Tudo o que leu e ouviu depois suas denúncias contra Harvey Weinstein só a fez mais forte, principalmente porque ela não está sozinha.
“Se há alguém em quem não acredito é Asia Argento. Como pessoa, ela é muito servil. Nunca pedi a ela para me bajular, mas ela é esse tipo de pessoa. Se há uma pessoa capaz de se defender sozinha, que não é reservada sobre sexo, que inclusive faz bastante e deseja igualmente homens e mulheres, essa pessoa é ela. [...] Acho que ela é mercenária e traidora.”
Foi isso que Catherine Breillat, que dirigiu Asia Argento em A Última Amante, falou sobre as denúncias de assédio sexual feitas pela atriz, diretora e roteirista italiana contra Harvey Weistein ao podcast Murmur Digital — as mesmas denúncias que, nessa segunda-feira (16), renderam ao New York Times e à revista New Yorker o prêmio Pulitzer de jornalismo de 2018.
Num texto intitulado “Primeiro elas cedem, depois reclamam e fingem se arrepender”, que começa com uma imagem de Asia com um cachorro, o colunista italiano Renato Farina também atacou a atriz, afirmando que “ceder aos avanços sexuais de seu chefe é prostituição, não estupro”. Além disso, pra justificar que ela “mereceu o tratamento que teve”, muitos veículos alegaram que ela teria namorado com Weinstein por anos, o que ela nega veementemente — COMO SE isso fizesse alguma diferença.
Foi esse tipo de coisa que fez com que ela se mudasse, pelo menos temporariamente, para a Alemanha e que, durante um painel na conferência Women In The World, em Nova York, ao lado de Ambra Gutierrez (modelo que gravou o momento em que Harvey tentou coagi-la a entrar no banheiro para “lhe fazer companhia” enquanto tomava banho e foi levada para uma festa sexual de Silvio Berlusconi aos 18 anos de idade) revelasse que esses comentários só a fizeram mais forte. “A repercussão serviu como combustível para a minha raiva. Esse ódio, esse martírio em ser incompreendida fez de mim uma guerreira.”
Esse ódio, esse martírio em ser incompreendida fez de mim uma guerreira
Duvidar do depoimento da vítima é uma das grandes formas de perpetuação da impunidade do agressor, e se nem mesmo Asia Argento, sendo quem é, filha de quem é, está livre disso, pensemos então em mulheres anônimas. O fato de seu relato ter sido visto com desconfiança é uma das ramificações do machismo intrínseco às relações sociais.
Em entrevista à BBC Brasil, Silvia Chakian, promotora de justiça do Ministério Público de São Paulo afirma que “existe essa perversidade na análise da palavra da mulher vítima de violência sexual. A análise do comportamento é deslocada para a vítima, não para o violador.”
É importante dizer que, no Brasil, segundo um levantamento do Ipea, 58,5% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a afirmação que “se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros”, enquanto histórias sobre abuso dentro do ambiente audiovisual brasileiro aparecem cada vez mais, mostrando um cenário absolutamente assustador.
Por esses motivos, campanhas como #MeToo ou #MeuPrimeiroAssédio são importantes. Com essa grande e recente onda de relatos, é importante perceber que não estamos sozinhas. Estamos com Asia, com Ambra, com todas que já denunciaram e que ainda vão denunciar situações tóxicas que já não podem mais ser normalizadas.
Estamos juntas, enfim.