Quarta temporada de Arrow fecha com uma mensagem importante: o mundo não é preto e branco – e a nossa maior arma pra enfrentar a escuridão dentro de nós mesmos e nos outros é a esperança
SPOILER! Muitas vezes tentamos relativizar as coisas. Ou é certo, ou é errado. Ou é bom, ou é ruim. Ou é preto, ou é branco. Yin Yang. Mas essa temporada Arrow, finalizada ontem (25), demonstra que nada é tão simples assim. Na vida, numa série, em nós ou no mundo.
Este ano de Arrow teve suas partes baixas, sim. Das quatro temporadas, dá pra dizer que foi a mais fraca. Isso não é, exatamente, uma reclamação – os anos anteriores, principalmente o segundo, é que foram muito bons. Em parte, foi resultado do fato dos últimos 23 episódios terem arriscado mais, trazendo mais meta-humanos de The Flash e a magia de Constantine para uma produção que, lá no começo, era pé-no-chão, seguindo a linha dos filmes de Christopher Nolan. Também se aproximaram mais dos quadrinhos, com Oliver Queen finalmente se transformando no Arqueiro Verde, Starling City se tornando Star City e até o próprio Oliver se empenhando na política.
O ápice desse risco foi o próprio vilão Damien Darhk. Do terceiro escalão do panteão de inimigos da DC, apareceu aqui como um antagonista overpower, com poderes mágicos que cresceram a cada episódio. Pra uma série que apenas tinha flertado com a magia e superpoderosos antes, foi um salto e tanto. Porém, Darhk também era humano. Tinha uma família, uma esposa (tão má quanto ele), uma filha pra se preocupar... Você pode não concordar com as ações do cara, mas as motivações não são tão estranhas assim – como não eram, lá na primeira temporada, para o Malcolm Merlyn.
A grande jogada aqui é que, pra vencer a ESCURIDÃO de DARHK, Oliver Queen teve que encontrar um pouco de luz dentro de si mesmo, já que essa era a fraqueza dos poderes do vilão. É essa jornada pessoal que faz de Arrow uma das mais interessantes produções COM super-heróis na TV: Ollie era no começo apenas um cara vingativo, querendo acertar as contas com o passado do pai, mesmo que matando. Nessa quarta temporada, ele realmente teve que abraçar o fato de ser um herói, tentando inspirar as pessoas a fazer algo bom, seja com ou sem o capuz.
Só que isso não foi fácil. Afinal, você não acaba com a escuridão dentro de si em um instante. Por outro lado, a luz não é nada se não tiver o que iluminar. O grande acerto do Arqueiro Verde, mesmo que sem querer e por causa desse conflito interno, foi mostrar que todos nós somos, em algum grau, más pessoas. E também boas. O que dita isso não é o que pensamos, mas as nossas ações a partir dos conflitos em nossa própria mente.
E é assim que o Arqueiro Verde mata Damien. Sim, ele mata. Como o próprio personagem explica, não há escolha. Trata-se de um vilão muito poderoso, que eles tentaram prender antes e tudo mais. Mantê-lo vivo é arriscar que mais milhões de pessoas morram. Em certos momentos, pra fazer o bem, precisamos também abraçar a escuridão dentro de nós. Mais uma lição da série.
No geral, são lições, escolhas e caminhos que poderiam também inspirar a galera que cuida dos filmes da DC no cinema como um caminho a partir do que já foi feito em Batman vs. Superman – o que pode acontecer, afinal, Greg Berlanti, co-criador de The Flash e Arrow, está envolvido com um filme do Gladiador Dourado. Também tem Geoff Johns, envolvido com a série do Corredor Escarlate, que está assumindo mais responsabilidades nessas produções.
Como tudo é uma grande escala PANTONE de cinza, o season finale teve seus problemas, assim como toda a temporada. A morte de Laurel Lance, a Canário Negro, teve sua função dentro do enredo, mas todo o mistério de mais de seis meses sobre quem morreria acabou ficando sem sentido. Também tivemos flashbacks fracos, que tentaram ajudar a construir a origem dos poderes do grande vilão da temporada, mas se tornaram muito arrastados. Fica a promessa dos produtores para corrigir isso no próximo ano, com Oliver indo até a Rússia. Vamos ver.
Outro momento que irritou foi o conflito entre Oliver e Felicity, criado não só para movimentar o miolo de temporada e encher linguiça, mas também para colocar aquela velha (e batida) máxima de “o herói não pode ser feliz no amor”, que não vejo mais sentido. Ao menos a Overwatch continua no próximo ano e, quem sabe, alguém corrija isso.
De qualquer forma, não vamos nos enganar: séries de TV aberta como Arrow são, em resumo, o novelão dos americanos. Guardadas as devidas proporções, esse tipo de conflito acaba sendo algo inerente ao formato e não é, exatamente, ruim. Só precisa ser dosado e bem utilizado.
Esse último episódio também teve alguns problemas de percurso. Foi dado muito tempo para o desenvolvimento do relacionamento entre personagens, o que é legal, mas pouco destaque para os conflitos e lutas. Alguns momentos foram apressados, como quando o Merlyn aparece na Arrowcave (ok, ele sempre entra lá do nada, mas dessa vez foi exageradamente do nada) ou quando Oliver consegue parar uma multidão ensandecida, convencendo-os a ter esperança. Ou ainda na luta final contra Darhk, quando uma nova multidão aparece rapidamente para ajudar.
Sim, foram escolhas de roteiro interessantes, mas executadas de forma muito abrupta. O melhor caminho para encaixar tudo isso seria ter um season finale em duas partes no mesmo dia, mas sabemos que grades de canais nem sempre são tão fáceis de serem ajustadas.
No geral, este foi um bom encerramento pra um ano que, se não foi o melhor, também foi bom. E também que acena com um status quo interessante para a próxima temporada, ao menos nos primeiros episódios: Arqueiro Verde agindo sozinho pela cidade, apenas com o apoio remoto da Felicity, e com Oliver Queen finalmente como prefeito.
Se tem algo que tem mais tons de cinza que ser vigilante, esse algo é a política. Boa sorte, Ollie. Tenha muita esperança. Você vai precisar.
Assim como todos nós aqui.
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