Talvez seja hora de descobrir se a música sobrevive SEM a imagem.
O entretenimento é multimídia. Sempre foi.
Pra encontrar público, além de uma música interessante e com um viés que apresente algo de novo, o artista emergente a seu lugarzinho na cultura pop precisa de um diferencial. Carreiras de inúmeros astros viram reconhecimento ao mudarem de rumos visualmente e se reapresentarem como novidade.
Bowie encarnando um alienígena em sua fase Ziggy Stardust, Madonna personificando o imaginário sexual americano em Erotica (1992), Gene Simmons cuspindo sangue nas apresentações do Kiss. Certamente a estética desses músicos era instigante o suficiente para alçá-los a uma categoria que os diferia da multidão. Nada de errado com isso.
Concordemos ainda que as toneladas de maquiagem dos envolvidos tinham conexão com a música que apresentavam. A embalagem diferente não era um engodo que disfarçava o conteúdo vazio. Cada um desses músicos foi importante em sua época e mudou de algum jeito a perspectiva de arte em seu tempo.
Mas e quando a imagem se torna MAIOR que a música?
Em 2012, um fenômeno chamado Lana Del Rey estreou com um vídeo tosquinho (por falta de orçamento mesmo – até aí tudo bem) no YouTube. A jovem Lana cantava com ar triste para que seu parceiro deixasse de brincar com seus sentimentos usando como ilustração de ideia os videogames.
Uma junção de atualização musical, que finalmente passa a comportar a tecnologia como tema de canção, e a tristeza que todo mundo sente de vez em quando fez Lana deslanchar como artista. Passado algum tempo e já caminhando para o terceiro álbum oficial a ser lançado ainda em setembro de 2015, é certo dizer que de música Del Rey pouco tem para apresentar.
As temáticas de suas canções são sempre as mesmas: tristeza, pé na bunda, traição, abuso de parceiro, e etc; mas mais que isso: a forma como a letrista apresenta seus assuntos pouco muda estruturalmente. A sonoridade modorrenta cheia de falsetes cuspindo clichês sobre um parceiro que lembra de longe um James Dean decadente é uma constante em sua ainda curta carreira. Diante de um fenômeno pop comprado inclusive pela crítica, é certo dizer que temos um fraco por artistas com visuais bem delineados?
Parece seguro dizer que sim.
As fotos, vídeos e aparições de Lana apresentam um fator interessante quando se pensa em cultura de massa: seu forte apelo cinematográfico. A imagem que vende em seus produtos e ilustram sua sonoridade são impactantes o suficiente para sobreviverem no imaginário coletivo, mas fortes demais se colocadas lado a lado de suas faixas pouco inspiradas. Em outras palavras, a IMAGEM da cantora é muito mais interessante que sua música e é aqui que surge uma separação dos artistas citados lá no começo.
Vou mais adiante, e se você for fã de Arctic Monkeys vou deixar que me odeie.
Meses atrás, a colunista Courtney E. Smith publicou um texto no Pitchfork tentando desvendar as causas da popularidade da banda britânica na América do Sul. Entre outros pontos, levantava a bola de que o visual “rebelde” à lá Elvis agora adotado por Alex Turner talvez fosse um dos responsáveis.
O argumento era de que o rock, principalmente, tem profunda conexão com uma conduta e vestimenta dos músicos que lhe representam; razão que pode alçar ao mainstream bandas com uma estética definida e discurso claro, mas também tirar o sossego e a paciência de artistas que desviem desse código por qualquer razão que seja, dando lugar a nosso lugar comum preferido, o verbete: “traidor do movimento”.
AM (2012), último registro de estúdio da banda de Alex, sem dúvidas tem seus méritos: cumpre com certa competência a cartela de rock para o grande público que se propõe a fazer e atualiza influências da década de 70 aos fãs mais jovens do grupo. Mas chamá-lo de “o melhor disco daquele ano”, entretanto é um exagero ingênuo.
O fator nostálgico de querer fazer parte da plateia de uma cena, de assistir de camarote pontos de virada de bandas ou a gênese de discos seminais acontecendo diante de nossos olhos talvez distorça um pouco nossas avaliações e nos obrigue quase inconscientemente a enxergar músicos competentes como próximas apostas, ou até artistas risíveis como grandes gênios.
O impacto visual de um clipe pode mudar, por exemplo, a interpretação de uma música cristalizando sempre imagem junto com som na cabeça de quem a ouve, a personificação de uma ideia estampada no rosto de um artista, então...
Por isso, se surgir a dúvida em saber se o que você tem ouvido tem capacidade de sobreviver ao tempo (ou à muleta da estética), concentre-se na música. E se o resultado lhe agradar por si só, os malabarismos de seu artista favorito são aquele algo a mais que lhe fizeram sair do underground.
Agora, se o pouco que sobrar não tiver tanta graça retirados os badulaques de consumação conjunta, talvez seja hora de testar novos sons.