Sequência não é só absolutamente desnecessária, como não serve pra nada dentro do universo e mitologia surgidos em 1999
Se você também espera desde 1999 pra saber o que a foda aconteceu com a Heather depois que ela encontrou o Joshua virado pro canto da casa maluca, peço desculpas por você saber isso por mim, mas... Bruxa de Blair, que estreou nessa quinta (15) no Brasil, não vai ajudar em muita coisa.
Vai correr pra caralho, pode te fazer ficar com dor de cabeça, vai te fazer não se lembrar de nenhum dos personagens cinco minutos depois de eles aparecerem (ou sumirem) da tela, vai te fazer se perguntar se não era o caso de ter ido assistir ao filme do Pelé ou o que exatamente você acabou de ver. Bruxa de Blair é apenas e tão somente um filme que se aproveita de um título importante da história do cinema.
Eu tinha 15 anos quando assisti ao primeiro filme, com alguns amigos, num sábado congelante no Shopping Metrô Tatuapé. Eu me lembro bem da matéria que li numa revista contando a história toda do filme, a pesquisa que fiz no Cadê ou no Yahoo, a empolgação que eu tava naquele dia e o tanto de coisa que eu fiquei pensando pra que o filme tivesse acabado daquele jeito.
Bruxa de Blair é apenas e tão somente um filme que se aproveita de um título importante da história do cinema
“Era uma mitologia e um universo tão legais pra trabalhar, que era muito empolgante pra mim, criativamente, pensar em todas as coisas que eu poderia fazer, e as coisas que eu poderia criar” afirmou Simon Barrett, roteirista de Bruxa de Blair, ao CinemaBlend. Aqui, ele tá certo, se analisarmos friamente: o filme original nem sequer mostrou a tal da Bruxa, por exemplo. A questão, porém, é que a grande graça do original é essa. Não saber de nada, ou saber de muito pouca coisa, faz parte da experiência e é o que ajudou o filme se tornar o que se tornou e que, hoje, faz com que ele estreie em primeiro lugar nas bilheterias.
Era de se esperar que, na sequência, a história caminhasse de alguma maneira. A ideia de James acreditar que a irmã (que em momento nenhum tem seu nome dito no filme, um acordo feito com a Lionsgate, já que Heather Donahue é o nome da atriz, também) tá viva e seguir seus passos na floresta pra, pelo menos, entender o que aconteceu é realmente interessante.
Porém, Barrett e o diretor Adam Wingard optaram por simplesmente recontar uma história, agora cheia de TRAQUITANAS que muito pouca gente sonhava que existiria 17 anos atrás e muita correria. Isso e o fato de que, agora, lidamos com uma história de ficção científica.
SPOILER! A lenda de Rustin Parr é importante, aqui. Ela é contada durante os dois filmes: um cara, trocentos anos atrás, seguindo as ordens da tal da Bruxa, passou a levar crianças pra casa pra matá-las. Eram sempre duas e, pra evitar que uma visse a outra morrendo, mandava que uma delas ficasse virada pra parede.
No primeiro, isso basta. No segundo, sabemos também que sua casa tinha um porão com vários túneis sem saída e foi destruída na época; o que essa nova EXPEDIÇÃO procura é uma outra.
Não é, claro. É exatamente a mesma casa que o pessoal encontrou em 1994, só que agora é CANON o fato de ela só aparecer pra algumas pessoas, as mesmas que passam a viver apenas durante a noite, vendo o tempo passar diferente.
São pessoas bem burraldas, aliás. Vamos supor que você vai se meter numa floresta que todo mundo diz que é amaldiçoada, na qual sua irmã desapareceu. Se cercar de pessoas de confiança é o primeiro passo mas, se não for possível, medidas pra garantir a segurança devem ser tomadas. Que tal, então, colocar uma câmera de vigilância no acampamento? No primeiro barulho, era só pegar o celular e ver o que tava acontecendo, certo?
Mas ok, vamos supor que você esqueceu que tem isso na sua mochila e, poxa, se assustou com os barulhos e os vodus que surgiram fora da sua barraca. É de bom grado verificar com o casal que vocês acabaram de conhecer, e que de certa maneira os chantageou, pra garantir que aquilo não tenha sido uma pegadinha. Certo?
Ok, você é uma pessoa que acredita no melhor da humanidade e enfim, as merdas aconteceram e você foi parar no porão de uma casa com vários túneis. Instinto de sobrevivência é foda, mas lembra da história que te contaram um ou dois dias antes?
Ah, então vai se foder.
Essa luz jogada dentro da casa, quando os protagonistas estão dentro dela, já mostram que as coisas mudaram bastante com o passar do tempo
Agora... Como assim a casa só aparece pra alguns e o sol não brilha mais?
A resposta é bastante simples, oras bolas: uma dimensão alternativa, na qual o tempo funciona diferente e pessoas somem e reaparecem do mais profundo nada (podem até ser dimensões alternativas, no plural) enquanto são perseguidas por seres que, noves fora, se parecem demais com ETs — da mesma maneira que a luz forte jogada dentro da casa se parece com a de qualquer filme na qual aliens nos fazem uma visita.
Numa referência mais atual, é como se fosse o mundo invertido de Stranger Things, sendo o portal o riacho que precisam atravessar + uma noite dormida na floresta. Dá até pra chamar a “Bruxa” de Demogorgon, eles se parecem bastante.
Até tem uns MONSTRINHOS saindo de dentro da menina!
Se você for uma pessoa que observa bem as coisas, vai perceber que o local onde encontraram as fitas é bem próximo da tal casa e, mais importante, o que se vê no começo do filme, o vídeo no YouTube, é exatamente ou muito parecido com o que a gente vê quando a Lisa entra na casa.
Sim, eu tou dizendo que aquela galera encontrou as fitas que eles mesmos gravaram dois anos antes. Sabe como é, viagem no tempo tem dessas coisas e, ainda usando Stranger Things como referência, aparelhos de CUNHO audiovisual são como as luzes, uma espécie de elo de ligação entre os dois mundos. Isso ou os ETs / Demogorgons conhecem bem a curiosidade humana e usam dessa prática pra conseguir se alimentar, né?
Bruxa de Blair é essencialmente o mesmo filme que vimos em 1999, com a diferença, além das traquitanas e correria, de que não tem nenhum objetivo claro. Não contribui em nada.
Bruxa de Blair é essencialmente o mesmo filme que vimos em 1999, com a diferença de que não contribui em nada à (talvez possamos dizer assim) franquia. Só é mais rápido, só tem mais tecnologia e a “explicação” pro que acontece na ficção científica, ainda que ela não seja usada pra explicar nada e sim adicionar elementos completamente desnecessários à história, que também era desnecessária.
Eu sei que não sou dono de nenhuma obra que consumo, sendo meu papel analisar dentro do contexto proposto. Mas é aquela coisa que o diretor Fede Alvarez disse ao JUDÃO nessa entrevista: “Com Evil Dead, eu tinha muita liberdade, mas precisava ser um Evil Dead, essa era uma limitação. Podia ser o que eu quisesse, desde que fosse um Evil Dead”.
O contexto, nesse caso, é a sequência de A Bruxa de Blair, um filme que nunca foi sobre colocar uma galera numa floresta maldita pra se filmar e depois transformar em filme, com ou sem ETs, viagens no tempo e múltiplas dimensões. Fico com o nosso querido Marcos Brolia, em sua resenha do filme: definitivamente, essas fitas não deviam ter sido encontradas.