É sempre bom ver gente rica e poderosa recebendo punição por seus crimes. E se a gente consegue rir disso tudo, ainda, melhor.
Uma das coisas mais legais da Mostra de SP é a oportunidade de assistir a alguns dos filmes escolhidos por seus países para tentar aquela vaga no Oscar de Melhor Filme em língua estrangeira — tipo A Odisseia dos Tontos, um filme surpreendentemente divertido que chega aos cinemas brasileiros, não só os da Mostra, essa semana.
A história se passa em uma pequena cidade da Argentina (que, por acaso, é o país que o filme vai tentar representar no Oscar, caso isso não tenha ficado claro), onde um grupo de amigos e vizinhos reúne todas as suas economias para reabrir uma cooperativa agrícola e melhorar a economia da cidade. No dia seguinte ao depósito do dinheiro do grupo no banco, a economia e o sistema bancário da Argentina entram em colapso e o dinheiro é confiscado pelo governo.
Logo eles descobrem que não foram apenas vítimas do colapso econômico do país, mas também foram enganados por um gerente de banco e um advogado que estavam prontos pra tirar proveito da situação do país. Quando uma reviravolta muda a vida de todos, esse pequeno grupo decide colocar um plano em ação para recuperar o que é deles por direito.
Baseado no livro La noche de la Usina, escrito por Eduardo Sacheri, A Odisseia dos Tontos conta com roteiro do próprio autor escrito com o diretor Sebastián Borensztein. Contando uma história sobre a busca da justiça contra as elites bancárias do país, é um filme de assalto que seria simples se não fosse baseado em uma enorme crise financeira que aconteceu na Argentina em 2001. Com Ricardo Darín sendo uma espécie de Danny Ocean amador, acompanhamos seu personagem reunindo seus amigos e vizinhos para tentar conseguir seu dinheiro perdido de volta.
Conversei com Borensztein e o produtor Federico Posternak na última terça-feira (29) e questionei sobre como foi contar uma história real tão dramática como uma crise financeira que destruiu a vida de muitas pessoas e acrescentar humor à narrativa. Segundo o diretor, o tempo entre o acontecimento e a produção foi essencial para dar o distanciamento necessário para que essa história dolorosa pudesse ser vista e contada com outro olhar. “Essa é a melhor forma de processar essa dor social e econômica era através de humor. Sentíamos que tínhamos licença para poder fazer isso”, afirmou.
Esse distanciamento é bastante claro, porque a narrativa é inegavelmente divertida mesmo falando sobre uma crise nacional que os próprios envolvidos na produção vivenciaram. Esse humor torna A Odisseia dos Tontos uma história mais leve e mais palpável para todos os públicos e ainda acrescenta uma veia de justiça poética social que todos já desejamos em algum momento da vida.
Mesmo sendo uma história cheia de elementos muito argentinos — você vai se deliciar se conhecer um pouco sobre as diferentes visões políticas do país –, o filme tem uma temática bastante universal por abordar como a população lida com grandes crises econômicas. Todos nós já vivemos uma (ou algumas...) em nosso próprio país, portanto é muito fácil nos relacionarmos com a trama. Quando perguntado sobre essa co-relação entre Brasil e Argentina, Borensztein comentou que A Odisseia dos Tontos é, de fato, bastante universal. “É sobre as crises em todo o mundo, porque todas as pessoas e todas as culturas têm uma grande decepção com seus governantes, com suas democracias e com seus sistemas financeiros”, completou o diretor.
O resultado é um entretenimento bastante divertido e extremamente catártico ao vermos um pequeno grupo de pessoas simples lutando bravamente contra a injustiça de um inalcançável sistema político e financeiro. Borensztein entrega uma história muito honesta que tem as doses certas de humor, drama e alívio cômico. Um dos momentos mais divertidos do filme envolve a preparação para o próprio assalto que é inspirado em Como Roubar Um Milhão de Dólares, filme dirigido por William Wyler lançado em 1966. Mas, como o grupo de “assaltantes” consiste de pessoas comuns, A Odisseia dos Tontos nos oferece uma enxurrada de situações cômicas e absurdas que dão uma nota diferente, mesmo que a história siga um estilo puramente hollywoodiano de narrativas sobre assaltos.
Ao final da entrevista, o diretor completou que “o mundo está em um momento muito quentinho e a gente já está falando ‘basta'”. Com uma pequena introdução abordando diretamente esse senso de “basta”, A Odisseia dos Tontos nos deixa com um sorriso sincero no rosto – e um pequena sensação de vingança – quando vemos pessoas poderosas recebendo punição por seus crimes.
Se o mundo real está longe de ser perfeito, o cinema está aí para nos fazer sonhar.
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