Claro que vivemos tempos loucos, que estão nos levando a mudanças de paradigma muito bem-vindas. Mas digamos que ninguém esperaria por ESTA notícia, né. Que é, não importando o contexto, uma ÓTIMA notícia.
A gente já te contou BEM AQUI como o mercado americano de quadrinhos sofreu uma reviravolta no último mês de Abril, quando o Coronavírus tornou-se o grande responsável por um desabastecimento em massa de cópias físicas de gibis nas lojas especializadas. O resultado? Nada daqueles lançamentos da Marvel e da DC anunciados com tanta pompa e circunstância pra você, querido leitor.
Mas a treta, na real, já tinha começado em março, quando a tempestade começava a se desenhar. Como bem explica o Comichron, a Bíblia dos números relacionados a gibis na Terra do Tio Sam, os pedidos iniciais de março foram feitos ANTES do início das restrições relacionadas à pandemia. “Como acontece com os cronogramas de transporte na transição do inverno para a primavera, a maioria dos novos lançamentos estava prevista para as últimas semanas do mês. A quarta semana, de fato, teve a maior lista de novos quadrinhos do ano até aquele momento”, explica John Jackson Miller, considerado um verdadeiro arqueólogo da performance de vendas de HQs.
No entanto, as notícias sobre o impacto da doença foram ganhando corpo, a quarentena foi se tornando uma realidade e os varejistas ajustaram seus pedidos à medida que o tráfego de novos pedidos (e clientes, claro) diminuiu. Certas lojas cujas portas se fecharam passaram a enviar os pedidos pelo correio, enquanto outras ainda tentavam se virar promovendo retiradas nas calçadas. A Image anunciou que seus pedidos futuros seriam retornáveis, a Marvel ofereceu descontos no envio de suas revistas a partir da segunda quinzena e a Diamond, a distribuidora magnânima e absoluta, não só adiou o Free Comic Book Day como sugeriu mudar a tradicionalíssima data semanal de venda de novos gibis, sempre às quartas-feiras, para as terças. Vai que...? No fim, sabemos o que aconteceu.
Discutir os números dos mais vendidos de ABRIL, com um monte de reimpressões e afins, não faz qualquer sentido. Todavia, é curioso analisar os números de MARÇO, quando o título mais vendido foi da Marvel — o que, UAU, não chega a ser lá uma grande surpresa. Mas saber QUAL foi este título, ah, isso sim. Tamos falando de Spider-Woman #1, com roteiro da Karla Pacheco e arte do espanhol Pere Perez. Sim, o triunfal retorno de Jessica Drew a um título solo. E que deixou o Batman, quem diria, comendo poeira.
Tá bom, a gente sabe o que os sabichões de plantão vão dizer. “Ah, mas só foi o título da Mulher-Aranha porque os medalhões de verdade não foram entregues, caso contrário iam ser os heróis tradicionais”, e por aí vai. Porque, afinal de contas, tudo é uma justificativa pro nerd grisalho defender os seus hominhos de capa. Levando em consideração os top 300 de vendas, estamos falando de uma estimativa total de 5.443.812 quadrinhos vendidos.
O número representa 40.000 unidades A MAIS em relação ao mês anterior, o que significa que o ano vinha numa boa crescente. Mas se a gente for comparar com março de 2019, tremenda injustiça. Tamos falando de 500.000 unidades A MENOS, no mês em que a edição comemorativa Detective Comics #1000, um dos gibis mais vendidos DA HISTÓRIA, passou feito um rolo compressor.
Muito que bem.
Ainda assim, diante de todo este cenário, a Mulher-Aranha vendeu belas 142.000 unidades, à frente de Flash, Thor, X-Men, Hulk, Star Wars, o próprio Batman e inclusive o indefectível sujeitinho a partir do qual ela deriva seu nome, um tal de Homem-Aranha. Com ou sem pandemia, não é um feito para poucos. Jessica deveria estar orgulhosa, ainda mais porque é nesta edição que ela estreia este uniforme novo lindão, com design do ilustrador Dave Johnson, que homenageia sua roupa clássica mas traz um bem-vindo toque de modernidade.
Criada em 1977 por Archie Goodwin pra ser uma heroína de um número só em Marvel Spotlight #32, Jessica Drew acabou se tornando um sucesso inesperado. Ex-integrante dos Vingadores, agente dupla da SHIELD e da Hydra, detetive particular, mãe solteira e eventualmente substituída por uma Skrull, a Mulher-Aranha tem uma série de fãs famosos, incluindo Brian Michael Bendis (que, originalmente, queria que ELA fosse a estrela de Alias, antes de criar a Jessica Jones) e a própria Karla Pacheco, que se surpreendeu com o carinho que os leitores de gibis têm pela personagem.
“Quando comecei a trabalhar neste título, sabia que a Jess era um dos meus personagens favoritos, mas (de maneira inocente) não imaginava quão importante ela era para tantas outras pessoas, mesmo não tendo uma série solo há muitos anos”, lembrou a roteirista numa entrevista pro Newsarama. “As reações à HQ foram muito empolgantes!”.
Ela lembra que, embora a Mulher-Aranha tenha pipocado aqui e ali em títulos como o da amiga Carol Danvers, aka Capitã Marvel, tava mais do que na hora de mostrá-la como alguém além de uma grande integrante de equipe de heróis ou quem sabe uma amigona para todas as horas. “Queríamos mostrá-la sendo ela mesma, sem precisar depender de ninguém mais. Ela ainda é a Jessica Drew que conhecemos e amamos, mas acaba enveredando por um lado sombrio, e vamos descobrir uns segredos sombrios sobre seu passado”, explica Pacheco. “Tudo isso enquanto ela chuta traseiros, explode coisas e talvez dê uns socos em uns dinossauros”. Ainda levando em consideração a arte de um sujeito que já foi descrito como um cruzamento entre Kevin Maguire e Frank Quitely (cortesia de Nick Lowe, vice-presidente de conteúdo e editor executivo da Marvel), porra, o potencial é mesmo IMENSO.
“Pra mim, a Jessica é uma sobrevivente, uma pateta, uma mulher que valoriza suas amizades e é valorizada por seus amigos... mas que talvez ainda não conheça inteiramente ou não aceite quem ela é de verdade. AINDA”.
Pra mim, tá mais do que vendido.