente as estreias mundiais, mas sim as decisões a partir da segunda semana de exibição, já que as empresas trabalham com a bilheteria geral do fim de semana anterior para programar a semana seguinte. “A pressão vai aumentar muito, pois as programações terão que ser fechadas agora às segundas-feiras, quando antes esperávamos rendas de segunda pra fechar, senão teremos problemas de logística para que cópias e DCPs [Digital Cinema Package, o filme em formato digital] cheguem aos cinemas a tempo — ou seja, até quarta-feira. Mas acho que mesmo assim compensa”, explica Coltro, da PlayArte.

Coletiva de imprensa de RoboCop, no Rio de Janeiro

Coletiva de imprensa de RoboCop, no Rio de Janeiro

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E nós, a imprensa?

[/one-half][one-half last=”true”]É bom lembrar que a vida não vai mudar apenas para o público, distribuidoras e exibidores. Também muda para nós, jornalistas e veículos de comunicação. No caso dos veículos diários, basta apenas falar sobre as estreias um dia antes. Sim, é isso que faremos aqui no JUDÃO.

Mas há um tipo de publicação que será altamente impactada pelo troca-troca. São os famosos guias, os encartes que vêm junto com os grandes jornais, como O Globo, Folha de S.Paulo, Estadão, Diário do Nordeste e por aí vai. A publicação desses encartes acontece historicamente nas sextas, trazendo o que tem de bom desse dia até a quinta seguinte – incluindo as estreias e a programação dos cinemas.[/one-half]

Nenhum jornal ainda se pronunciou oficialmente sobre alguma mudança no dia da publicação, mas isso não quer dizer que as redações não tenham debatido o assunto internamente. “A princípio, o Divirta-se continua com veiculação às sextas”, afirma o repórter Gabriel Perline, que trabalha tanto no guia quanto no Caderno 2 do Estadão. “E é bem provável que isso não se altere, pois Cinema é apenas um dos conteúdos que trabalhamos e qualquer mudança neste sentido demandaria estudos para entender a aceitação do leitor e também a do mercado anunciante”.

Na prática, Perline vê um impacto maior para quem usa o Divirta-se e outros guias do gênero para se programar, “pois os filmes passam a estrear no último dia de vida útil de cada edição do Divirta-se (“nascemos” às sextas e “morremos” às quintas). Antes, ele pegava a revista, batia o olho nas estreias, e no mesmo dia podia ir ao cinema e ver uma das novidades. Agora, terá que esperar até a próxima semana para assistir aos filmes que recomendamos”. Em cabines de imprensa, o que nós ouvimos, porém, foi uma grande reclamação relacionada a possíveis fechamentos mais cedo, além do pouco tempo que se tem muitas vezes pra assistir a um filme e escrever sobre ele.

Ou seja: os jornais vão se adiantar em uma semana (quando possível, algo que, como sabemos, nem sempre é) nas resenhas e indicações de estreias. Você vai ler na sexta sobre o filme que vai ser lançado apenas na outra quinta — o que evitaria, ao menos, do guia já chegar velho na banca. Só há, talvez, um componente importante que pode mudar isso. Quem paga o jornal é a publicidade e, de certa forma, os guias são uma vitrine para divulgação publicitária dos grandes filmes — o que perde um pouco do sentido se o caderno sair uma semana antes ou um dia depois da estreia. Se a receita cair, pode apostar que os diários vão também começar a estudar alguma mudança em seus guias.

ENFIM. Grandes mudanças estão por vir. Resta, agora, ver se as pessoas vão se acostumar e se tudo isso se refletirá (ou não) em um público maior curtindo uma pipoca e um filme na boa e velha sala de cinema. ;)