8P! Matanza: "se bebêssemos a metade do que cantamos nas letras, não haveria banda" | JUDAO.com.br

A banda fala ainda sobre a morte do rock, sobre o complexo de coitadinho dos músicos nacionais…

Eles podem não ser necessariamente uma das bandas que mais toca nas rádios (na verdade, o pouco espaço que tem fica restrito às chamadas rádios-rock) – mas é impossível falar de rock no Brasil, principalmente nos dias de hoje, sem citar os cariocas do Matanza, um dos atuais grupos favoritos dos editores deste site singelo e garboso. Eles não param de produzir, colocando discos inéditos na rua com boa regularidade, produzindo seu próprio festival, incentivando novas bandas. E sem chororô, sem reclamar da vida.

O JUDÃO bateu um papo exclusivo com Donida, guitarrista, principal compositor e mentor intelectual da banda. Sem papas na língua, ele disparou: “A banda que diz ter perdido espaço para o artista internacional, na verdade, nunca o teve. É só uma boa desculpa para a própria incompetência”.

Confira abaixo:

matanza

01 Queria abrir este papo fazendo menção a um texto do jornalista Marcos Bragatto, para o jornal O Globo, no qual ele diz que é papo furado este lance de que o rock morreu, de que não existem novas bandas surgindo – porque elas existem, estão por aí, só que não estão dando mais as caras nos meios tradicionais e sim em espaços diferentes na web. Vocês concordam? Acham que os fãs de rock veteranos se tornaram preguiçosos e ainda esperam as coisas caírem no seu colo?

Donida ~ O rock não morreu mas está morrendo, o que é normal. Nos anos 20, o jazz era a resposta para tudo o que a sociedade na época mais queria, precisava e sonhava. Noventa anos depois, ele se reduziu a objeto de estudo e adoração de um segmento quase ínfimo dessa mesma sociedade. Com o rock não vai ser diferente. Hoje não é relevante como nas primeiras décadas em que surgiu quando era, de fato, uma ferramenta de ruptura dos costumes. As gerações futuras vão se identificar cada vez menos porque as referências vão ficando cada vez mais distantes, no século XXI.

02 Como vocês enxergam, aliás, o atual cenário do rock no Brasil? As novas tecnologias abiram novos espaços, dando mais democracia aos nossos ouvidos, ou nada mudou e só migramos de plataformas?

Donida ~ As novas tecnologias servem tanto para o bem quanto para o mal porque permitem a comunicação necessária para a expressão artística da mesma forma que banalizam a informação. Antes você precisava ralar pra conseguir alguma informação sobre um determinado artista e podia passar anos atrás de um LP. Dava-se muita importância... Hoje, você não precisa de mais de dois cliques pra ter sua discografia completa. Mas tudo que é fácil demais perde o valor. Existem, sim, ótimas bandas que trabalham seriamente. Mas quem se importa com mais uma banda quando existem milhares e milhares de outras? Quem tem tempo de assimilar todo esse conhecimento?

03 Há, no mercado musical, quem defenda que o fato do Brasil ter se tornado rota obrigatória para dezenas de shows internacionais nos últimos anos, isso tiraria o espaço para iniciativas que privilegiem a música nacional. Vocês concordam?

Donida ~ Acho absolutamente ridículo imaginar que a música nacional precise de algum tipo de protecionismo como se fosse algo débil que precise ser amparado, subsidiado. A banda que diz ter perdido espaço para o artista internacional, na verdade, nunca o teve. É só uma boa desculpa para própria incompetência.

04 Na edição anterior do Rock in Rio, vocês fizeram uma ótima parceria com o BNegão no palco Sunset. Este é o tipo de coisa que vocês estão dispostos a fazer – abrir espaço para parcerias com músicos que não estejam necessariamente no mesmo cenário que vocês?

Donida ~ Somos amigos do BNegão há muitos anos e por isso foi muito divertido. Mas tirando a farra, não vejo – no caso do Matanza – o menor sentido em parcerias...

05 Depois de “Thunder Dope”, que foi uma espécie de nova chance a faixas que fizeram o passado do Matanza, o que vem por aí no futuro? Vocês acham que caberiam, por exemplo, novas canções em inglês?

Donida ~ Queremos continuar desdobrando o nosso universo temático fazendo músicas cada vez mais pesadas, cada vez mais rápidas e desgraçadas. Queremos expressar de forma clara e contundente todo nosso desprezo pela sociedade e pela hipocrisia que a rege. Por isso, letras em inglês estão fora dos planos.

Matanza

06 Vocês fizeram aquele álbum-tributo ao Johnny Cash – se pudessem escolher repetir a dose com outro artista/banda, quem seria? Talvez o Motörhead (hehehe)? E por quê?

Donida ~ O que nós tentamos com o To hell with Johnny Cash foi trazer músicas escritas entre 1955 a 1958 para um ambiente HARDCORE. Não é algo que se possa fazer com o Motörhead, por exemplo, porque não há nada a acrescentar.. O mesmo acontece com o Reverend Horton Heat, Pogues, Mano Negra... Por mais que gostemos, jamais nos permitiríamos. Mas, se tivéssemos de repetir a dose, escolheria alguém como Merle Haggard ou Waylon Jennings.

07 O Matanza tem o seu próprio festival, que teve a sua segunda edição em 2013. Qual é o próximo passo para a banda? O que vocês pretendem alcançar nos próximos anos? Talvez o mercado internacional?

Donida ~ O que nos importa é fazer mais e melhores shows. O Matanza Fest é oportunidade que temos de reunir bandas legais num evento com uma estrutura maior que a de costume. Estamos trabalhando em um novo álbum, mas a nossa prioridade é tocar onde for possível. O mercado internacional é muito interessante mas não é o nosso foco no momento.

08 Há quem confunda a persona das canções de vocês e acredite que os integrantes da banda são, de fato, um bando de beberrões, brigões e mal-humorados? Como lidar com isso?

Donida ~ É normal que se espere alguma coerência entre o artista e seu trabalho, mas se bebêssemos a metade do cantamos nas letras, não haveria banda. Já estaríamos mortos há muitos anos...