A dupla de heróis da DC Comics protagonizou um crossover delicioso para nos lembrar que, afinal, quadrinhos podem ser apenas divertidos. E tá tudo bem com isso.
SPOILER! Duas das maiores audiências do canal CW. E produzidos pela mesma equipe. Mesmo se os seriados Arrow e The Flash não fossem protagonizados por heróis da DC Comics que invariavelmente se encontram nas páginas dos gibis, era de esperar que o crossover fosse inevitavelmente acontecer. As tramas já vinham se cruzando, na verdade: Barry Allen (Grant Gustin) deu as caras na TV pela primeira vez em um episódio de Arrow e a fofinha Felicity Smoak saiu de Arrow e foi fazer uma aparição em Flash – assim como o vilão Rei Relógio, que infernizou Oliver Queen na segunda temporada e deu as caras para complicar o dia de Barry em Central City.
Os dois episódios especiais, exibidos nos EUA com 24 horas de diferença, são histórias complementares. Em Flash vs. Arrow, Oliver e sua trupe vão parar em Central City em busca de um maníaco que mata pessoas usando bumerangues (não por acaso, um vilão típico do Flash, o Capitão Bumerangue). Controlado por um meta-humano que usa cores para manipular as emoções – no caso, o Pirata do Arco-Íris – o Flash acaba atacando o Arqueiro Verde. Claro, porque este é o expediente-padrão dos encontros entre justiceiros uniformizados: primeiro, eles saem na porrada. Depois, detonam o vilão da vez.
A pancadaria entre Barry e Oliver é bem peculiar – porque, claro, o velocista escarlate tem superpoderes e, portanto, sairia na vantagem. Mas o Arqueiro é mais experiente, mais sacana e mais disposto a trapacear, usando as redondezas para tentar levar a melhor (e plantando armadilhas pontudas). Já o episódio de Arrow, apropriadamente batizado de The Brave and The Bold (que é, como você deve imaginar, o título daquele gibi que trazia inusitadas parcerias nos quadrinhos DC), levou Flash e seus parceiros dos Laboratórios S.T.A.R. para Starling City, ajudando Oliver e sua trupe a fechar o caso do homem do bumerangue.
E se no primeiro episódio vemos Oliver ensinando Barry, convencendo-o de que ele precisa ser menos impulsivo e mais racional, analisando a situação antes de sair correndo, este novo episódio mostra Barry aconselhando Oliver a respeito de sua postura para obter informações, aproximando-se das brutais técnicas de tortura, o que não combinaria com sua atuação como herói.
O mais importante deste encontro entre os dois mascarados é que estivemos diante de um dos momentos mais divertidos da TV no ano, entretendo o fã eventual mas com um sabor especial para quem curte quadrinhos de herói. Isso porque o encontro, tanto em uma série quanto na outra, tem tudo que um bom gibi de super-heróis deve ter. É diversão pura e simples, descompromissada e sem frescuras. E com bom humor, claro. Lembra bastante o clima dos encontros entre combatentes do crime da Era de Prata, sabe? Gardner Fox e Carmine Infantino, a boa e velha pseudo-ciência dos gibis que não precisa lá de muita explicação, diálogos certeiros, um bom vilão absurdo e uma série de gags visuais que resultam em splash pages memoráveis. Fórmula perfeita.
O legal desta coisa toda é que, por um lado, este verdadeiro evento que foi o cruzamento das duas séries teve um pouco mais da aura de Flash e um pouco menos do clima de Arrow. O que quero dizer com isso? Que aquela necessidade quase doentia de tornar os heróis mais “reais”, surgida com a “nolanização” dos filmes recentes do Batman e com o Homem de Aço, ficou da porta para fora. Todo o respeito para Gotham, que é uma grande série – mas aquele clima sombrio, noir, não precisa virar regra obrigatória para tudo que é super-herói que existe no mundo. Além do mais, estamos vendo o encontro entre um sujeito que se veste de vermelho e corre mais rápido do que a luz e um camarada de capuz verde que poderia acertar uma flecha no meio da testa de uma mosca. Sinceramente, não faço qualquer questão de realidade aqui, ok?
O outro lado? É que este encontro não é bombástico, épico, explosivo, uma verdadeira bomba atômica de testosterona como é, por exemplo, um encontro de heróis como o dos Vingadores nos cinemas. E bem que poderia ser, já que do lado do Flash teremos o Nuclear e do lado de Arrow já temos o Pantera e o Eléktron/Átomo, além de uma Canário Negro em treinamento. Sério, temos a oportunidade de montar uma Liga da Justiça independente dos filmes da Warner. Sei lá, aliás, se não é a ideia para o futuro. Mas aqui, neste momento, a opção foi bem diferente, por uma coisa até mais intimista – e acertaram com precisão cirúrgica. Pense que é apenas um herói fazendo uma aparição ocasional no gibi daquele outro herói. Eles existem num mesmo universo, logo é de esperar que passem para dizer um “oi”. Mas não precisa ser nada maior do que isso. E já está de bom tamanho.
Interessante perceber ainda que as tramas não foram aleatórias. A reflexão sobre suas atitudes que o Flash força Oliver Queen a ter terá impacto direto em suas aventuras daqui pra frente, no questionamento sobre quem está debaixo da máscara do Arqueiro, conforme falamos aqui mesmo, no JUDÃO. Tanto é que, antes da temporada entrar em pausa, ele vai se encontrar com ninguém menos do que Ra’s Al Ghul. Já o puxão de orelha que Oliver dá no Flash – um Barry Allen que se parece bem mais com Wally West, em especial pela questão da jovialidade – vai ser primordial para que ele seja um herói maior e melhor, aquele mesmo herói que promete salvar o mundo conforme é possível ver nos jornais do futuro consultados em segredo pelo misterioso Harrison Wells. Tanto é que, antes da temporada entrar em pausa, ele vai se encontrar com ninguém menos do que o Flash Reverso.
Que estes momentos sejam ainda mais frequentes. Que ambos possam cruzar o caminho do Asa Noturna (em Titans) e da Supergirl. Porque estes encontros não são primordiais para que as séries deem certo. Mas são a prova de que não é preciso muito para se criar um único universo coeso e oferecer uma cerejinha no bolo para os fãs...
A gente merece.