Brian Herring: o criador das criaturas dos novos Star Wars | JUDAO.com.br

Com a palavra o homem que ajudou a desenvolver (e manipular) aliens e robôs em O Despertar da Força e Rogue One – e bateu um papo com a gente durante sua visita ao Brasil

O nome deste inglês que consegue se manter bem-humorado mesmo depois de 12 horas de viagem e uma mala que nunca saiu do aeroporto pode não ser lá muito familiar pra você. Mas com certeza o trabalho de Brian Herring esteve bastante em evidência para quem se deixou envolver pelo personagem mais carismático do sétimo episódio de Star Wars.

Você chegou a ver algum vídeo de bastidores do filme? Sabe aquele sujeito andando atrás do BB-8, empurrando, ajudando a manipular e dar vida ao droide redondinho que se tornou um dos grandes ícones da saga criada por George Lucas? Pois é. É o Brian. :)

Com mais de 25 anos de carreira como marionetista para o cinema e para a TV, Herring iniciou seu trabalho na lendária Jim Henson Company dos Muppets e da Vila Sésamo. Depois de trabalhar no desenvolvimento e manipulação de personagens em filmes como Prometheus, Hellboy 2 e Guia do Mochileiro das Galáxias, se juntou em 2014 à equipe de Star Wars para trabalhar em O Despertar da Força como consultor de marionetes. Agora, em Rogue One: Uma História Star Wars, como parte da equipe de efeitos especiais de Neal Scanlan, ele parece empolgadíssimo para falar sobre seu trabalho no que chama de “filme mais realista de Star Wars”, como descreveu ao longo da conversa com o JUDÃO em São Paulo.

“O Gareth [Edwards, diretor] usou um jeito bem diferente de filmar. Ele realmente coloca a câmera na sua cara, ele corre com a câmera por aí, você nunca sabe onde ele vai a seguir. É um estilo quase de documentário”, explica ele. “Você realmente sente que está no meio da batalha. E isso influenciou o nosso jeito de trabalhar com as criaturas”. Brian conta que a orientação do cineasta foi bastante específica: as criaturas têm de fazer parte do elenco. “Sentadas do lado de outro soldado, limpando a arma, conversando casualmente, porque o humano é um rebelde e aquela criatura também é um rebelde. Ambos são membros da Aliança e, por acaso, são de planetas diferentes”, explica.

Por exemplo, no set de Jedha (uma das locações mais importantes da história e, por que não dizer, de toda a saga), os coordenadores do time tinham que lembrar aos artistas que não era para infestar tudo de criaturas imensas e fascinantes, porque elas tinham que parecer tão comuns e misturadas ao grupo quanto os próprios humanos. “Não podiam ser criaturas do tipo que você olharia na rua e ficaria apontando ‘uau, olha só você’. Não. Elas são parte do cenário. E têm que ser parte daquele um cenário tipicamente Star Wars”.

Brian Herring no set de O Despertar da Força

Brian Herring no set de O Despertar da Força

No caso do departamento de criaturas, ele revela, a liberdade foi quase total, sem precisar referenciar tanto aos filmes originais, embora a inspiração acabasse sendo especialmente Uma Nova Esperança e O Império Contra-Ataca. “Claro, não dá pra fugir muito de Star Wars. A gente tem que fazer parecer que é Star Wars, ainda que seja um novo filme. A equipe chegou a fazer designs incríveis, mas que funcionariam em um filme diferente. Não eram Star Wars. Era preciso ser fiel à QUINTESSÊNCIA da saga”. Só que Gareth pediu ainda que o time de criaturas se inspirasse também em filmes como O Resgate do Soldado Ryan, Apocalypse Now e Nascido para Matar. Porque, basicamente, este é um filme de guerra e deveria ser pensado assim. “Temos criaturas que são lutadores da liberdade, criaturas que são refugiados em território ocupado. Este é o tipo de mundo no qual vivem estes seres e era isso que precisávamos refletir”.

Temos criaturas que são lutadores da liberdade, criaturas que são refugiados em território ocupado. Este é o tipo de mundo no qual vivem estes seres e era isso que precisávamos refletir

O estilo mais tenso e “documental” do diretor fez com que Brian e toda a equipe tivessem que prestar bastante atenção em um detalhe especial: os olhos. “Ele quis o tempo todo que os olhos fossem muito realistas, muito mais do que nos outros filmes”. Segundo ele, o diretor não apenas gosta de prestar atenção nos olhos dos personagens, mas curte fazer tomadas mais próximas, closes dramáticos e expressivos, do tipo que dizem muito sem precisar dizer nada. “E aí mudamos a técnica que usamos para construir e pintar os olhos, por exemplo, dando mais profundidade e detalhamento”.

O profissional relembra o caso do Almirante Raddus, o mon calamari que é primo distante de ninguém menos do que Ackbar, o responsável pelo clássico bordão “it’s a trap!”. Brian conta que Raddus é do tipo durão, um sujeito com quem você não quer mexer, as mãos fortes por trás do comando dos esforços de guerra. “E aí pensamos, bom, ele é um pouco como o Winston Churchill”, revela, relembrando o icônico estadista britânico que se tornou símbolo da resistência contra os nazistas na Segunda Guerra Mundial. “Como fazer, então, alguém como o Ackbar ficar mais chuchilliano?”. A resposta estava, vejam só, não apenas na cor da pele, mais característica de calamaris (que são nada além de lulas) de regiões mais geladas, mas também na intensidade dos olhos.

Almirante Raddus

Almirante Raddus

Diferente do que aconteceu em O Despertar da Força, Brian Herring trabalhou mais nos bastidores, no desenvolvimento dos conceitos das criaturas, envolvendo-se menos com o trabalho de marionetista. “Meu lance com o BB-8 durou o filme inteiro. Tivemos bastante liberdade para fazer do nosso jeito e desenvolver a personalidade dele”, conta, relembrando ainda que teve a chance de conhecer pessoalmente ninguém menos do que Kenny Baker, responsável pela interpretação do R2-D2, pra trocar figurinhas. “JJ [Abrams] nos apoiou muito, ele estava bastante aberto às nossas ideias. E ele nos dirigia como se fossemos um ator. Tivemos que desenvolver o jeito que o BB corria quando estava com medo, que era diferente do jeito de correr quando estava empolgado, como se comportava quando estava feliz. Como um ator comum”.

Já em Rogue One, ele trabalhou com diversos personagens, só que fazendo coisas mais pontuais. “Por exemplo, cuidei da animação do rosto de um pequeno sujeitinho com cara de lula, interpretado pelo Kiran Shah – que foi o Teedo, o caçador de lixo que estava sentado numa enorme criatura metálica e tentou capturar o BB-8 n’O Despertar da Força, ainda em Jakku”. Com um equipamento operado à distância, Brian controlava não apenas os olhos, mas também os mais sutis movimentos dos tentáculos que formavam a sua boca. Usando um microfone instalado em seu boné, Brian se comunicava com Kiran para que a movimentação de braços e pernas estivesse plenamente coordenada com o rosto. “Teve também um personagem no qual tivemos nada menos do que 15 pessoas manipulando ao mesmo tempo. Deu muito trabalho, mas nos divertimos bastante”, conta, orgulhoso.

K-2SO vai ser o BB-8 de Rogue One

Mas, afinal, qual é a aposta de Brian para o grande destaque deste novo capítulo em termos de criaturas? Teremos, talvez, uma espécie de BB-8 aqui? “K-2SO vai ser o BB-8 de Rogue One”, dispara, sem pensar. “Foi feito um trabalho incrível com ele, que já estava ótimo no roteiro. Ele é um personagem de grande atitude”. De acordo com o britânico, o acerto veio desde o início, já que Gareth sabia exatamente o que queria, com um design mais limpo e funcional. “O departamento de criaturas trabalhou no visual, que ficou incrível. Aí, Alan Tudyk entrou em cena e arrasou. Neste caso, foi tudo via captura de movimentos, com a ajuda da ILM. O Alan estava no set fazendo todos os diálogos e garantindo a presença física para que os outros atores pudessem interagir. E ele é muito divertido”.

Alan Tudyk e um indignado K-2SO ;D

Alan Tudyk e um indignado K-2SO ;D

Ah, isso significa que temos um novo C-3PO? Nada disso, queridos fãs das antigas. Brian pede para que vocês tirem o cavalo da chuva porque nem dá pra comparar. Se Gareth Edwards já dizia que o novo droid tem “a personalidade do Chewbacca num corpo robótico”, o que o especialista em criaturas tem a dizer é ainda mais radical. “Do ponto de vista dos droids, se o C-3PO é um carro pra família, o K-2SO é um Porsche Attack”.

Digamos que até quem não entende de carros, como eu, sacou a diferença aqui. :D

Sorridente pra caralho depois de conseguir comprar um par novo de calças enquanto as suas o aguardavam pacientemente no aeroporto da Inglaterra, antes mesmo da conversa começar OFICIALMENTE, o cara parecia bastante IMBUÍDO da tarefa de me convencer do quão Rogue One é do caralho. “Este é o filme perfeito para iniciar Star Wars”, soltou, lembrando mais uma vez que, cronologicamente, ele se encaixa imediatamente antes do Episódio IV.

“Se você nunca viu um filme de Star Wars, veja Rogue One e depois Uma Nova Esperança, O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi”. Imediatamente, Brian pareceu sacar que tinha esquecido de algo. E antes mesmo que eu pudesse dizer o que foi, ele emendou. “E aí então você retorna para os episódios I, II, III”. Ah, tá. Tudo bem, cara. A gente compreende perfeitamente o seu ato falho. ;)